O governo explica seus fracassos de política econômica como uma espécie de crise de puberdade. A economia estaria passando por uma fase, digamos, "aborrescente" - aquele período chato pelo qual passam os adolescentes. Não há o que fazer senão esperar. É ter paciência e compreensão e deixar que o tempo faça sua parte.
Tanto o ministro da Fazenda, Guido Mantega, como o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, entendem que as decepções ocorrem porque a economia está em transição. Passa por mudanças estruturais. As principais são a derrubada dos juros básicos (Selic), que, em só 17 meses, caíram de 12,5% para 7,25% ao ano; e a desvalorização cambial (alta do dólar), que, no início de março, estava a R$ 1,70 e, hoje, oscila em torno dos R$ 2,05 por dólar.
Essas mudanças - e não teriam sido as únicas na economia - promoveram distorções temporárias. Os bancos, por exemplo, viciados em spreads (diferença entre o que pagam e o que ganham nas operações de crédito), passaram a tirar a diferença com tarifas e taxas de administração enormes. Mas a própria derrubada dos juros e o encolhimento do retorno para o aplicador de recursos escancararam a desproporção. Mais ainda, os bancos foram obrigados a ordenhar no crédito os ganhos que deixaram de ter em tesouraria (aplicação de recursos em títulos públicos). Por isso, passaram dos limites - daí as distorções com o aumento da inadimplência que, em seguida, levou à puxada de freios no crédito.
Com as empresas aconteceu algo equivalente. A indústria, por exemplo, estava fortemente dependente de insumos, matérias-primas, peças, máquinas e capital de giro importados. De repente, teve de pagar muito mais por tudo isso, porque o dólar ficou mais caro. O comércio, que vinha ganhando mais nas operações financeiras (camufladas naquele jogo de pagamentos em várias prestações "sem juros") do que no desempenho operacional, também enfrenta retorno mais baixo.
Essas transformações exigem ajustes em toda a rede de produção e distribuição cujo impacto principal implica alguma redução do PIB e elevação da inflação. Mas é coisa passageira. Aproxima-se o dia, dizem as autoridades, em que toda a economia se adaptará, o PIB voltará a crescer e a inflação mergulhará.
Antes de mais nada, se é isso mesmo, então faltou prever a fase "aborrescente" e faltou administrá-la com políticas compensatórias. A quebra de arrecadação por causa de um desempenho mais fraco do PIB e o puxão dos preços deveriam ter merecido uma política fiscal mais firme - o que equivale a dizer mais eficaz controle das contas públicas.
Mas esse diagnóstico-base está equivocado. A economia empacou e a inflação deslanchou não só porque o governo abusou de políticas implantadas na marra: nos juros, no câmbio, no desarranjo das contas públicas. Tudo isso aconteceu também porque o governo puxou demais o consumo e desleixou do investimento, porque se mete demais nos negócios e, ainda, porque descuidou da qualidade da administração pública. Tivesse mais qualidade, o PAC não estaria tão empacado e as licenças ambientais, sempre complicadas, não demorariam tanto.
O equívoco de diagnóstico distorce também o prognóstico. A hipótese de que a transição desembocará naturalmente em nova bonanza está prejudicada. O governo Dilma só tem mais dois anos para corrigir o rumo e apresentar resultados.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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