Ao contrário do PT, que tem uma estrutura verticalizada, as decisões eleitorais do PMDB são tomadas em âmbito regional, com exceção da coligação nacional, que deve ser mantida
O Palácio do Planalto ruge, mas não morde o próprio rabo. Enquanto demoniza o líder do PMDB, deputado Eduardo Cunha (RJ), e tenta isolar a bancada dele, o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, negocia com os demais partidos da base governista um pacote de concessões, que vai da liberação de emendas parlamentares aos cargos no governo e às concessões de rádio. Teria ficado mais barato um acordo com a bancada do PMDB, que ameaça derrotar o governo na votação do Marco Civil da Internet e derrubar o veto que proíbe a criação de municípios. Mais barato ainda ficaria se o governo fizesse uma negociação aberta e ampla com o Congresso, que envolvesse a oposição. Resultado: o governo, ontem, não sentiu segurança para enfrentar uma votação na Câmara dos Deputados.
Por que tanta dificuldade para derrotar um aliado rebelde na Câmara, que foi transformado em desafeto de estimação pela presidente Dilma Rousseff? No jargão da política, isso é brigar pra baixo. Há anos, o Palácio do Planalto tenta anular a influência de Cunha e consegue apenas fortalecê-lo ainda mais perante os pares dele. No caso do Marco Civil da Internet, a briga real é com o poderoso lobby das empresas da área de telecomunicações e da internet, que se opõem ao relatório do deputado Alexandre Molon (PT-RJ). Cunha tem um substitutivo na gaveta, que foi negociado com os partidos de oposição. O líder do PMDB é duro nas negociações de mérito, não fica apenas no toma lá da cá em torno de emendas parlamentares, que é o padrão dos acordos de Dilma com a própria base parlamentar. Na verdade, essa é a razão da irritação da presidente da República com o líder do PMDB. Toda vez que entra na contramão do mercado, Cunha deita e rola, vira porta-voz de setores empresariais envolvidos.
Nas provínciasA outra variável importante do conflito é a dificuldade que petistas e peemedebistas encontram para fechar alianças nas disputas para os governos estaduais. Cunha capturou as insatisfações contra o PT nos estados, e o governo não consegue fechar os acordos regionais. Esses acertos não dependem apenas da presidente Dilma Rousseff e de Mercadante, dependem da política local. O PT tem candidato a governador nas seguintes unidades da Federação: Acre (Tião Viana), Bahia (Rui Costa), Distrito Federal (Agnelo Queiroz), Mato Grosso do Sul (Delcídio Amaral), Minas Gerais (Fernando Pimentel), Paraná (Gleisi Hoffmann), Piauí (Wellington Dias), Rio de Janeiro (Lindbergh Farias), Rio Grande do Sul (Tarso Genro), Rondônia (Padre Ton), Roraima (Ângela Portela) e São Paulo (Alexandre Padilha).
O PMDB quer lançar candidatos a governador em 22 estados: Alagoas (Renan Filho), Amazonas (Eduardo Braga), Bahia (Geddel Vieira Lima), Ceará (Eunício Oliveira), Espírito Santo (Paulo Hartung ou Ricardo Ferraço), Goiás (Júnior da Friboi), Maranhão (Luís Fernando Silva), Mato Grosso (Carlos Bezerra), Mato Grosso do Sul (Nelson Trad Filho), Minas Gerais (Clésio Andrade), Pará (Helder Barbalho), Paraíba (Veneziano do Rêgo), Paraná (Roberto Requião), Piauí (Marcelo Castro), Rio de Janeiro (Luiz Fernando Pezão), Rio Grande do Norte (Fernando Bezerra), Rio Grande do Sul (José Ivo Sartori), Rondônia (Confúcio Moura), Roraima (Romero Jucá ou Rodrigo Jucá), São Paulo (Paulo Skaf), Sergipe (Jackson Barreto) e Tocantins (Kátia Abreu ou Marcelo Miranda).
É possível alterar esse cenário em oito estados, nos quais o PT pode apoiar o PMDB (Alagoas, Santa Catarina, Goiás, Paraíba, Tocantins e Mato Grosso), ou o PMDB apoiar o PT (Minas e no Paraná). Por ora, só chegaram a um acordo no Distrito Federal, onde o PMDB tem a vice do governador Agnelo Queiroz; no Pará, onde o PT apoiará Helder Barbalho; e no Sergipe, onde o PT indicará o vice de Jackson Barreto. O problema do governo nas negociações com a Câmara é que o tempo corre de forma diferenciada para os candidatos majoritários (Senado e governos estaduais) e proporcionais (Câmara e assembleias legislativas), assim como as demandas eleitorais são diferentes. Ao contrário do PT, que tem uma estrutura verticalizada, as decisões eleitorais do PMDB são tomadas em âmbito regional, com exceção da coligação nacional, que deve ser mantida. Ou seja, a maioria do PMDB não pretende romper com a presidente Dilma Rousseff e apoia o vice-presidente Michel Temer. Nas eleições locais, porém, o estrago já está feito e pode até crescer. Vem daí o maior cacife de Eduardo Cunha nas negociações com o Planalto.
Fonte: Correio Braziliense - 19/03/2014
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