quinta-feira, 28 de maio de 2015

Jarbas de Holanda - Joaquim Levy resistirá ao lulismo? O ajuste – no Congresso e depois

Logo após ou ainda durante a disputa do 1º turno presidencial, Lula foi informado por assessores, como o ex-ministro Antonio Palocci e o atual do Planejamento, Nelson Barbosa, do descalabro das contas públicas federais e dos inevitáveis efeitos recessivos e inflacionários, entre os quais o de uma queda do grau de investimento (externo) do país. A ele foi atribuída, pela imprensa, a iniciativa de pressionar e convencer a sucessora da necessidade, da troca das promessas do discurso róseo e populista da campanha reeleitoral por um duro pacote anticrise de conteúdo ortodoxo e pró-mercado. Iniciativa que teria vencido as resistências dela com os argumentos de que, sem uma reação desse tipo, a ocorrência de tais efeitos – no contexto de uma oposição fortalecida pelo equilíbrio da disputa e dos riscos gerados pela operação Lava-Jato – poderia deixá-la sem condições de governabilidade e até inviabilizar seu segundo mandato. E a ele, também segundo a imprensa, coube articular para o comando do referido pacote o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, que recusou o convite indicando para substituí-lo um diretor do banco, o economista Joaquim Levy.

O propósito do ex-presidente era evitar uma explosão do segundo governo Dilma, em seu início, por meio de um “cavalo de pau” na economia, capaz de recuperá-la para uma retomada do crescimento, mesmo precária ao longo de 2015, um ano antes das eleições municipais de 2016. “Virada” propiciadora de nova safra de programas populistas de benefícios sociais; de bons negócios, seletivos, para empresários amigos; e de atrativo para a recomposição de suas antigas alianças partidárias. Tudo tendo em vista o objetivo maior do “volta Lula” em 2018. Mas a avaliação dos riscos, reduzidos, e dos ganhos, superestimados, do “estelionato eleitoral” da afilhada teve uma falha básica. O descalabro fiscal e suas consequências numa economia de baixos níveis de produtividade e de competitividade (no mundo globalizado de hoje), resultantes do populismo desencadeado no segundo governo Lula e do intervencionismo estatizante exacerbado na gestão seguinte, eram bem mais profundos do que os das previsões feitas para a recomendação e a aplicação do “cavalo de pau”. Bem como exigiriam bem mais tempo para serem superados. E outra falha cometida no cálculo dessa aplicação: a entrega do comando do ajuste fiscal a um economista sério e de consistente formação macroeconômica. Que não esconde, ao contrário aponta com clareza, a escala e os graves efeitos das distorções fiscais praticadas nos últimos anos, de par com a defesa de um ataque a elas centrado no esforço para a recuperação dos fundamentos da estabilidade anti-inflacionária, do respeito à Lei de Responsabilidade Fiscal. Formação e seriedade como economista em face das quais seu colega Armínio Fraga qualifica o papel de Levy na tentativa (que considera inviável) de vincular o ajuste a recuperação, como a de uma “ilha” de competência e bom senso num governo basicamente hostil a esses objetivos.

Às resistências de todo tipo enfrentadas pelo ajuste preparado pelo ministro da Fazenda e proposto pelo governo – da justa indignação da sociedade (diante das medidas restritivas, após o mentiroso marketing da campanha reeleitoral da presidente e sem nenhum pedido de desculpa) até os decorrentes das implicações dessas medidas nos processos recessivo (de perda dos investimentos e do desemprego) e inflacionário (que força juros abusivos), processos já em curso desde o ano passado e a serem agravados agora, a essas resistências somam-se problemas políticos, crescentes, que obstruem o encaminhamento e a viabilização do ajuste. Problemas da fase de obtenção do respaldo legislativo para as medidas – aprovadas parcialmente no Congresso. E os relativos à implementação dele pelo Executivo, em grande parte através do contingenciamento dos recursos orçamentários, que começam e se multiplicarão envolvendo decisões que contrariam objetivos e critérios definidos na montagem do ajuste.

A aprovação, ontem, no Senado por 39 a 32 votos, da MP 665, que reduz os gastos do Estado com o seguro desemprego e o abono salarial, confirmando deliberação semelhante da Câmara, favorável ao ajuste, deve ser seguida hoje por resultado de caráter oposto em votação final da MP 664, que provavelmente confirmará o fim do “fator previdenciário”. O que, por suas fortes implicações fiscais negativas, deverá ser vetado pela presidente Dilma. E o projeto da folha de pagamentos das empresas só começará a ser votado na Câmara no meio de junho. Da fase de tramitação legislativa, o ajuste fiscal sai bastante desidratado em face da precariedade da chamada base governista, do conflito entre os presidentes do Senado e da Câmara com a chefe do Executivo e por causa do começo de uma rebelião das bases do PT.

Pouco relevante nas decisões do Congresso, essa rebelião antecipou o principal problemas que o ajuste terá pela frente. Trata-se da troca pelo ex-presidente Lula jogo duplo de apoio ao conjunto das medidas fiscais e de rejeição de parte delas, pela pressão sobre o Palácio do Planalto para a “flexibilização” do ajuste e o esvaziamento do papel ou a demissão de Joaquim Levy. O centro dessa batalha será a gestão do contingenciamento orçamentário: em vez do corte de despesas da máquina federal, a exiguidade das receitas precisa ser enfrentada com aumento de impostos contra “os ricos e os privilegiados”, de acordo com as receitas da CUT, do MST e que serão assumidas pelo PT no encontro nacional do próximo mês. A tal “virada” tática, Lula foi levado, sobretudo, pelo esgotamento político e social do seu partido que, para ele, tem de ser revertido a qualquer preço, sob pena da inviabilização do “volta Lula”.

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Jarbas de Holanda é jornalista

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