• Aos 82 anos, sociólogo e fundador do PT diz que impeachment de Dilma não é golpe, mas aposta que ele não se concretizará
“Dilma não tem mais força política para nenhuma iniciativa, não vai aprovar nada no Congresso. O difícil é saber o que vem depois disso”
Mariana Sanches - São Paulo- O Globo
O senhor entende, como dizem os defensores do governo, que o impeachment de Dilma é golpe?
É um jogo pesado mas não é golpe. Não tem as características institucionais de um golpe, é apenas um jogo extremamente pesado. O processo de perda de credibilidade do Lula é o que deveria preocupar mais o PT. Dilma se salvará do impeachment. É difícil reunir a quantidade de votos necessários para derrubá-la. Fazer declarações é uma coisa, mas, na hora de votar, o que acontece é outra. Agora, a direita está muito forte. O governo Dilma está acabado, independentemente do resultado de impeachment. O governo está apenas cumprindo prazos, os quatro anos constitucionais que lhe cabem, mas Dilma está muito desgastada, não tem mais força política para nenhuma iniciativa, não vai aprovar nada no Congresso. O difícil é saber o que vem depois disso, em 2018.
O que o senhor achou da nomeação de Lula para o ministério da presidente Dilma?
Foi uma manobra infeliz. Quem tem a experiência do Lula não pode cometer um passo em falso desses. Ficou muito evidente que era uma jogada para salvar o próprio Lula e o governo. Isso político experiente não faz, fica muito na cara! E deu tudo errado. Foi surpreendente, o Lula não é um aprendiz, está lá há 50 anos. Só o que explica é o desespero para tentar segurar o governo, o que também é uma bobagem, já que o governo Dilma não existe mais.
Que erros levaram o PT ao ponto em que está?
Há uma forte acusação ao PT que se reflete em cima do Lula, que de fato não conseguiu formar um partido. A explicação é que ele personalizou tanto o partido que na prática o PT não existe. Quem são os quadros do partido? José Dirceu está na cadeia, Genoino apagou- se, a saída da Marta foi uma perda inominável. O (prefeito Fernando) Haddad é um universitário, ele não tem uma pegada forte. Para ser referência, ele teria que perder o ar acadêmico, esse estilo de falar, e ser mais populista. Não sobrou nem surgiu ninguém, então eles primeiro recorreram a Dilma e, depois, sempre o recurso único foi o Lula. O PT hoje não tem ninguém, não acredito que o Lula será o candidato para 2018. O PT, que tirou a esquerda brasileira do limbo em que ela sempre vegetou e a levou à Presidência, já perdeu no confronto de forças políticas. E a esquerda voltou para o limbo. A esquerda e Lula perderam a credibilidade.
Como o senhor vê a disputa de 2018?
Da perspectiva do Lula, ele tem que fazer campanha todo dia até lá. Como ele está fazendo, tem que estar na mídia todo dia, precisa incendiar a massa para não acabar incendiado. É uma manobra tática muito arriscada do Lula se lançar candidato, ninguém pode garantir o que acontecerá até lá, mas acho improvável isso se confirmar. O Lula está tentando reaglutinar as forças, organizar a tropa. E espera que o pau coma do lado adversário, o que também pode acontecer, porque (José) Serra, (Geraldo) Alckmin e Aécio (Neves) precisam decidir quem comanda a articulação de oposição. Isso vai desgastá-los. Mas, de qualquer maneira, o cabeça da oposição terá grande chance de ganhar.
Qual a sua interpretação sobre a saída do PMDB do governo?
O PMDB é isso que sempre foi, uma aglutinação heterogênea que nunca define chapa de cabeça. A ruptura não é para valer. O PMDB embaralha as cartas mas não as dá. Ele é um agregado, não forma forças nacionais. Quem acredita no (vice-presidente Michel) Temer? Quem se entusiasma com ele? O risco para o PT não é o PMDB, são os tucanos. Não é à toa que o Serra voltou a aparecer. Ele é um risco real para o PT, é um político competente, duro e contundente. Está sempre com os dados na mão.
Como seria um eventual governo Temer, caso Dilma seja impedida?
Não vai fazer nada, vai ser um refém das forças que fizeram o processo contra Dilma. Vai ser um governo fraco, incapaz de formulações. Até porque a somatória dessas forças anti- PT é muito heterogênea, aquilo é um saco de gatos. Os próprios tucanos não lideram nem definem as diretrizes em um governo Temer. Aquele programa “Uma ponte para o futuro” é meramente formal. Se você me pedir, eu faço um programa daqueles em meia hora aqui nessa mesa.
Marina Silva desponta como uma candidata forte em 2018?
Não. A Marina, com essa história de sustentabilidade, não comove ninguém, não tem apelo popular. Em política, ou você dá um murro na mesa, ou sai da frente. Ela é uma preferência civilizada do eleitor, mas não passa disso.
Qual é a sua avaliação sobre a Operação Lava Jato?
É evidente que (o juiz) Sérgio Moro está fazendo uma opção política. Quem quiser acreditar que ele está orientado pela busca da verdade jurídica, que acredite, mas estamos assistindo a uma operação política poderosa. Ele não dorme de touca e sabe que está tirando a credibilidade do Lula, que é o alvo, e do PT e beneficiando o PSDB. Isso ficou claro no episódio do áudio entre Lula e Dilma, muito embora a conversa seja de uma ingenuidade gigantesca da presidente. Como dois políticos experimentados vão ter uma conversa como essa pelo telefone?
Mas se a operação é política, quem a patrocina?
Não acho que alguém esteja patrocinando a operação com algum fim, a situação vai se desenhando. O que não tira a gravidade da coisa. Dar encaminhamento jurídico a uma disputa política é um erro.
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