-Folha de S. Paulo
Fato curioso é a composição socioeconômica das manifestações contra e a favor do impedimento da presidente. Ambas reúnem majoritariamente pessoas ricas, brancas e de mais idade. A divergência marcante entre as duas turmas é a presença muito maior de servidores públicos nas manifestações contrárias ao impedimento.
Na terça (29), o jornal "Valor Econômico" publicou entrevista com Renato Meirelles, presidente do Instituto Data Popular. O ponto alto da entrevista foi a afirmação de que "é impossível entender o que acontece hoje sem voltar um ano e meio atrás, quando a oposição conseguiu perder uma eleição em que 73% dos eleitores queriam mudança".
A vitória de Dilma, além da profusão de mentiras e da campanha suja promovida por João Santana, deveu-se à incapacidade que a oposição teve de convencer a população de que o esforço por medidas que visem reduzir a desigualdade e aliviar a pobreza continuariam.
Como destaca Meirelles, provavelmente a ausência da classe C –que está muito descontente com o governo– das manifestações favoráveis ao impedimento resulta da mesma dúvida: o que ocorrerá com programas como o Fies, com a troca de governo? Essas dúvidas os afastam das ruas.
Como aponta Meirelles, dos 80% que desaprovam Dilma, 36 pontos percentuais correspondem aos que não gostam de Dilma e também não gostam do ProUni, do Fies, do Mais Médicos e das cotas nas universidades.
Os outros 44 pontos desaprovam Dilma exatamente porque houve pé no freio desses programas!
Ou seja, o país está rachado, mas não é essa rachadura que se exibe na divisão de quem vai para as ruas. A rachadura encontra-se no papel do setor público. Parcela da sociedade que deseja o impedimento quer menos Estado e menos impostos. A outra parcela, que se encontra silenciosa, mas decepcionada com a presidente, quer mais Estado.
Parece difícil conciliar interesses aparentemente antagônicos, mas a arte da política é a construção de consenso. O contrato social possível para juntar os dois grupos é o aumento da eficiência do setor público. A necessidade de reformar o Estado brasileiro unifica as turmas.
Um primeiro item dessa agenda já foi identificado: reduzir ao mínimo o intervencionismo estatal no funcionamento dos mercados, dispendioso e ineficiente em dimensões superlativas. Temos que nos desfazer de desonerações estúpidas, subsídios monstruosos do BNDES sem nenhum impacto sobre a produtividade e outras políticas de incentivos à produção que custam muito e não apresentaram nenhum resultado visível. O Estado de bem-estar e o nacional-desenvolvimentismo não cabem no Orçamento.
Um segundo item da agenda é reformar o funcionamento do Estado. Esse processo está parado desde o governo FHC e precisa ser retomado: modernizar toda a gestão de pessoal do serviço público, votar lei de greve de servidor que proteja os interesses dos cidadãos e criar e adotar como prática corrente a avaliação das políticas públicas com regras legais que garantam o encerramento dessas políticas, ou porque atingiram seus objetivos ou porque não funcionaram, entre outras providências.
Adicionalmente, temos de cortar programas caros que atendem à classe A, como universidade pública gratuita para quem estudou em escola particular.
Essa agenda unifica os 80% que estão descontentes com o governo Dilma: fortalece o Estado e garante a aceleração do crescimento.
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