segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Janot suspende delação

• Vazamento de informações põe em risco acordo de ex-presidente da OAS

Jailton de Carvalho - O Globo

-BRASÍLIA- A Procuradoria Geral da República determinou a suspensão das negociações do acordo de delação premiada do ex-presidente da OAS Léo Pinheiro e de outros executivos da empreiteira, segundo disse ao GLOBO uma fonte que acompanha o caso de perto. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e outros investigadores se irritaram com o vazamento de um dos assuntos tratados na fase pré-acordo de colaboração.

Para o Ministério Público Federal, houve quebra de confidencialidade, uma das cláusulas do pré-acordo firmado há duas semanas entre o grupo de trabalho do MPF e os advogados da empreiteira. Janot teria entendido que a divulgação de uma informação sobre citação ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli teria como objetivo forçar a Procuradoria-Geral da República a aceitar o acordo de delação conforme os interesses dos investigados.


Nas tratativas iniciais não há qualquer anexo em que Léo Pinheiro ou algum outro executivo da empreiteira tenha se comprometido a fazer acusação de envolvimento de Toffoli ou de outro ministro do STF em desvios investigados na Operação Lava-Jato. Numa das mensagens extraídas do celular de Pinheiro, há referência a uma obra na casa de um ministro do STF, mas não há nomes nem indicação da prática de crime.

A revista “Veja” publicou na edição desta semana que Toffoli foi citado por Léo Pinheiro. Segundo a reportagem, o ex-executivo da OAS teria se comprometido a falar sobre conversa que manteve com o ministro do Supremo. Ainda conforme a revista, no encontro, Toffoli teria reclamado que tinha problemas de infiltração em sua casa. Após a conversa, a OAS teria enviado engenheiros à residência do ministro e indicado uma empresa para fazer o serviço. A revista informa que Toffoli contratou a empresa e arcou com a conta. Não há qualquer referência sobre pagamentos indevidos ao ministro. O próprio Toffoli disse que não tem relação de proximidade com o ex-presidente da OAS. O ministro ainda confirmou que ele mesmo pagou a conta do serviço de impermeabilização.

Decisão complica situação de empresário
Esta é a primeira vez que o procurador-geral da República determina a suspensão de um acordo de delação desde o início da Lava-Jato, em março de 2014. A decisão de Janot pode complicar a situação de Pinheiro, que já foi condenado pelo juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, a mais de 16 anos de prisão por fraudes em contratos na Petrobras. O acordo seria uma das únicas esperanças de ele reduzir o tempo na prisão.

As negociações entre Ministério Público Federal e representantes de Pinheiro tiveram início em março, mesmo período também das tratativas entre procuradores e advogados da Odebrecht, maior rival da OAS. Depois de avanços e recuos, há duas semanas, os advogados de Pinheiro selaram um pré-acordo com procuradores de Brasília e Curitiba para fazer uma das mais importantes delações da Lava-Jato. Mas todo o esforço das duas partes pode ter sido em vão.

Quando as negociações foram iniciadas, havia expectativa sobre os relatos que Pinheiro pudesse fazer das relações com o PT e também sobre obras realizadas em imóveis usados pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Num celular de Léo Pinheiro também foram encontradas inúmeras trocas de mensagens com políticos de vários partidos. Um acordo de delação poderia ajudar a traduzir algumas das conversas e identificar quais eram de fato combinações para favorecer a empreiteira em contratos com o governo e quais tratavam de doações para campanhas eleitorais em esquema de caixa dois.

Enquanto as negociações com a OAS retornam à estaca zero, a Odebrecht tenta fechar a delação de seus ex-executivos. O ex-dirigente da empreiteira Marcelo Odebrecht e outros executivos já começaram a prestar depoimento, mas ainda não há previsão de quando o processo será concluído para ser submetido à homologação pela Justiça Federal do Paraná e pelo ministro Teori Zavaski, relator dos inquéritos vinculados à Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal. Entre os investigadores, há a impressão de que os representantes da empresa querem contar muito pouco do que sabem e, por isso, ainda não há certeza de que o acordo deles chegará mesmo ao final.

Em setembro do ano passado, num depoimento à CPI da Petrobras, Marcelo Odebrecht chegou a ridicularizar a delação e disse que repreendia suas filhas se alguma delas dedurasse alguém:

— Eu acho que tem valores, inclusive morais, dos quais eu nunca abrirei mão. Eu diria que entre esses valores, eu, desde criança, quando lá em casa, as minhas meninas tinham discussão e tinham uma briga, eu dizia: “Olha, quem fez isso?”. Eu diria o seguinte: eu talvez brigasse mais com quem dedurou do que com aquele que fez o fato — disse o empreiteiro na época, afirmando que não tinha o que “dedurar”.

Poucas chances de voltar ao comando
Mas se toda a negociação se concretizar, integrantes da empresa acreditam que dificilmente haverá possibilidade de Marcelo Odebrecht voltar a ocupar algum cargo no grupo. Em uma das condenações do juiz Sérgio Moro já foi imposto como pena acessória a proibição de o empresário retornar a cargos de direção da empresa. O discurso ofical da Odebrecht é de que, passada a delação, a empresa terá que dar explicações públicas sobre como pretende implantar sistema de controle e transparência.

Ontem, O GLOBO noticiou que executivos da Odebrecht relataram no processo de delação premiada que a empreiteira pagou pelo menos R$ 100 milhões em propina para o PT. As negociações teriam sido intermediadas pelo ex-ministro da Fazenda Guido Mantega. Os valores teriam sido pagos pela empresa a partir do setor que cuidava das operações de caixa dois, chamado de Setor de Operações Estruturadas da holding. Esse setor chegou a ter as informações apagadas nos provedores da Odebrecht, mas, no processo de acordo para delação, executivos se comprometeram a recuperar as informações. De acordo com o relato dos executivos, a maior parte dos pagamentos teria sido feita em troca de benefícios obtidos junto ao governo. Segundo noticiou O GLOBO, entre esses benefícios estariam a desoneração da folha de pagamentos e a redução de imposto de renda sobre o lucro de empresas brasileiras no exterior.

Na negociação de delação, os funcionários detalharam as cifras operadas pelo Setor de Operações Estruturadas, comandado pelo diretor Hilberto Silva no 16º andar da sede da Odebrecht em São Paulo, o mesmo onde funciona a presidência da empresa. As contas usadas para bancar pagamentos eram abastecidas pelas diversas firmas do grupo. Só a Braskem teria repassado cerca de R$ 500 milhões para o setor responsável pelo pagamento de propinas ao governo federal e a governos estaduais.

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