Por Ribamar Oliveira, Andrea Jubé e Fábio Graner | Valor Econômico
BRASÍLIA - A decisão do governo de aceitar mudanças em cinco pontos da reforma da Previdência Social, negociadas ontem com o relator Arthur Maia (PPS-BA), reduzirá em 17% a economia prevista inicialmente, quando do envio da proposta ao Congresso. Significará menos R$ 115,2 bilhões em dez anos, segundo cálculo da Casa Civil da Presidência da República. O Ministério da Fazenda preferiu não fazer uma estimativa, com o argumento de que ainda não se conhecem os detalhes das mudanças.
A Fazenda trabalha com a hipótese de que as mudanças negociadas permitirão estabilizar os gastos do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) em torno de 9,1% do Produto Interno Bruto (PIB). Se nada for feito, as despesas chegarão a 11% do PIB no prazo de dez anos, advertiu fonte credenciada da área econômica. Se a proposta fosse aprovada pelo Congresso como foi enviada, o gasto ficaria estabilizado pouco abaixo de 9% do PIB, algo como 8,8% do PIB. "Assim, as negociações não comprometem o ajuste fiscal", afirmou a mesma fonte.
Se a conta divulgada pela Casa Civil estiver correta, o custo fiscal das mudanças colocará em risco o cumprimento do teto de gastos da União aprovado no fim do ano passado. Isso porque o governo teria que cortar em outras despesas o mesmo montante do aumento do gasto com a Previdência.
O acordo feito com o relator da reforma prevê alterações na regra de transição, na aposentadoria do trabalhador rural, nos regimes especiais para policiais e professores, no Benefício de Prestação Continuada (BPC) - para idosos e pessoas com deficiência de baixa renda - e nas pensões.
Maia pretende que nenhum benefício previdenciário seja menor que um salário mínimo, por uma questão de "justiça social". A proposta do governo permitia que isso ocorresse nas pensões, porque o beneficiário ficaria com apenas 60% do valor caso não tivesse filhos.
O presidente Michel Temer disse que autorizou o relator a fazer acordos nos pontos mais sensíveis da reforma "desde que se mantenha a idade mínima, que é o que aconteceu em vários países".
Governo cede em cinco pontos da reforma
Sem saída, o governo redefiniu a estratégia de comunicação e decidiu anunciar ontem a flexibilização de cinco pontos da proposta de reforma da Previdência Social. O parecer ao projeto será apresentado no dia 18 de abril pelo relator, deputado Arthur Maia (PPS-BA), mas as resistências dos deputados da base vêm crescendo e colocando em risco a aprovação da matéria, prioridade do presidente Michel Temer.
Serão alteradas a regra de transição, aposentadoria do trabalhador rural, os regimes especiais para policiais e professores, o Benefício de Prestação Continuada (BPC) - para idosos e pessoas com deficiência de baixa renda - e as pensões. Segundo Maia, a idade mínima de 65 anos é "um ponto definitivo". "São mudanças na direção de atender as pessoas menos favorecidas e acabar com os privilégios", afirmou.
O discurso de preservar os mais vulneráveis foi repetido à exaustão após reunião de Temer com o relator, o presidente da comissão, deputado Carlos Marun (PMDB-MS), os ministros da Fazenda, Henrique Meirelles, da Casa Civil, Eliseu Padilha, e do Governo, Antonio Imbassahy. O tom atende reclamações da base de que é preciso "construir uma narrativa" de defesa da reforma que não seja focada apenas na necessidade de sanear as contas.
Temer interrompeu a reunião para desencadear a estratégia em entrevista ao apresentador José Luiz Datena na Rádio Bandeirantes - ouvido pelas camadas mais populares - e dizer que autorizou o relator a fazer acordos nos pontos mais sensíveis, "desde que se mantenha a idade mínima, que é o que aconteceu em vários países". O presidente ainda tratou do assunto em entrevista à imprensa e gravou vídeo para redes sociais.
Ficou decidido que nenhum benefício previdenciário pagará menos que um salário mínimo por questão de "justiça social". A proposta original permitia que isso ocorresse nas pensões porque o beneficiário ficaria com apenas 60% do valor caso não tenha filhos. A PEC também desvincula o BPC do salário mínimo, sem estabelecer regra de reajuste, o que visava reduzir o valor dos pagamentos, que somam R$ 45 bilhões por ano.
Nos dois casos, será garantido pelo menos o salário mínimo. O relator só analisa, segundo contou a parlamentares, uma regra para diferenciar o BPC - que não exige tempo de contribuição - da aposentadoria por idade. A PEC pretendia elevar o acesso dos idosos ao BPC de 65 anos para 70. Mas para não deixar essa população desassistida, e ao mesmo tempo não ser injusto com quem contribuiu, está sendo avaliado pagar 50% para quem pedir o BPC aos 65 anos. Esse valor subiria 10 pontos percentuais ao ano até chegar ao valor integral para quem aguardasse até os 70 anos para solicitar o auxílio.
Maia também informou a parlamentares que permitirá o acúmulo de pensões e aposentadorias, o que, pela PEC, estaria proibido e o segurado deveria optar por apenas um dos benefícios. Mas ainda discute o limite que será fixado. PSDB e do SD defendem que seja o teto do INSS, hoje de R$ 5.531,31, para não prejudicar a classe média. O governo defende valor menor, de até dois salários mínimos (R$ 1.874,00), com o argumento de que a maioria da população estaria contemplada e evitaria um impacto maior nas contas públicas.
A regra de transição, um dos pontos mais polêmicos e complexos, ainda é discutida. A proposta do governo é que homens com mais de 50 anos e mulheres com mais de 45 anos sejam afetados com um pedágio de 50% sobre o tempo que falta para solicitação da aposentadoria. Os com menos idade seriam integralmente atingidos e teriam que completar 65 anos de idade com 25 anos de contribuição.
Há duas alternativas sendo estudadas e que podem acabar até sendo combinadas na versão final. Mas todas consideram que, para aumentar o número de beneficiados, aqueles que estavam mais próximos da aposentadoria pelas regras da PEC terão que trabalhar a mais. "Como estamos defendendo que ninguém deve se aposentar com 50 anos, não faz sentido manter uma regra que permite alguém receber o benefício com 51 anos", disse Marun. "É o que eu defendo, que tenha uma regra mais justa."
Uma das possibilidades prevê a combinação entre a idade e o tempo de contribuição, privilegiando quem entrou mais cedo no mercado de trabalho. Outra é variar a idade mínima para quem estiver dentro da regra de transição (que, no modelo mais generoso, começaria a partir dos 40 anos para os homens e 35 para as mulheres - mas equipe econômica defende uma restrição maior, para os com mais de 43 anos. A Fazenda ainda faz as contas para medir o impacto.
Outro recuo é que os trabalhadores rurais manterão um tratamento diferenciado. Atualmente eles têm idade mínima de 60 anos para homens e 55 para mulheres. O relator afirmou que isso deve ser preservado ou, pelo menos, que a elevação na idade seja menor. Está em discussão, também, que o tempo de contribuição exigido para esses casos seja de 20 anos.
O governo também está disposto a "preservar condições diferenciadas" para os professores e policiais. Segundo Maia, essas duas categorias, por características próprias, foram historicamente contempladas com condições diversas. A fórmula ainda é discutida. Seria uma idade mínima menor que a geral, mas também mais elevada que hoje. Esses são dois dos principais focos de preocupação e, por isso, o governo já chegou até a anunciar que os servidores dos Estados e municípios com regime próprio de previdência poderão adotar regras próprias em até seis meses.
A equiparação da idade mínima de aposentadoria para mulheres é ponto central para o governo e não será alterada no relatório, afirmou Maia. Articuladores do governo, contudo, dizem que há forte pressão da bancada feminina, com 43 deputadas na base, além dos homens. Se isso não for alterado, dizem, há sério risco de derrota em plenário.
O governo não deseja vender as concessões como derrota e a versão definitiva das mudanças será anunciada em reunião de Temer com o relator e a base, numa tentativa de amarrar o apoio dos partidos e dizer que a proposta está sendo aperfeiçoada. "Prestar obediência ao que o Congresso Nacional sugere - e o Congresso é o centro das aspirações populares - não pode ser considerado recuo", rebateu Temer.
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