- O Globo
Ao assumir ministério, a pastora Damares Alves indicou que pode usar a estrutura do governo para ampliar o rebanho das igrejas evangélicas
O tom da nova ministra foi grandiloquente. “Queremos fazer a grande revolução que o Brasil precisa”, proclamou. As palavras sugeriam o anúncio de uma meta universalista, como o fim do analfabetismo ou a erradicação da pobreza. Mas a revolução pretendida por Damares Alves era outra. “Neste governo, menina será princesa e menino será príncipe”, disse.
Ao assumir o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, na quarta-feira, a pastora discursou como se estivesse no púlpito de sua igreja. “Eu acredito nos desígnios de Deus, eu acredito nos propósitos de Deus, e Deus uniu nesse ministério um time, ele uniu um exército”, empolgou-se.
Indicada pela bancada evangélica, Damares promete turbinar no Executivo as bandeiras conservadoras que seus padrinhos defendem no Congresso. Numa pasta que deveria proteger a diversidade e as minorias, ela indicou que atuará como propagandista da sua própria crença. “O Estado é laico, mas essa ministra é terrivelmente cristã”, resumiu.
Embora não tenha sido nomeada para o Ministério da Educação, a pastora deixou claro que vai se empenhar pela aprovação do projeto Escola Sem Partido. “Acabou a doutrinação ideológica de crianças e adolescentes no Brasil!”, bradou. “Glória a Deus!”, responderam os aliados na plateia.
Ela também indicou a intenção de usar a estrutura do ministério para se aproximar de novos fiéis em potencial. “A secretaria estará indo aos acampamentos de ciganos e às aldeias indígenas”, disse. Damares é fundadora de uma ONG que envia missionários evangélicos a povos da Amazônia, com o objetivo declarado de combater o infanticídio.
Em tom de deboche, a pastora mencionou as críticas de indigenistas, procuradores e policiais à entidade. Segundo reportagem da “Folha de S.Paulo”, a Polícia Federal já notificou a Funai sobre a suspeita de que a suposta ação humanitária encubra a prática de tráfico de crianças. “A imprensa fala que eu sou sequestradora. Hmmmm, sou perigosa!”, ironizou.
Com números na ponta da língua, a nova ministra demonstrou que seu público-alvo já está mapeado. “Somos 800 mil índios e um milhão de ciganos”, disse. Os indícios de que Damares pretende usar o cargo para ampliar o rebanho das igrejas estão aí. No entanto, a internet preferiu discutir o vídeo em que ela anuncia uma “nova era no Brasil” e informa, com pulinhos de euforia, que os meninos vão vestir azul e as meninas sairão de rosa.
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