- O Globo
A decisão do Facebook confirmou que ações ilegais são cometidas dentro do Palácio do Planalto
O “gabinete do ódio”, que durante anos foi dado por bolsonaristas como uma fake news, materializou-se ontem, como nomes e datas, na ação internacional do Facebook que tirou do ar uma rede composta por 88 contas, páginas e grupos que atuavam em conjunto no Facebook e também no Instagram, empresas do mesmo grupo, todos com ligações com o presidente Bolsonaro, seus filhos, e políticos aliados.
A decisão do Facebook confirmou que ações ilegais são cometidas dentro do Palácio do Planalto, com um grupo de assessores pagos para disseminar notícias falsas. Um dos objetivos do Facebook é tentar mudar a imagem da companhia, percebida por parte de anunciantes importantes e da sociedade internacional como veículo conivente com a difusão de mentiras e campanhas de ódio.
Vários dos implicados, nominados pela investigação do Digital Forensic Research Lab, são assessores especiais do presidente Jair Bolsonaro e têm gabinete perto do presidente. Outros são assessores, ou ligados a Carlos e Flavio Bolsonaro.
A confirmação da atuação do grupo, que já era reconhecida nos meios políticos e está sendo investigado pela CPI das Fake News na Câmara e por um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre mensagens antidemocráticas e ameaças a ministros da Corte, pode ter desdobramentos em outro inquérito, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
As informações colhidas pela CPI e pelo Supremo podem ser compartilhadas no TSE num dos inquéritos contra a chapa Bolsonaro-Mourão, que apura o impulsionamento de mensagens falsas pelo WhattsApp durante a campanha eleitoral. Como o WhattsApp é também do grupo dirigido por Mark Zuckerberg, é provável que essa varredura também seja feita para banir do aplicativo de mensagens as contas falsas, os robôs e os impulsionamentos em massa, proibidos tanto pela legislação eleitoral brasileira quanto pelas normas do aplicativo.
Contas da presidente do PT, Gleisi Hoffman, no WhattsApp, usadas para distribuir mensagens políticas em massa, foram desativadas pelo WhatsApp justamente porque ela utilizava impulsionamentos ilegais para essa atividade política. Ela contratou com o dinheiro partidário uma empresa especializada em impulsionamentos em massa pelo WhattsApp, mas não foi acusada de disseminar fake news.
A investigação encomendada pelo Facebook revelou que esse grupo de bolsonaristas foi formado em 2018, o que leva a crer que atuaram durante a campanha presidencial. O inquérito das fake news do Supremo, cujo relator é o ministro Alexandre de Moraes, pediu a quebra de sigilo bancário e telefônico de diversos investigados a partir de 2018, justamente para abranger o período da campanha eleitoral.
O cruzamento dessas informações provavelmente dará indicações da atuação desse grupo que ficou conhecido como componentes do “gabinete do ódio”, e pode comprovar que a campanha bolsonarista utilizou os novos meios de comunicação para difundir notícias falsas contra seus adversários.
Além de ter utilizado impulsionamentos de mensagens através de artifícios como robôs ou contas-fantasmas para burlar a fiscalização. O avanço das investigações, tanto internamente quanto no exterior, levou a protestos de seguidores de Bolsonaro, e o deputado federal Otoni de Paula, a propósito da prisão do blogueiro Oswaldo Eustáquio, chamou o ministro do Supremo de “esgoto do STF” e “canalha”, entre outras ofensas.
Reações como essas, espalhadas pelas redes sociais, apenas confirmam a índole desses seguidores de Bolsonaro que estão sob investigação. O cerco está se fechando em diversas instâncias, e os grupos que espalham fake news pelos novos meios estão sob escrutínio dos órgãos de fiscalização.
O caráter odiento da política bolsonarista está sendo contido pelas instituições brasileiras e pela exigência internacional de uma democracia responsável e ética. Assim como os anunciantes do Facebook, os investidores internacionais também pressionam os países a seguirem uma política humanista em relação às minorias, como os indígenas, e ao meio-ambiente. No mundo pós-pandemia, talvez uma possível derrota de Donald Trump nos Estados Unidos reduza o espaço para os radicalismos.
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