Esquentam
a disputa pelo comando da Câmara dos Deputados e a polêmica jurídica sobre a
Lei da Ficha Limpa, flexibilizada pelo do STF ministro Kassio Nunes Marques
No
jargão jornalístico, flores do recesso são os assuntos que tomam conta do
noticiário político quando o Congresso e o Judiciário estão sem funcionar,
geralmente alimentados pelo Executivo, pelos candidatos ao comando da Câmara e
do Senado e pelos ministros de plantão no Judiciário. São tão frondosas como as
flores da primavera, porém, menos decisivas do ponto de vista do processo
político. Entretanto, nesses tempos bicudos de pandemia do novo coronavírus,
com mais de 190 mil mortos e sem data marcada para o começo da vacinação,
estamos diante é de flores com espinhos.
As principais são a disputa pelo comando da Câmara dos Deputados, que a oposição encara como uma espécie de batalha de Stalingrado, para conter o avanço de Jair Bolsonaro rumo à reeleição à Presidência da República, e a polêmica jurídica sobre a Lei da Ficha Limpa, cuja flexibilização, pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Kassio Nunes Marques, o novo integrante da Corte indicado pelo presidente, supostamente possibilitaria — entre outras — a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Palácio do Planalto em 2022. Esse seria o adversário que Bolsonaro gostaria de ter no segundo turno, para uma espécie de vitória de Waterloo particular. Essas duas disputas, durante o recesso, podem nos trazer alguma emoção política, ao lado da polêmica sobre as vacinas contra a covid-19.
Há
momentos que catalisam as forças da história e mudam o seu rumo. A Batalha de
Stalingrado, por exemplo, durou um pouco mais de seis meses, do fim de julho de
1942 até 2 de fevereiro de 1943, tempo suficiente para mudar os rumos da
guerra, ao preço de 1,5 milhão de mortos. Teve quatro fases distintas: a
avassaladora ofensiva alemã; a obstinada reação russa, ao norte e ao sul, que cercou
as tropas alemãs; a fracassada tentativa de Hitler de socorrer seu exército; e
a rendição do que restou dele, faminto, sem combustível nem munição.
Mesmo
com a vantagem numérica, os alemães não conseguiram vencer a resistência do
Exército Vermelho, em razão do conhecimento do terreno, das condições
climáticas, da experiência em batalhas de rua, das táticas antitanque, da
artilharia de barragem e da capacidade logística. O exército alemão rendeu-se
em 2 de fevereiro, com cerca de 91 mil soldados, entre eles 22 generais.
Entretanto, 11 mil alemães decidiram lutar até a morte, dois mil foram mortos,
e os demais foram levados presos. O resto da história todos conhecem.
Napoleão
havia fugido da ilha de Elba a 26 de fevereiro de 1815, em direção ao sul da
França, e logo conseguiu apoio popular para fazer frente a Inglaterra, Prússia,
Áustria e Rússia, montando um exército com 125 mil homens e 25 mil cavalos.
Marchou para a Bélgica, a fim de impedir a coalizão dos exércitos inglês e
prussiano. Ao alcançar Charleroi, o exército de Napoleão dividiu-se em dois,
com uma parte seguindo em direção a Bruxelas, para encontrar as tropas de
Wellington, e outra, comandada pelo próprio Napoleão, em direção a Fleuru,
contra o exército prussiano de Gebhard von Blücher. A ideia de Napoleão era
derrotar um de cada vez.
Napoleão
venceu os prussianos na chamada Batalha de Ligny. Partiu, depois, para
Waterloo, onde encontrou os ingleses, em 17 de junho, em solo encharcado, que
dificultava o posicionamento dos canhões. Estava certo de que as forças
prussianas não se reagrupariam e chegariam a tempo para socorrê- los. Seu erro
foi dar a tarefa de perseguir os prussianos em retirada ao marechal Grouchy,
“homem medíocre, valente, íntegro, honrado, confiável, um comandante de
cavalaria de valor várias vezes comprovado, mas um homem de cavalaria e nada
mais”, nas palavras de Stefan Zweig, em Momentos decisivos da humanidade
(Record).
Iniciada a batalha, a artilharia inglesa surpreendeu Napoleão, com um novo armamento: granadas. Mesmo assim, os franceses avançaram e deixaram Wellington por um fio. Entretanto, o general prussiano Blücher enganou os franceses. Encarregado de persegui-lo, Grouchy recusou-se a voltar para Waterloo, apesar dos apelos de seu Estado Maior, que tomara conhecimento do início da batalha contra Wellington; para não contrariar as ordens que recebera, continuou em busca das tropas prussianas, supostamente em retirada. Blücher, porém, flanqueou os franceses e chegou em socorro de Wellington; as tropas de Grouchy, o disciplinado marechal, não. A contraordem de Napoleão, pedindo a sua ajuda, chegara tarde demais.
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