Tema
renasce em razão dos pedidos contra Bolsonaro
Desde 1992, como analista político, convivo com a questão do impeachment. Naquele ano, quando Fernando Collor entrou na mira do Congresso, nosso call foi o de que o impeachment seria inevitável. No caso do mensalão, escândalo envolvendo a compra de apoio no Congresso pelo governo que veio a público em 2005, tivemos uma abordagem mais cautelosa. O impeachment de Lula, então presidente da República, não era óbvio, apesar da gravidade das acusações.
No
final do primeiro mandato do governo Dilma Rousseff, por causa da Operação
Lava-Jato e da mastodôntica incompetência política da presidente, o impeachment
reapareceu como possível no radar político. Deu no que deu. Já no governo de
Michel Temer, quando ocorreu o episódio JJ (Joesley Batista e Rodrigo Janot),
muitos apostaram que o impeachment seria aprovado. Nosso call foi o de que isso
não aconteceria. E não aconteceu.
Para avaliar a questão, devemos examinar três aspectos críticos: a popularidade do presidente, sua base política e o motivo do pedido. Obviamente, um presidente popular é menos vulnerável ao impeachment, independentemente da gravidade do motivo. Temer, porém, embora não fosse popular, sobreviveu aos pedidos de abertura do processo contra ele por causa de um aspecto fundamental: ele tinha uma base política no Congresso.
O
terceiro elemento da equação é o motivo. Por incrível que pareça, esse é o
menos importante. Salvo um motivo extravagante e inquestionável, um presidente
da República não sofre impeachment apenas por ter cometido uma falta ou um
crime. Em se tratando de julgamento político — e não jurídico —, a conjuntura e
as circunstâncias, assim como o seu apoio político, são o que mais pesam no
início e ao longo da tramitação.
Nos
casos de Collor e Dilma, houve uma conjunção de fatores determinantes: baixa
popularidade; fragilidade política no Legislativo; e existência de motivo.
Collor e Dilma eram impopulares nas ruas, na imprensa e no Parlamento. Já Lula
era popular nas ruas e entre deputados e senadores. Temer era impopular na
imprensa e na opinião pública, mas forte o suficiente no Congresso para impedir
o avanço do processo.
No
alvorecer de 2021, o tema volta ao debate pela existência de dezenas de pedidos
de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro no Congresso. No entanto, a
questão não é simples. Muitos desses pedidos visam apenas ao desgaste político
pensando no futuro. Outros são feitos na base do “vai que cola”.
A
possibilidade de impeachment de Jair Bolsonaro, no momento, não parece viável,
já que o apoio político a ele e a sua popularidade lhe servem de proteção. As
circunstâncias teriam de piorar muito para que tanto a sua base política quanto
a sua popularidade se tornassem tóxicas à sua permanência no Palácio do
Planalto.
Deixando
a fria análise de lado, acredito que, para o país, mais um processo de
impeachment seria extremamente desgastante. Por outro lado, as crises políticas
devem ser resolvidas. E de preferência com negociação, entendimento e
sempre dentro das regras constitucionais.
Publicado em VEJA de 3 de fevereiro de 2021, edição nº 2723
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