- Folha de S. Paulo
Confesso que, em jovem, usei-a para fins
alucinógenos. Era só misturá-la com cocaína e gritar Shazam!
Acordei outro dia com dor de barriga.
Seguidor das sessões da CPI
da Covid e impressionado pelo ardor com que os senadores bolsonaristas
defendem o remédio cloroquina, tomei-o por conta própria em forma de
antiespasmódico. Por via das dúvidas, passei o dia a banana, chuchu desidratado
e biscoito de cachorro. E —milagre!—, 24 horas depois, já com a serpentina
regularizada, encarei a feijoada com buchada do Samba do Trabalhador, grande
evento carioca das segundas-feiras, no Andaraí, e cá estou.
Na verdade, a cloroquina, também chamada de hidroxicloroquina quando tomada com água, já me tinha salvado a vida em criança nos surtos de sarampo, caxumba e catapora. Superei todas essas moléstias pelo uso do remédio, a mim ministrado por um assistente social que lera a respeito numa publicação científica, "Flash Gordon no Planeta Mongo". A cloroquina, parece, era a droga favorita do imperador Ming, arqui-inimigo de Flash.
No futuro, eu ouviria falar da cloroquina
como um remédio batata, mesmo sem evidências científicas, contra a gravidez
indesejada e certa doença venérea envolvendo insetos. Como nunca tive nenhuma das
duas, não posso garantir. E, talvez pelo nome marcante, identifiquei-a como
sendo a droga vendida na rua pelos camelôs --aqueles que atraíam um círculo de
ouvintes numa praça e levavam horas falando de uma cobra que estaria dentro da
mala, no chão, no meio do círculo. Quando os otários descobriam que não havia
cobra nenhuma, era tarde. Já tinham comprado o estoque de cloroquina do camelô.
Em jovem, usei a cloroquina para fins
alucinógenos. Era só esmagar o comprimido, misturá-lo com cocaína e aspirá-lo
pelo canudinho da Bic. Em um segundo, gritava "Shazam!" e me
transformava em Che Guevara.
Ouço dizer agora que o dr. Jair Bolsonaro prescreve a cloroquina como tratamento precoce contra a Covid em emas. Faz sentido.
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