O Globo
A primeira, escrita por Lula
em 2002, foi endereçada ao mercado, a de agora seria destinada aos eleitores
Lula cogita escrever
uma nova carta ao povo brasileiro. A exemplo da primeira, de junho de 2002,
esta também quer mostrar que o ex-presidente não é o bicho-papão comunista
pintado pelas tintas do radicalismo de direita. A primeira foi endereçada ao
mercado, a de agora seria destinada aos eleitores. Talvez Lula tenha razão, mas
se ficar apenas no conteúdo econômico, a carta será curta. É importante dizer
que o candidato do PT não é de extrema-esquerda, quando muito de
centro-esquerda, que não vai tomar sua casa nem confiscar sua poupança. Mas
isso já se sabe. O que se quer agora ouvir de Lula e do PT é um pouco mais.
Lula precisa dizer ao
eleitor que ele e o PT erraram, e mais de uma vez. Embora os equívocos na
condução da economia no governo Dilma tenham sido extremamente graves, o que o
povo brasileiro quer mesmo ouvir de Lula é que o partido errou ao usar o Estado
e o dinheiro público em benefício próprio e de partidos aliados, para
consolidar sua permanência no poder. Este é um fato inegável, uma nuvem que
sobrevoa o PT e que vai permanecer fazendo sombra enquanto o partido e seu
principal líder não afirmarem categoricamente que erraram e que se arrependem.
O fato de o Supremo ter anulado a condenação de Lula o exonera, mas não o inocenta. Talvez Lula não seja condenado outra vez pelos casos do tríplex do Guarujá e do sítio de Atibaia e jamais se prove que ele foi beneficiado diretamente pelos desvios da Petrobras. Mas isso não significa que a estatal não tenha sido efetivamente dilapidada pelos partidos da base do governo, que usavam as diretorias da empresa para arrecadar. As confirmações foram feitas por tesoureiros do PT, presidentes de partidos aliados, funcionários da empresa e empreiteiros. Além de doleiros que faziam as remessas desse butim para o exterior.
Um episódio mostra
bem como se lidava com os avanços sobre os cofres da empresa. Certo dia, lá
pela metade do segundo mandato de Lula, um jornalista foi à sede da Petrobras
almoçar com Paulo Roberto Costa, diretor da cota do PP e futuro pivô da
Lava-Jato. Ao sair do almoço, o jornalista encontrou Graça Foster, também
diretora da empresa e grande amiga de Dilma Rousseff, que o cumprimentou com a
seguinte saudação: “Tudo bem? Soube que você veio almoçar com aquele ladrão do
Paulo Roberto”. Paulinho, que era a forma carinhosa usada por Lula para se
referir ao diretor, ficou ainda alguns anos no cargo e só saiu porque
renunciou, em maio de 2012, dois anos depois da posse de Dilma. O governo sabia
que havia roubo, mas fingia não ver. Em 2014, Paulo Roberto foi preso e a casa
caiu.
As histórias de
Lula e do PT, contudo, são maiores do que escândalos como o da Petrobras ou do
mensalão. Não há partido mais bem estruturado e representativo da sociedade
brasileira do que o PT. Não existe político mais carismático e original no
cenário nacional do que Lula. O ex-presidente fez um dos governos mais
inclusivos da História republicana. Não é exagerada a afirmação de petistas de
que na sua gestão milhões de brasileiros foram resgatados da miséria pelas suas
políticas de distribuição de renda. Tampouco é errado reafirmar que Lula é um
democrata, que se pauta pelas leis e pela Constituição. As tentações
antidemocráticas de membros do partido, como o controle externo da imprensa,
nunca saíram do papel.
Esse é o Lula que
tem que se apresentar na segunda carta aos brasileiros. Precisa dizer “perdão,
errei, erramos”. E afirmar que estes erros, que representam a principal pedra
no seu caminho, não serão repetidos. Muitos já perdoaram Lula e o PT, porém
ainda há brasileiros honestos, trabalhadores e bem intencionados que rejeitam o
partido e seu líder exclusivamente por causa da corrupção. Se Lula quiser pôr
um fim nesta história, terá de finalmente admitir o que não pode mais ser
negado. Ao fazer esse reconhecimento e se desculpar, terá como enfrentar a
campanha do ano que vem de cabeça erguida.
Improbidade
Faltou introduzir o velho
conhecido “excludente de ilicitude” na lista de perdões por crimes cometidos
pelo servidor público na nova Lei da Improbidade administrativa, aprovada na
quarta-feira a toque de caixa pela Câmara. O que custava estabelecer que ele também seria perdoado se
uma decisão sua que aliviou algum cofre público fosse tomada sob forte emoção?
Tudo bem, já-já aparece uma emenda para corrigir este esquecimento. Pelo texto
aprovado, crime só ocorre se o ato ilícito for “deliberadamente voluntário”. Se
for apenas voluntário, está perdoado.
Saudades
Bons tempos em que jornais e
jornalistas gastavam a maior parte da sua jornada de trabalho apurando e
contando histórias úteis ao leitor, ao ouvinte ou ao telespectador. Época em
que as reportagens tinham mais valor. Hoje, com o advento do “Brasil acima de
tudo e Deus acima de todos”, a prioridade foi invertida e os repórteres passam
muito mais tempo tentando explicar o inexplicável (exemplo
na nota seguinte) e desmontando a avalanche de mentiras contadas no Palácio do
Planalto. Daí o sucesso de sites de checagem, que viraram a nova joia do
jornalismo nacional.
Estúpido
A declaração de Bolsonaro de
que é preferível se contaminar com o coronavírus do que tomar a vacina é o
ponto máximo que sua ignorância conseguiu alcançar nestes dois anos e meio de
governo. Desnecessário explicar a idiotice criminosa. É urgente que se pare
o festival
de besteiras que ele pronuncia diariamente nas redes
sociais. Esperar por Arthur Lira não adianta. Talvez seja o caso de apelar para
as redes. Por muito menos, Donald Trump foi suspenso do Facebook e banido pelo
Twitter.
Seu Exército
O presidente podia aproveitar,
já que o Exército brasileiro é “seu”, e mandar a soldadesca desocupada plantar
árvores em áreas desmatadas. Que sejam eucaliptos, porque crescem rápido. E
entregar tudo para o Ricardo Salles e seus amigos madeireiros. Podem também ser
deslocados dos quartéis, onde passam os dias fazendo ordem unida, tiro ao
alvo, tirando plantão e jogando bola, para enfrentar as queimadas destes dias
secos no Centro-Oeste. Os soldados podem, afinal, ser úteis.
Multas
Bolsonaro foi multado no
Maranhão e em S. Paulo por produzir e participar de aglomerações sem usar
máscara. Numa entrevista ao GLOBO, o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre
Kalil, disse que o multaria se fizesse a mesma porcaria na capital mineira. Mas
Bozo pode ficar tranquilo, ele sempre terá o Rio.
Raspas e restos
O ministro da Economia enfim
descobriu como satisfazer a fome de “pessoas fragilizadas, mendigos e
desamparados”. Paulo Guedes propôs, numa live para
um fórum de supermercados, recolher diariamente as sobras de restaurantes para
distribuição entre estes necessitados. Não disse como fazer isso. Talvez
criando uma empresa estatal, porque vai precisar de muito braço e viatura. Só
no município do Rio há 7.750 restaurantes e bares (eram 9 mil antes da
pandemia). Imagina o esforço para recolher as sobras de alimentos dessa turma
toda.
Prato feito
Na mesma live,
Guedes reclamou do tamanho do prato de comida do brasileiro de classe média.
Segundo ele, os pratos dos europeus são relativamente pequenos e os nossos têm
“sobras enormes”. Não sei onde ele viu isso, por onde eu ando não é assim. Os
pratos grandes, ministro, são dos pobres e têm apenas arroz, feijão, farinha e
macarrão. Muitos comem apenas um prato por dia. E olhe lá.
Narrativa
De vez em quando surgem como
por passe de mágica palavras ou termos que presunçosamente tentam explicar de
maneira mais elaborada um elemento já bastante conhecido. É o caso da palavra
“narrativa”, que significa contar, descrever, apresentar um caso. Agora, a
palavra está ganhando outro significado na CPI da Pandemia. Quer dizer mentira,
segundo os
inacreditáveis Marcos Rogério, Eduardo Girão e Jorginho Mello ou o
inusitado Luís Carlos Heinze. Chega a dar preguiça.
Birrento
Esta é da semana passada, mas
ainda vale por evidenciar o menino birrento que por vezes toma conta do
presidente do Brasil. Sempre que é contrariado e não pode reagir de maneira
drástica imediatamente, Bolsonaro faz beicinho. Vejam
a imagem dele com Queiroga um dia depois de o ministro afirmar na CPI que não
acredita em tratamento precoce para a Covid. Ele estava sentado, Queiroga se
aproximou, falou alguma coisa e Bolsonaro não respondeu, não olhou para ele,
fingiu que nem o via. No dia seguinte o chamou de “Um Certo Queiroga”.
Lula e Rodrigo
A capacidade aglutinadora de Lula não deixa dúvida. Melhor que ele, só Tancredo Neves, o maior conciliador da História política nacional que derrotou a ditadura. Enquanto os partidos de centro discutem um nome para ocupar a vaga do que chamam de terceira via, Lula vai construindo pontes. Vejam sua aproximação com Rodrigo Maia. Mesmo com Rodrigo estando em viés de baixa, é mais um passo do sapo barbudo.
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