Editoriais
STF tem de derrubar lei que facilita
devastação da Mata Atlântica
O Globo
Enquanto o mundo está de olho na devastação
da Amazônia, segue em curso também um golpe na Mata Atlântica, desferido pela
sanção presidencial à lei que modifica o Código Florestal e concede aos
municípios o poder de estabelecer as regras de uso e ocupação de margens de
rios e mananciais nas Áreas de Preservação Permanente (APPs). Se o meio
ambiente já sofre apesar das restrições impostas por leis federais, imagine-se
o que poderá acontecer se cada prefeito ou câmara de vereadores, nos 5.570
municípios, puderem modificar regras de ocupação de APPs nas cidades. Contra
isso, PT, PSB e Rede impetraram uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI)
no Supremo Tribunal Federal (STF), cujo relator é o ministro André Mendonça.
Em sua campanha pela derrubada de florestas, o presidente Jair Bolsonaro parece dar prioridade à Amazônia. Mas defendeu a instalação de resorts inspirados no polo mexicano de Cancún ao longo da Costa Verde, região de Angra dos Reis, onde chegou a ser multado, quando ainda era deputado, por pescar em área de preservação. Depois de ser eleito presidente, em 2018, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) suspendeu a multa de R$ 10 mil.
Esse exemplo mostra que o mesmo descaso que
Bolsonaro dispensa à Amazônia se estende à Mata Atlântica, que começou a ser
destruída pela colonização portuguesa. Hoje, restam apenas 12,4% da floresta
original, distribuídos por cerca de 15% do território nacional em 17 estados,
onde residem 72% da população e são gerados 70% do PIB. A pulverização explica
a enorme pressão para acabar com o que resta da floresta nativa.
De acordo com a Fundação SOS Mata
Atlântica, os 21.642 hectares derrubados da mata entre 2020 e 2021
representaram uma alta de dois terços na devastação do bioma em relação a
2019-2020. Se a comparação for feita com o biênio 2017-2018, período que
registrou a menor taxa de desmatamento da série histórica, o salto é de 90% — a
devastação quase dobrou. Os estados de Minas, Bahia, Paraná, Mato Grosso do Sul
e Santa Catarina responderam por 89% desse desmatamento. Como se vê, a Lei da
Mata Atlântica, aprovada para protegê-la, se tornou letra morta diante do
avanço de plantações, pastagens e construções irregulares.
Na cidade do Rio de Janeiro, a Mata
Atlântica ainda resiste, mas a exuberância da floresta foi em parte destruída
pela ocupação desordenada. O mesmo problema atinge áreas urbanas em todo o
país. Uma das consequências mais perniciosas são as tragédias causadas por
enxurradas em áreas ocupadas ilegalmente, como ocorreu dias atrás no Recife. A
tentação de usar as áreas de preservação em projetos demagógicos é grande. Por
isso é prudente não distribuir pelos municípios o poder de definir as regras de
ocupação de APPs nas margens de rios e mananciais. Mendonça e o STF deveriam
acatar o pedido dos partidos que entraram com a ADI no tribunal.
Cadastros obsoletos favorecem fraudes e
punem cidadãos
O Globo
A auditoria do Tribunal de Contas da União
(TCU) nos cadastros sociais atesta a falta de controle do governo sobre as
informações dos cidadãos. A análise constatou 101 milhões de erros na base de
dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), que podem acarretar
pagamentos indevidos de aposentadorias, pensões e auxílios. Ainda que esse
número resulte de uma projeção e que muitos dos erros apontados, como registros
repetidos, não sejam graves, a situação impressiona pelo descontrole.
Como mostrou reportagem do GLOBO, 24
milhões de dados estão incompletos, inválidos ou inconsistentes — mais de 2
milhões com CPF não reconhecido pela Receita Federal. Há falhas graves, como
14,6 milhões de registros cujo titular é dado como morto há mais de cinco anos.
Os auditores também tiveram dificuldade para obter os dados, que chegaram só
depois de oito meses (outra investigação fracassara porque eles nem vieram).
Os problemas em cadastros do governo são de
natureza complexa, pois dependem de mais que bons sistemas. De acordo com o
diretor executivo do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS), Fabro Steibel,
5% dos brasileiros não têm sequer registro civil. O Registro Geral (RG) — a
popular carteira de identidade —, atribuição estadual, é pulverizado por 27
unidades da Federação. Não é impossível alguém ter dois em estados diferentes.
“O Brasil aceita seis tipos de documentos, como passaporte, Carteira Nacional
de Habilitação, RG ou carteira da OAB. O cidadão pode ter até 40”, diz Steibel.
“Deveria haver um só, como noutros países. O importante mesmo é o RG, com foto
e dados biográficos do cidadão.”
Para manter os cadastros atualizados, é
preciso melhorar a infraestrutura de dados, ter um sistema que identifique
fraudes e reduzir o número de documentos oficiais. O ideal é uma identidade
digital única e comum a todos os departamentos do governo. Nenhum absurdo para
um país pioneiro em declarações de renda digitais ou na implementação de um
sistema como o Pix.
Uma das experiências mais bem-sucedidas
nesse setor é a identidade digital adotada na Índia em 2009, onde havia uma
miríade de documentos para mais de 1 bilhão de pessoas. A plataforma Aadhaar, o
maior sistema de identificação biométrica do mundo, reúne dados dos cidadãos,
que aderem voluntariamente. Cada participante recebe um número de 12 dígitos,
usado como identidade. Mais de 95% dos indianos estão cadastrados. Um estudo de
2019 mostrou que 49% dos cidadãos usaram a Aadhaar para ter acesso pela primeira
vez a benefícios do governo.
Sem buscar inspiração em experiências do
tipo, o Brasil pune seus cidadãos. A auditoria do TCU não estimou prejuízos,
mas eles são inequívocos. Recursos vão parar nas mãos de fraudadores ou de quem
não precisa, enquanto famílias carentes não recebem. Outra auditoria constatou
que o governo pagou indevidamente R$ 809 milhões a 1,8 milhão de cidadãos que
não tinham direito ao Auxílio Emergencial em 2020. Entre os contemplados,
32.282 detentos, 16.680 residentes no exterior e 15.571 mortos.
Permitir que fraudadores recebam benefícios
em vez de quem precisa é o cúmulo da desorganização, do descontrole e da
incompetência. Ainda que não haja solução rápida, não há razão para manter
bancos de dados desatualizados e com erros. Só quem ganha com o descalabro são
os vigaristas.
Ideias calamitosas
Folha de S. Paulo
Para conter preços, governo e Congresso
flertam com propostas mais perigosas
A confusão
de ideias no governo Jair Bolsonaro (PL) sobre como reagir à alta dos
preços dos combustíveis cresce na proporção da ansiedade com a aproximação das
eleições.
Pressionados pela estagnação nas pesquisas
de intenção de voto, o presidente e seus aliados do centrão superam os padrões
tradicionais de irresponsabilidade e despreparo intelectual. Sem medir
consequências, empilham propostas desconexas em série e ensaiam um
intervencionismo destrutivo para a economia.
Sem conseguir por ora um acordo para o
congelamento do ICMS sobre derivados de petróleo aprovado no ano passado,
objeto de disputa entre União e estados no Supremo Tribunal Federal, o
governismo também pressiona pela votação de um projeto que limita em 17% o
imposto estadual sobre combustíveis, energia elétrica, transportes e
telecomunicações.
Já aprovado pela Câmara dos Deputados, o
novo texto ainda tramita no Senado e sofre objeções de governadores e
prefeitos, que apontam perdas anuais de até R$ 83,5 bilhões e querem
compensações do Tesouro Nacional.
Deve-se reconhecer, nesse caso, que as
alíquotas do ICMS são muitas vezes excessivas —e que as administrações
regionais têm se beneficiado de enorme crescimento de arrecadação tributária.
Não se descarta um acordo que restrinja o
corte de ICMS aos combustíveis, reduzindo assim o impacto nas receitas, que a
União rejeita compensar. Mas, como tal negociação ainda pode levar algumas
semanas e o Planalto anseia por resultados rápidos, aumenta a pressão por
alternativas mais danosas.
Uma delas é a decretação de calamidade
pública, o que abriria espaço para despesas fora do teto constitucional, de
modo a permitir que o governo conceda subsídios para reduzir os preços da
gasolina e do diesel na bomba.
Além de frágil juridicamente, a medida é
temerária porque enfraqueceria ainda mais as regras fiscais e tenderia a
descambar para uma nova farra de gastos eleitoreiros —um golpe de morte no que
resta de credibilidade na gestão das contas públicas.
Outra péssima ideia é interferir
diretamente na política de preços da Petrobras, o que colocaria em risco a
saúde financeira da companhia e muito provavelmente levaria a judicialização
por parte de acionistas minoritários.
Recorde-se ainda que o Congresso ameaça
aprovar decreto legislativo para conter reajustes das tarifas de energia
elétrica nos estados, o que não só desorganizaria o setor como geraria
desconfiança sobre todas as concessões de serviços públicos à iniciativa
privada.
Providências tresloucadas contra um
problema conjuntural provocarão danos maiores e mais duradouros à frente. A
esta altura, resta torcer para que Bolsonaro perceba os riscos da insensatez.
Armas impopulares
Folha de S. Paulo
Sem respaldo da maioria, Bolsonaro facilita
acesso com decretos contrários à lei
De cada 10 brasileiros, 7 rejeitam a tese
segundo a qual maior acesso da população a armas favorece a segurança pública,
propagada com obstinação por Jair Bolsonaro (PL). Esse
amplo contingente partilha do entendimento majoritário entre
especialistas do setor.
Pode-se acrescentar que mais revólveres,
pistolas e outros artefatos em circulação significam mais perigo, seja porque
produtos legais podem cair com facilidade nas mãos de criminosos, seja porque
eleva-se a probabilidade de acidentes e violência em conflitos pessoais.
O Datafolha indica ainda que não há
respaldo da sociedade brasileira à noção, importada dos EUA, de que o acesso a
armas estaria associado à liberdade. "O povo armado jamais será
escravizado", diz Bolsonaro, e 69% discordam.
Propostas armamentistas são especialmente
impopulares entre as mulheres, os pretos e os que têm renda até dois salários
mínimos. A aceitação é maior, mas sempre minoritária, entre os homens, os
moradores da região Norte e as famílias de renda mais elevada.
Existem no Brasil 2,08 milhões de armas
legais particulares, praticamente 1 para cada 100 habitantes, segundo dados de
dezembro de 2020 compilados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Para além do número absoluto, chega a ser
alarmante o aumento do registro de artefatos nos últimos anos. No Distrito
Federal, por exemplo, houve um crescimento de 562% ao longo de três anos.
Num país onde vigora o Estatuto do
Desarmamento, esses números somente são possíveis em razão de uma série de
decretos por meio dos quais Bolsonaro tem, desde o início do seu mandato,
afrouxado os procedimentos de controle sobre o registro, a circulação e a
aquisição de tais mercadorias.
Entre as regras adotadas dessa maneira
estão o aumento para dois do número de armamentos que categorias profissionais
específicas —como magistrados, membros do Ministério Público e agentes
prisionais— podem adquirir. Aumentou também o limite de munições a que chamados
CACs (colecionadores, atiradores esportivos e caçadores) podem ter acesso.
Claramente contrárias ao espírito da lei, tais medidas estão hoje sob análise do Supremo Tribunal Federal, que tem tardado em deliberar sobre sua validade.
Democratas não temem o debate
O Estado de S. Paulo
A eventual ausência de Lula e Bolsonaro nos debates eleitorais empobrecerá as discussões sobre o futuro doPaís; sem confronto de ideias, não há democracia
É dever do presidente que concorre à
reeleição, ao menos do ponto de vista político, prestar contas aos eleitores de
seus atos e omissões durante o mandato que termina. Uma eleição presidencial
que tem o incumbente entre os candidatos é uma eleição plebiscitária por
natureza. Ao fim e ao cabo, os eleitores decidirão se aprovam o governante de
turno, concedendo-lhe mais um mandato, ou se o reprovam, substituindo-o por
outra pessoa no cargo.
Os debates na TV durante a campanha talvez
sejam os momentos mais preciosos para que essas explicações sejam dadas à
sociedade. Questionado por jornalistas, adversários e eleitores, o incumbente
tem nos debates excelentes oportunidades para defender pessoalmente sua
administração. Quem melhor do que ele haveria de fazê-lo?
Ao comparecer aos debates, o presidente que
tenta a reeleição também demonstra, de antemão, ter coragem e espírito público,
independentemente do que venha a dizer e de como os outros reagirão. Os
democratas não temem a divergência. E aqui cabe louvar a postura da
ex-presidente Dilma Rousseff (PT), que durante a campanha de 2014, quando
concorria à reeleição, compareceu a todos os debates, sem medo de ser
confrontada com os graves erros que cometeu em seu primeiro mandato.
O presidente Jair Bolsonaro, que também
tenta a reeleição, não é um democrata nem tampouco demonstra ser alguém capaz
de defender o seu “legado”, chamemos assim. Por isso, não surpreende sua
decisão de, assim como em 2018, evitar o confronto de ideias com seus
adversários. Em entrevista ao Programa
do Ratinho, Bolsonaro afirmou que não está disposto a participar de
debates antes do segundo turno porque, caso vá aos encontros, “os dez
candidatos ali vão querer o tempo todo dar pancada” e ele “não teria tempo de
responder”.
O que o presidente mais teme é ver ruir o
mundo de fantasia que criou para justificar o absoluto fracasso de seu governo
diante dos fatos que, seguramente, serão explorados por seus adversários.
A bem da verdade, esse temor não é
exclusivo de Bolsonaro. Seu principal adversário no momento, Lula da Silva
(PT), também já indicou que não pretende ir aos debates antes do primeiro turno
caso Bolsonaro também não compareça. A razão é óbvia: sem Bolsonaro na tribuna,
boa parte dos questionamentos dos candidatos recairia sobre o atual líder das
pesquisas de intenção de voto. E Lula, assim como Bolsonaro, recorre a mentiras
e mistificações para escamotear os danos que causou ao País.
Os debates seriam uma ótima oportunidade
para submeter ao escrutínio público os discursos lulopetistas e bolsonaristas
sobre as alegadas qualidades de seus governos. Como se sabe, o governo
Bolsonaro, segundo os bolsonaristas, seria o melhor da história do Brasil não
fossem a pandemia, os governadores, os prefeitos, a esquerda, o “sistema”, o
Supremo, a guerra na Ucrânia, a ganância da Petrobras ou qualquer outro inimigo
imaginário. Por sua vez, Lula quer que os brasileiros acreditem que o Brasil
governado pelo PT seria o país das maravilhas não fossem o “golpe” contra Dilma
Rousseff, a “insensibilidade das elites”, a “ganância dos banqueiros”, a
“imprensa golpista”, entre outros adversários do “povo” que os petistas julgam
representar.
Tanto petistas quanto bolsonaristas
consideram que os eleitores reconheceriam as inegáveis qualidades de seus
governos não fosse o mau jeito na hora de se comunicar. “O maior erro do
governo, no meu ponto de vista, foi a comunicação”, disse recentemente o
senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente, ao SBT. No mesmo espírito, o
petista Fernando Haddad disse ao jornal O Globo que,
malgrado a surra que levou na eleição de 2016 à Prefeitura de São Paulo,
poderia ser considerado um “prefeito visionário”, não fossem as “falhas de
comunicação”.
Se isso fosse verdade, bastaria comparecer
aos debates e comunicar corretamente as maravilhas bolsonaristas e petistas. O
problema é o risco, óbvio, de que, uma vez submetidos ao contraditório, ao
vivo, esses discursos se desmanchem no ar. Mas assim é a democracia.
Ensino melhor, por um país melhor
O Estado de S. Paulo
Com o estímulo à formação de professores da rede pública, Fiesp quer preparar alunos mais aptos para omercado de trabalho e, assim, melhorar a produtividade
A adesão, em menos de dez dias, de cerca de
metade dos 645 municípios paulistas ao programa emergencial de formação de
professores da rede pública lançado pela Federação das Indústrias do Estado de
São Paulo (Fiesp) comprova pelo menos duas coisas. A primeira é a percepção,
pelos gestores municipais, da urgente necessidade de melhorar a atuação dos
docentes. A segunda é o acerto da iniciativa da Fiesp, destinada a criar
condições, desde o ensino fundamental, para a melhoria da qualidade da mão de
obra com o objetivo de assegurar maior produtividade da economia brasileira.
Só com a maior eficiência do sistema
produtivo, que começa a ser conquistada por meio da educação de melhor
qualidade do trabalhador, o Brasil poderá paulatinamente recuperar espaço que
perdeu nos últimos anos no cenário mundial por não conseguir competir com seus
principais concorrentes.
Há anos entidades do setor industrial vêm
dizendo que a produtividade do trabalho é essencial para a recuperação da
competitividade que se perde há anos. Trabalhadores com escolaridade elevada e
com formação contínua não apenas apresentam desempenho melhor do que outros com
formação deficiente. Estão também mais aptos a propor soluções para problemas
do dia a dia, entender e aplicar processos mais complexos e até desenvolver e
implementar inovações.
A melhoria da formação pedagógica de
professores dos ensinos fundamental, médio e profissional é objetivo também de
diferentes atividades do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas
Empresas (Sebrae). Como no caso da Fiesp, as iniciativas do Sebrae têm como
meta a preparação dos jovens para os desafios da vida social e profissional.
Foi com a adequada preparação educacional
dos jovens que, não faz muito tempo, países de rápido crescimento, sobretudo
asiáticos, alcançaram as posições de destaque que hoje ocupam na economia
mundial. O Brasil não conseguiu acompanhá-los. Parte dos dirigentes do segmento
industrial, porém, atribuía o atraso do Brasil a problemas estruturais, como
infraestrutura precária, sistema tributário complexo e governo
intervencionista, entre outros. São problemas reais e persistentes, que afetam
o desempenho de todo o setor produtivo e, por isso, precisam ser enfrentados.
Mas há outros caminhos para melhorar o
ambiente econômico, e que não estavam sendo buscados. A Fiesp resolveu trilhar
um deles, o de melhorar a preparação do brasileiro desde o início de sua vida
escolar, para que, quando inserido no mercado de trabalho, possa ter desempenho
superior ao das gerações anteriores e, assim, elevar a produtividade. As
rápidas transformações por que passam os processos industriais no mundo tornam
mais urgente a preparação adequada da mão de obra.
Apoios como o oferecido aos professores
pela Fiesp são importantes e necessários. Pesquisa recente do Sebrae constatou,
por exemplo, que mais de um terço dos docentes do ensino médio tem pouco
conhecimento da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento que define o
conjunto de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver na
educação básica. O empreendedorismo é parte dessas aprendizagens. E, por isso,
o Sebrae oferece aos professores diferentes cursos sobre o tema.
“Não há indústria forte sem educação
forte”, disse ao Estadão o
coordenador do programa da Fiesp e diretor do Serviço Social da Indústria
(Sesi) em São Paulo, Wilson Risolia, resumindo o fundamento e o objetivo da
iniciativa.
Soluções educacionais testadas pelo Sesi
estão sendo utilizadas para treinar professores da rede pública, divididos em
duas frentes, uma voltada para os cinco primeiros anos do ensino fundamental e
outra destinada às quatro últimas séries. São atividades de reforço focadas no
aumento da proficiência dos alunos em língua portuguesa e matemática.
A despeito do abandono, pelo atual governo
federal, das principais iniciativas destinadas a melhorar o ensino, há pessoas
e instituições preocupadas com o tema. Suas iniciativas provam que há soluções
para o País.
Superávit não autoriza loucuras
O Estado de S. Paulo
Contas públicas estão mais fortes, em parte graças à inflação, mas a dívida é grande e é essencial evitar imprudências
Com R$ 80,07
bilhões de superávit primário acumulado no ano, até abril, o governo central
pode exibir, por enquanto, um balanço favorável de suas contas. Esse
bom resultado é atribuível a dois fatores: à expansão dos negócios no primeiro
trimestre e à inflação muito acelerada. O forte aumento de preços inchou os
valores sujeitos a tributação e contribuiu para o farto abastecimento do
Tesouro. Como tem ocorrido normalmente, uma respeitável parcela do ganho com
impostos, contribuições e taxas diversas desapareceu no enorme buraco da
Previdência Social. Desta vez, a sobra geral da arrecadação, de R$ 182,89
bilhões, foi em grande parte anulada pelo déficit previdenciário, de R$ 79,78
bilhões.
Acrescentados os R$ 62 bilhões de saldo
primário dos governos estaduais e municipais e os saldos das estatais,
excluídas Petrobrás e Eletrobrás, chega-se ao resultado primário do setor
público, um superávit de R$ 148,49 bilhões em quatro meses. O saldo primário é
calculado sem o custo dos juros da dívida pública.
Políticos têm apontado a situação fiscal
dos Estados, confortável neste momento, como argumento a favor da redução do
Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis e
energia elétrica. O objetivo, estritamente demagógico, é reduzir os preços
desses itens e conter parcialmente os efeitos da inflação. Mas é um absurdo
tratar o ICMS – ou qualquer tributo indireto – como se fosse causa de inflação.
Além disso, a redução, tal como indicada na última proposta, causará enorme
perda fiscal, estimada em torno de R$ 90 bilhões, com graves prejuízos para
Estados e municípios.
A boa situação fiscal deste momento de
nenhum modo pode justificar mexidas irresponsáveis nas finanças da União, dos
Estados ou dos municípios. Somados os juros, o resultado fiscal nesse período
foi um déficit de R$ 5,98 bilhões, notavelmente pequeno, mas ninguém deve
apostar na permanência de um quadro tão favorável quanto extraordinário. Os
juros nominais contabilizados no primeiro quadrimestre, de R$ 154,47 bilhões,
foram 36,16% maiores que os de um ano antes e esse item deverá continuar
pesando muito no conjunto.
Não é hora de agir como se houvesse
dinheiro à vontade, mas de agir com muito cuidado, evitar tentações demagógicas
e eleitoreiras, combater a inflação e batalhar por melhores condições fiscais
até o fim do ano. A dívida bruta do governo geral, de R$ 7,07 trilhões em
abril, correspondeu a 78,3% do Produto Interno Bruto (PIB). Essa porcentagem
foi 0,2 ponto menor que a do mês anterior, mas foi muito maior que as
proporções observadas em países emergentes e de renda média, raramente
superiores a 60%.
A herança prevista para o próximo governo
já inclui inflação elevada, juros altos, desemprego acima dos padrões
internacionais e dívida pública muito grande para um país emergente. As
autoridades federais darão apreciável contribuição se se abstiverem, até o fim
de 2022, de cometer grandes imprudências e de promover mudanças importantes,
como alterações do sistema tributário.
Estado de calamidade teria efeitos nefastos
para o país
Valor Econômico
A decretação da medida seria um sinal verde
para a deterioração da confiança na solidez fiscal
Não foi por acaso que na semana passada
voltou a circular no governo a proposta para que seja reconhecido novo estado
de calamidade no Brasil. Na capital federal, são raras as coincidências.
Principalmente a quatro meses das eleições.
Em busca da reeleição, o presidente Jair
Bolsonaro (PL) tem o considerável desafio de elevar sua popularidade. A mais
recente pesquisa Datafolha mostrou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
(PT) como líder isolado na disputa pelo Palácio do Planalto com 48% das
intenções totais de voto, ante 27% de Bolsonaro. A rejeição ao chefe do Poder
Executivo alcançou 54%. Em comparação, 33% dos pesquisados afirmaram não votar
em Lula de jeito nenhum.
Mas o levantamento trouxe outros alertas
relevantes para Bolsonaro e seus aliados. Cerca de três em cada dez eleitores
podem mudar o voto caso a inflação suba até o pleito, apontou a pesquisa. E 12%
dos entrevistados disseram que, se a inflação aumentar, é grande a chance de
mudar de candidato. Outros 11% falam que as chances são médias e 8% afirmam que
são pequenas. Por outro lado, 68% afirmam que “não existe nenhuma chance” de
troca. A pesquisa também mostrou que, para 53% dos brasileiros, a situação
econômica tem “muita influência" na hora de decidir em quem votar.
Como de praxe, auxiliares de Bolsonaro
tentaram desqualificar o resultado da pesquisa. Porém, o que se viu nos dias
seguintes foi uma compreensível inquietação entre aliados do presidente no
Congresso Nacional: eles voltaram a cobrar da equipe econômica uma solução que
possa conter a aceleração dos preços dos combustíveis no curto prazo, chegando
a sugerir a criação de um subsídio temporário.
A ideia, contudo, esbarraria no teto de
gastos. E, justamente por isso, enfrenta resistências da equipe econômica. Mas,
ainda assim, ela ganhou tração e encontrou entusiastas na ala política do
Executivo.
É indiscutível que a guerra na Ucrânia tem
dado nova dinâmica às cotações internacionais do petróleo e seus derivados.
Isso tem gerado uma considerável alta dos preços cobrados do consumidor e, num
país com relevante peso do modal rodoviário na matriz de transportes, como é o
Brasil, um efeito disseminado na inflação de outros produtos e serviços.
Porém, de forma correta, os técnicos da
equipe econômica até agora não veem uma situação claramente imprevista e
urgente - requisito estabelecido pela Constituição para a edição de créditos
extraordinários e gastos fora do teto. A conjuntura é muito distinta quando
comparada com o momento em que o estado de calamidade foi adotado, em março de
2020.
Vivia-se um momento crítico da pandemia de
covid-19. Não restava opção ao governo além de abrir os cofres e assegurar que
todo dinheiro necessário para manter vidas e empregos fosse utilizado, algo que
também foi feito por outros países.
Isso foi devidamente compreendido pelo
mercado porque o estado de calamidade teve começo, meio e fim. Ele teve
vigência até 31 de dezembro do mesmo ano, período em que o governo aumentou os
gastos com programas sociais e despesas na área da saúde. Também cresceram os
repasses para Estados e municípios. Resultado: a meta de déficit para 2020 era
de R$ 124,1 bilhões, mas o resultado negativo foi seis vezes maior.
No despacho em que solicitou ao Congresso o
reconhecimento do estado de calamidade pública no país, Bolsonaro argumentou
justamente que os efeitos ocasionados pela pandemia ultrapassavam a questão da
saúde pública e causariam forte desaceleração da atividade econômica. “Essas
medidas envolvem, por exemplo, reduzir interações sociais, manter trabalhadores
em casa e fechar temporariamente estabelecimentos comerciais e industriais. Se,
por um lado, são medidas necessárias para proteger a saúde e a vida das
pessoas, por outro lado, as mesmas medidas devem causar grandes perdas de
receita e renda para empresas e trabalhadores”, diz o documento.
Um cenário que não se repete agora. Pelo
contrário: essa receita pode ser reciclada com fins eleitoreiros.
A decretação de novo estado de calamidade seria um sinal verde para gastos, o que deterioraria a confiança na solidez fiscal e certamente teria efeitos nefastos para a economia do país. Os órgãos de controle precisam estar vigilantes.
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