A Controladoria-Geral da União identificou superfaturamento de R$ 11 milhões em contrato do Ministério do Turismo com a ID2 Tecnologia – empresa que passou a faturar com o governo federal logo depois de contratar consultoria ligada a Marcos Valério.
Mais uma de Marcos Valério
Empresa que fez negócios com lobista tem contrato superfaturado com Turismo, diz CGU
Thiago Herdy
Um contrato de R$ 14,9 milhões do Ministério do Turismo com a ID2 Tecnologia e Consultoria foi superfaturado em R$ 11 milhões, de acordo com análise da Controladoria-Geral da União (CGU) concluída em dezembro do ano passado. Seria mais um caso de má gestão de recursos públicos constatado pelo órgão de controle federal, não fosse por um detalhe: a ID2 é uma empresa de informática de Brasília que passou a abocanhar contratos com o governo logo depois de contratar os serviços da T&M Consultoria Ltda, empresa onde despacha o lobista que é pivô do maior escândalo do governo Lula e do PT: Marcos Valério Fernandes de Souza.
Conforme mostrou O GLOBO em novembro do ano passado, Valério continua atuante na empresa de seu antigo sócio Rogério Lanza Tolentino, a ponto de citá-la como seu endereço comercial nas ações a que responde na Justiça. Em 2007, a ID2 pagou R$ 200 mil pelos serviços da empresa de consultoria mineira.
Pouco mais de um ano depois, foi habilitada e venceu licitação do Ministério do Turismo, durante a gestão do ministro Luiz Barreto Filho, para fornecer software e estrutura de apoio à administração, contrato que foi fiscalizado agora pela CGU e está recheado de irregularidades, no entender dos técnicos federais.
A licitação ocorreu pelo Sistema de Registro de Preços, que permite a outros órgãos públicos contratarem a ID2 para realizar os serviços previstos no contrato sem a necessidade de uma nova licitação. Pelo menos oito órgãos solicitaram adesão à ata de registro e, caso confirmassem a contratação integral dos serviços, o prejuízo potencial seria de R$ 88,6 milhões, segundo a CGU.
Até a última semana, sete contratos da ID2 somavam R$ 67,2 milhões, mas apenas o do Turismo foi analisado pelo órgão de controle.
Contratos idênticos, de R$ 14,99 milhões, foram assinados com o Ministério dos Esportes e a Valec. Contratos em valores menores foram assinados com o governo do Distrito Federal (R$ 13,7 milhões), Ministério da Saúde (R$ 5,7 milhões) e o Ministério de Minas e Energia (R$ 1,6 milhão). Alguns itens foram comprados também pelo Ministério Público do Trabalho (R$ 641 mil) e Tribunal de Justiça do DF (R$ 595 mil).
CGU acusa vícios na licitação
Uma pesquisa de preços de mercado serviu de base para os auditores constatarem o prejuízo de R$ 11 milhões no contrato do Turismo.
Segundo a análise, de R$ 6,4 milhões gastos com 112 licenciamentos de softwares da IBM, R$ 5,1 milhões teriam sido superfaturados.
Mesma pesquisa foi feita em relação aos custos de mão de obra com analistas de sistemas contratados para o projeto. Neste caso, a empresa cobrou do Ministério do Turismo R$ 6,95 milhões por um serviço que, na avaliação dos auditores, deveria ter custado R$ 1,96 milhão, gerando um sobrepreço de R$ 4,98 milhões.
O relatório aponta ainda um superfaturamento de R$ 944,7 mil na compra de equipamentos diversos, como servidores, monitores e consoles de operação. Além de cobrar mais caros por produtos, a ID2 pagou por itens não previstos no edital e que já deveriam estar embutidos nos valores cobrados, no entendimento da CGU, como custo de instalação de equipamentos (R$ 100 mil), impostos (R$ 304,7 mil), margem de lucro (R$ 352,8 mil) e custo de administração (R$ 109 mil).
"Não há amparo legal no edital para a cobrança dos mesmos. (No edital) consta que os preços unitários já deveriam conter impostos e quaisquer outras despesas que incidiriam no objeto de contratação", escreveram os técnicos.
O contrato da ID2 com o Ministério do Turismo foi concluído em novembro de 2010. No entanto, ao verificar in loco o uso dos equipamentos e do sistema contratado, no ano seguinte, os auditores constataram que havia servidores e nobreaks ainda encaixotados.
Vendido como "solução integrada" e para uso conjunto de todo o ministério, o sistema era acessado por apenas três usuários, de acordo com o relatório.
"Apesar de o gestor enfatizar a necessidade de dotar o Ministério das soluções, não foi identificado detalhamento suficiente da demanda do órgão que justificasse a necessidade da contratação. O gestor apresenta necessidades genéricas, que, de certa forma, aplicam-se a qualquer sistema a ser adquirido pela administração pública", escreveram os técnicos da CGU.
O relatório ainda acusa vícios na licitação que teriam resultado na restrição à sua competitividade, como a ausência de parcelamento do objeto a ser contratado — já que as soluções funcionavam de forma independente — e edital com critérios de habilitação "impróprios e imprecisos".
As notas fiscais apresentadas pela ID2 para justificar os serviços prestados foram aceitas sem que houvesse o detalhamento dos serviços e valores individuais dos itens, o que também foi alvo de crítica dos auditores.
A assessoria de Marcos Valério e Rogério Tolentino confirmou ao GLOBO, na quinta-feira, a prestação de serviços da T&M para a ID2 pouco antes de ela despontar como fornecedora de produtos de tecnologia para o governo federal. Mas não quis detalhar os serviços, porque Valério e Tolentino entendem que são informações que "dizem respeito apenas à empresa contratante". Valério nega trabalhar na prospecção de novos negócios no escritório da T&M e alega que despacha de lá em função do trabalho em cima dos processos em que é réu ao lado de Tolentino.
Um dos proprietários da ID2, Afrânio Baganha, negou ter contratado a consultoria da T&M e afirmou não haver relação entre o serviço que o sócio de Valério diz ter prestado e a inserção de sua empresa no rol de fornecedores do governo federal.
— O fato de eventual emissão de nota fiscal e eventual contabilização da mesma pela empresa do Sr. Tolentino não implica na alegada prestação de serviços — afirmou o empresário.
Baganha disse não conhecer Valério ou Tolentino pessoalmente, mas preferiu não responder por seus funcionários, que são "em torno de 200", segundo ele.
— Não temos notícias de que isso tenha ocorrido — disse.
FONTE: O GLOBO
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