Desde 2003, quando Lula chegou pela primeira vez à Presidência da República, o poder tornou-se uma obsessão para os petistas, que para garanti-lo não hesitaram em aliar-se ao que há de pior na política brasileira - que até então combatiam ferozmente. Passaram a apelar para qualquer recurso capaz de produzir votos, tudo envolto numa retórica populista composta pela soma de algumas meias-verdades com muita ficção, para criar uma realidade imaginária cultuada como obra suprema daqueles que detêm o monopólio da virtude e só pensam no bem do povo.
Dois exemplos recentes:
Lula, em seu palanque eletrônico na internet, sob os auspícios do instituto que leva seu nome: "A lição que ficou (da eleição presidencial) foi a seguinte: o povo quer mais democracia, mais participação, mais esperança, mais ética. O povo quer ser mais ouvido e continuar sonhando".
Dilma, em entrevista ao jornal chileno El Mercurio, respondendo a uma pergunta sobre os efeitos do escândalo da Petrobrás em seu segundo mandato: "O Brasil não vive uma crise de corrupção, como afirmam alguns. Nos últimos anos começamos a pôr fim a um largo período de impunidade. É um grande avanço para a democracia brasileira".
Nos anos 70, Lula subiu num palanque na Vila Euclides, em São Bernardo do Campo, e nunca mais desceu. Aprendeu a dizer o que "o povo" gosta de ouvir e se tornou um craque no assunto, um campeão do populismo. Ninguém jamais ouviu ou ouvirá dele apelos a coisas que não sejam necessariamente agradáveis de serem ouvidas. Isso fica a cargo de quem não precisa de votos. Para Lula, o povo, essa entidade mítica da qual, avalizado por suas origens humildes, ele se proclama defensor exclusivo e perpétuo, precisa "continuar sonhando".
E nas entrelinhas de obviedades (quem é que não acha lindo ouvir falar de "mais democracia, mais participação, mais esperança, mais ética"?) Lula vai dando seu recado: "Se a Dilma fizer uma relação com a sociedade tal como foi o segundo turno das eleições (quando, segundo ele, "o povo saiu às ruas" para garantir a vitória petista), terá toda possibilidade de fazer um governo exitoso e fazer com que o povo sinta que valeu a pena fazer a campanha e eleger a Dilma". Quanto a como fazer "uma relação com a sociedade", Dilma não precisa se preocupar. O grande eleitor de postes ensina.
A presidente da República, por sua vez, parece cada vez mais preocupada com a repercussão das denúncias de corrupção que lhe mordem os calcanhares. De fato, o escândalo da vez, o da Petrobrás, assume proporções assustadoras.
Não é justo afirmar, como tem sido reiterado neste espaço, que o PT inventou a corrupção. Movidos por sua obstinada determinação de permanecer no poder indefinidamente, alguns petistas apenas cederam à constatação pragmática de que para conquistar votos é preciso dinheiro, muito dinheiro, e meteram a mão na massa, compartilhando o butim com seus prestimosos "aliados". O mensalão foi apenas o começo da lambança. O escândalo em curso é a confirmação de que, no que depender deles, a corrupção veio para ficar. A não ser que Dilma decida, como já prometeu, passar das palavras à ação, o que implicaria a improbabilidade de combinar com o núcleo duro do PT que está na hora de acabar com a festa.
Mesmo quando fica nas palavras, porém, Dilma dá uma no cravo e outra na ferradura. Na entrevista ao El Mercurio declarou-se "indignada" com as denúncias de corrupção na Petrobrás. Mas fez questão de minimizar a responsabilidade do PT no episódio. "Essas investigações têm levado ao desmantelamento de um esquema que é suspeito de ter décadas de existência, antes dos governos do PT". Sobre as "décadas de existência" da corrupção, não há duvidas. Mas nunca houve nada igual, tão generalizado e profundo, como agora. Não obstante, a presidente garantiu: "No Brasil não há intocáveis. Qualquer um que não trate o dinheiro público com seriedade e honestidade deve pagar por isso. É um compromisso do meu governo".
Esquece-se a presidente Dilma - ou disso ela nunca soube - que acabar com a corrupção não é um compromisso de seu governo ou do PT. É obrigação elementar de qualquer governante, um dever de Estado.
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