- O Globo
A economia precisa de fato de “medidas drásticas”, as que foram postergadas porque era ano eleitoral, as que durante as entrevistas e debates a presidente Dilma disse que não eram necessárias. São urgentes para corrigir os erros cometidos durante o primeiro mandato e sobre os quais inúmeros analistas alertaram que trariam consequências graves para a economia.
O mundo tem problemas, com um crescimento desigual e áreas de crise, mas nada explica o que houve no Brasil, só mesmo a persistência nos erros da política econômica que, espera-se, esteja agora no seu ocaso.
Difícil saber o que entende por “medidas drásticas” quem até recentemente dizia que o Brasil não precisava delas. O governo ampliou despesas e a arrecadação caiu. Em novembro a queda foi de 13%, mas a Receita explicou que o pagamento antecipado de dívidas tributárias, o Refis, foi muito mais alto em novembro de 2013. Ao longo do ano, no entanto, o país teve queda de arrecadação, mas os gastos cresceram. Em vários meses houve inclusive déficit primário e a meta fiscal só foi fechada a marteladas dadas com a ajuda do Congresso. O fato é que o Brasil é um país cujo governo não consegue pagar as contas de cada mês — mesmo não contando o que tem que pagar aos seus credores — apesar de aumentar a carga de impostos anualmente.
É preciso medidas diferentes das adotadas no passado recente para que o país volte a crescer, porque o governo aumentou as isenções fiscais para setores escolhidos e mesmo assim não conseguiu incentivar o crescimento. O país abriu mão, de janeiro a novembro, segundo a Receita, de quase R$ 93 bilhões para estimular setores. A economia não cresceu e tampouco há sinais de que a renúncia tenha reduzido a carga tributária geral da economia. Em 2013, a isenção fiscal foi de R$ 70 bilhões no mesmo período de 11 meses, e a carga tributária ainda assim subiu.
É preciso medidas drásticas para restabelecer a confiança nos dados fiscais do governo, porque houve tanta alquimia que os analistas têm dificuldade de separar dos indicadores a parte contaminada com as manobras que transformaram dívida em receita, em que empresas estatais tiveram que antecipar dividendos de lucros que não tiveram.
A mesma palavra serve para definir as decisões necessárias para que se possa evitar o rebaixamento da economia brasileira. Esse risco não é imediato, mas os sinais já foram dados. Ela seria rebaixada porque a dívida pública aumentou, o déficit nominal cresceu, o superávit primário desapareceu e o déficit em transações correntes está em 4% do PIB. E é preciso trabalhar duramente para levar a inflação de volta à meta de 4,5%. Com tudo isso, só mesmo tomando medidas drásticas, como a presidente Dilma disse ontem aos jornalistas com quem tomou um café da manhã.
Ela não disse o que são as medidas, mas nada é fácil quando os problemas aparecem juntos e são negados por muito tempo. O remédio para a estagnação seria estimular a economia, o que não pode ser feito pela precária situação das contas públicas e pela inflação já alta. Combater a subida do IPCA com os remédios clássicos pode derrubar mais a atividade. Por isso os candidatos de oposição alertaram durante toda a campanha que a situação econômica era complicada e exigiria uma série de medidas amargas. A presidente acusou os adversários de quererem beneficiar os bancos, empobrecer os pobres, e acabar com conquistas sociais. Aos jornalistas ela garantiu que o único problema brasileiro era a crise mundial.
No dia 25 de setembro, Dilma respondeu ao economista Alexandre Rands, da campanha de Marina Silva. Ele havia dito que o governo precisaria fazer um “ajuste fiscal grande e profundo”. Dilma respondeu: “não precisamos de um choque fiscal”. E disse que quem sugeria cortes de gastos estava na verdade propondo que o dinheiro fosse para “pagar os bancos”. Aproveitou para alfinetar Marina: “o grande problema da candidata é que ela diz uma coisa num dia e no outro, diz outra”. É o caso de se perguntar, agora, a quem se aplica a frase dita pela então candidata Dilma.
Não faz bem à democracia esse exercício de negar o que sabe que terá que fazer. Isso ilude, confunde os eleitores e os joga num falso debate.
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