• Presidente planejava ocupar espaços com aliados mais fiéis ao governo
Um dia após o PMDB aprovar desembarque do governo, seus seis ministros resistem a entregar os cargos, o que pode dificultar a estratégia do Planalto de redistribuir esses postos para atrair votos contra o impeachment. Kátia Abreu desafiou: não sai do ministério nem do partido.
Júnia Gama, Cristiane Jungblut, Simone Iglesias, Catarina Alencastro, Eduardo Barretto e Letícia Fernandes - O Globo
- BRASÍLIA- Um dia após o PMDB ter decidido desembarcar do governo por aclamação, a resistência dos ministros do partido em deixar seus cargos provocou embaraços que podem atrapalhar a reforma ministerial que o Palácio do Planalto desejava concluir até o fim da semana para recompor a base aliada e evitar a aprovação do processo de impeachment.
O dia de ontem girou em torno da polêmica sobre a permanência dos seis ministros peemedebistas, depois de o partido ter aprovado moção que desautoriza filiados a exercerem cargos no governo. A ministra da Agricultura, Kátia Abreu — considerada uma das mais governistas no PMDB — polemizou ao dizer que não sairá do ministério, nem do partido. A ministra chegou a propagar a versão de que havia um acordo entre os seis ministros para que tirassem uma licença do partido e, assim, pudessem permanecer no governo. A ideia foi refutada pela cúpula do PMDB, que alega não haver previsão de licença para este caso.
Temer desautoriza licenças
O vice-presidente Michel Temer desautorizou qualquer licença dos ministros que não queiram deixar os cargos e, por meio de interlocutores, avisou que eles poderão sofrer processo no Conselho de Ética da sigla. A reação, no entanto, não deve ocorrer neste momento. Há uma avaliação de que Kátia Abreu quis tensionar a relação com o partido porque pretende deixá-lo e, ao mesmo tempo, servir ao Palácio do Planalto ao criar uma situação de desunião no PMDB.
O senador Romero Jucá (PMDB-RR), vice- presidente do partido e responsável por comandar a reunião relâmpago que aprovou o desembarque do governo, disse que nenhum ministro pediu licença e que cada caso será analisado em seu devido tempo.
— Não chegou nenhuma comunicação para o partido. Se a Kátia Abreu quiser se licenciar do PMDB, ela terá que entrar com um pedido, que será analisado de acordo com a burocracia interna. Mas achamos que, antes de se explicar para o partido, ela tem que se explicar para os eleitores. Lotear cargo e dar verbas não resolvem o problema do Brasil — disse o senador.
A relutância dos ministros do PMDB de abandonarem o governo é um fator inesperado, que tem criado uma saia justa para a presidente Dilma Rousseff, que prepara uma reforma ministerial para, justamente, preencher os espaços que vagariam com o desembarque do ex- aliado. Um auxiliar da presidente relatou que ela ficou constrangida com as manifestações que recebeu dos ministros peemedebistas que desejam permanecer na Esplanada.
— São os ministros OLX, têm que desapegar, mas não desapegam — disse o assessor.
Jantar com Renan
Um outro auxiliar da presidente desdenhava da divisão do PMDB, que, segundo ele, mascarou a ausência de unanimidade do partido para sair do governo. Governistas apontavam que faltaram grandes líderes do partido à reunião que definiu o desembarque.
O posicionamento de Kátia Abreu foi conversado em jantar na noite de terça- feira com a presença do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) — também contrário a afastamento imediato do governo — e dos ministros Hélder Barbalho ( Portos) e Eduardo Braga (Minas e Energia). Kátia propôs que os ministros fechassem uma posição conjunta de permanecer no governo e pedir licença do partido, tese que não teve consenso. Tanto Hélder Barbalho quanto Eduardo Braga já sinalizaram a dirigentes do PMDB que não pretendem contrariar a decisão do partido de sair do governo. Ontem, como prova de fidelidade, Hélder foi à sede da presidência do PMDB filiar um político de seu estado para concorrer nas eleições municipais.
Renan negou a aliados que tenha patrocinado a ideia de licença dos ministros. Mesmo assim, os aliados de Temer o acusaram nos bastidores de ter insuflado os ministros. Os movimentos pendulares de Renan têm causado insatisfação. Mas ele já avisou que manterá uma postura de presidente do Senado, porque terá que julgar eventual processo de impeachment de Dilma. Ontem, contou que não havia consenso entre os ministros sobre que atitude tomar.
— Eles conversaram (comigo), mas externando um ponto de vista, e não havia consenso entre eles. Eles ficaram de hoje conversar com a presidente e definir com ela o que vão fazer. Fiz questão de dizer a eles que, da mesma forma que não quis influir na nomeação deles, muito menos gostaria de influir na exoneração — disse Renan.
Kátia Abreu defendeu em redes sociais que a presidente tome a decisão que achar melhor para recompor o governo:
“Continuaremos no governo e no PMDB. Ao lado do Brasil, no enfrentamento da crise. Deixamos a presidente à vontade caso ela necessite de espaço para recompor sua base”, disse Kátia Abreu, no Twitter.
Os ministros Marcelo Castro (Saúde) e Celso Pansera (Ciência e Tecnologia) estiveram ontem com Dilma. Castro afirmou a políticos com quem conversou que do cargo “só sai amarrado”. Deputados que se dizem ainda indefinidos quanto a apoiar ou não o impeachment avaliaram que a direção do PMDB pode ter dado um tiro no pé, antecipando o rompimento.
— O PMDB desembarcou no meio do oceano. Não há garantia de um placar favorável ao impeachment — avaliou um parlamentar do partido.
No Planalto, os ânimos melhoraram com o sentimento de que a propagada unidade do PMDB em torno do rompimento não é tão sólida. Auxiliares da presidente argumentam que a saída do PMDB deu ao governo a chance de buscar apoios efetivos, que signifiquem votos. O fato de Dilma ainda ter a caneta na mão desperta o interesse de aliados. Além disso, sustenta um assessor, em todos os partidos da base, inclusive o PMDB, há espaço para a disputa de votos.
— A situação do governo é difícil, mas a tarefa dos que querem o impeachment é muito mais difícil porque eles precisam de 342 votos. O governo precisa de 172 — disse o assessor.
O clima no PT, ontem, era de animação. Petistas já projetam ter 200 votos para barrar o impeachment.
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