quinta-feira, 16 de junho de 2016

Delator acusa Temer e outros 22 políticos de pedirem propina

• Sérgio Machado afirma ter intermediado mais de R$ 100 milhões • Depoimento registra mesada de R$ 300 mil para Renan Calheiros • Peemedebista cita R$ 1 milhão para Aécio na campanha de 1998

A divulgação do conteúdo da delação premiada do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado sacudiu Brasília e envolveu 23 políticos de oito partidos no esquema de propina denunciado por ele à Lava-Jato, entre eles o presidente interino, Michel Temer, de seu partido, o PMDB. Segundo Machado, Temer lhe pediu R$ 1,5 milhão num encontro, em 2012, na Base Aérea de Brasília, para a campanha do também peemedebista Gabriel Chalita à prefeitura de São Paulo. O dinheiro, diz o delator, foi pago pela construtora Queiroz Galvão. O presidente interino afirmou que a acusação de pedir recursos ilícitos é “absolutamente inverídica”. Machado deu o nome de 16 empresas que tinham contratos com a estatal e que, segundo ele, pagaram R$ 109 milhões em propina. O delator disse que remetia, desde 2008, mesada de R$ 300 mil ao presidente do Senado, Renan Calheiros. E que, por dez anos, repassou R$ 200 mil mensais ao senador Romero Jucá. Em troca, os políticos do PMDB o mantiveram na presidência da Transpetro. Machado também contou que o senador Aécio Neves (PSDB-MG) recebeu, de forma ilegal, R$ 1 milhão, em 1998. O dinheiro, disse o delator, foi usado para financiar campanhas de 50 candidatos à Câmara, com o objetivo de alçar o então deputado ao cargo de presidente da Casa, em 2000. Aécio e os demais políticos citados negam as acusações.

Lava-Jato alcança Temer

• Delator diz que presidente interino pediu dinheiro de propina para campanha de Chalita em 2012

André de Souza, Carolina Brígido, Jailton de Carvalho e Vinicius Sassine - O Globo

-BRASÍLIA- A delação do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado incluiu, pela primeira vez, o presidente interino, Michel Temer, no escândalo da Lava-Jato. Em depoimento de delação premiada, Machado disse que Temer lhe pediu para fazer doação de R$ 1,5 milhão para a campanha de Gabriel Chalita à prefeitura de São Paulo, em 2012. Segundo Machado, na conversa ficou claro que se tratava de pedido de repasse, por doação oficial, de propina de contratos da Transpetro, empresa subsidiária da Petrobras.


O delator deu nomes de 16 empresas que pagaram propina, totalizando R$ 109,49 milhões e beneficiando 23 políticos de oito partidos. Só o PMDB recebeu R$ 104,35 milhões, segundo Machado. Temer e os demais envolvidos negaram irregularidades. A delação já tinha deixado o Congresso em polvorosa por ter ensejado um pedido de prisão do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) — um dos acusados de receber propina —, e de outros caciques do PMDB.

Entre analistas, o impacto da delação diretamente sobre Temer ainda é incerto, mas pode criar problemas para seu governo no Congresso. No Planalto, a percepção é que as acusações aprofundam o ambiente de insegurança política, o que pode dificultar negociações que terá pela frente, como a aprovação do teto de gastos.

O pagamento para a campanha de Chalita saiu dos cofres da Queiroz Galvão, uma das empreiteiras investigadas na Lava-Jato, segundo o delator. O ex-presidente da Transpetro disse que inicialmente foi procurado pelo senador Valdir Raupp (PMDB-RO), que disse que Chalita não estava bem na campanha, e negociou para “obter propina na forma de doação oficial”.

Este trecho da delação diz: “Posteriormente, (Machado) conversou com Michel Temer na Base Aérea de Brasília, provavelmente no mês de setembro de 2012, sobre o assunto, havendo Michel Temer pedido recursos para a campanha de Gabriel Chalita. O contexto da conversa deixava claro que o que Michel Temer estava ajustando com o depoente era que este solicitasse recursos ilícitos das empresas que tinham contratos com a Transpetro na forma de doação oficial para a campanha de Chalita”.

Repasse do diretório do PMDB
Não consta na prestação de contas de Chalita, registrada no Tribunal Superior Eleitoral, doação em nome da Queiroz Galvão. No entanto, Chalita declarou, em 2012, ter recebido uma doação no mesmo valor citado por Machado em nome do Diretório Nacional do PMDB. O conteúdo da delação de Machado tornou-se pública ontem por decisão do ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF).

Em nota, Temer negou que tenha feito o pedido a Machado. “É absolutamente inverídica a versão de que teria solicitado recursos ilícitos ao ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado — pessoa com quem mantinha relacionamento apenas formal e sem nenhuma proximidade”, diz a nota. Chalita disse que não conhece Sérgio Machado nem pediu a ele recursos para campanha.

Machado disse no depoimento que se registrou na Base Aérea de Brasília no dia do encontro com Temer. Auxiliares dizem que o presidente interino não se lembra de ter mantido encontro com o ex-presidente da Transpetro na base. Temer determinou à FAB que faça varredura de todos os registros de encontros que teve no local em 2012. A versão do Planalto é que Temer esteve com Machado três ou quatro vezes desde 2011, sempre no Palácio do Jaburu (residência oficial) ou na Vice-Presidência, no prédio anexo ao Planalto.

A assessoria da FAB disse que ainda está verificando os registros de entrada na Base Aérea de Brasília, e que ainda não tem como dizer se Machado esteve no local em setembro de 2012.

No pedido de homologação da delação ao STF, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, menciona os possíveis crimes existentes a partir da narrativa de Machado: organização criminosa, corrupção ativa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro, “com envolvimento do vice-presidente, de senadores e deputados federais”.

Além disso, relaciona a ascensão de Temer à Presidência ao suposto plano para obstruir as investigações da Lava-Jato. “Os efeitos desse estratagema estão programados para serem implementados com a assunção da Presidência da República pelo vice-presidente Michel Temer e deverão ser sentidos em breve, caso o Poder Judiciário não intervenha”, escreveu Janot no documento enviado ao STF em 12 de maio, mesma data em que Dilma Rousseff foi afastada do cargo.

Segundo auxiliares, Temer está indignado, mas “tranquilo” quanto ao conteúdo da delação porque nunca foi próximo de Machado. Na versão de aliados, não é verossímil a versão de que negociaria um esquema com alguém que não é de sua confiança, ligado intimamente a Renan Calheiros, de grupo distinto do dele no PMDB.

A maior parte da propina citada por Machado — cerca de R$ 84 milhões — foi paga em espécie, mas a maioria dos políticos recebeu o dinheiro por meio de doações oficiais.

Na delação premiada, Machado contou também que Temer reassumiu a presidência do PMDB em 2014 para controlar a destinação de uma doação de R$ 40 milhões feita pelo grupo JBS, controlador do frigorífico Friboi, a pedido do PT. Machado disse ter tomado conhecimento disso em reuniões na casa de Renan, mas não soube dizer da boca de quem.

Machado também disse não saber se a JBS obteve algum favorecimento em troca da doação. Segundo Machado, “o apoio financeiro do PT foi um dos fatores que fizeram com que Michel Temer reassumisse a presidência do PMDB, visando controlar a destinação dos recursos do partido”. Em nota, a JBS informou que “as doações para campanhas eleitorais foram realizadas de acordo com as regulamentações do TSE”. (Colaboraram Simone Iglesias, Catarina Alencastro e Fernanda Krakovics)

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