- O Globo
Nem bem os militantes lulistas comemoravam uma suposta superioridade do ex-presidente sobre o juiz Sergio Moro no seu depoimento em Curitiba, novas delações surgem, liberadas pelo relator da Lava-Jato no Supremo, ministro Edson Fachin, para acabar com a enganosa sensação de vitória da véspera. São declarações divulgadas pelo STF, não vazadas para a imprensa.
Trata-se da íntegra das declarações do casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura que revelam, com riqueza de detalhes e contas bancárias em diversos países, os meandros do financiamento de campanhas presidenciais no Brasil (de Lula e Dilma) e na Venezuela (de Chávez) pelas empreiteiras Odebrecht e Andrade Gutierrez sob a coordenação direta dos ex-presidentes Lula e Dilma e do ditador da hora na Venezuela, Nicolás Maduro, nossa trinca bolivariana.
A fugaz sensação de vitória se baseia mais na capacidade histriônica do ex-presidente Lula do que nas suas declarações, que foram vagas quando tratavam de sua pessoa, e peremptórias quando se referiam à falecida dona Marisa Letícia. Lula nunca sabia de nada, dona Marisa era quem dava as ordens.
Lula se sai bem sempre que não precisa dar atenção aos fatos, aos números, essas coisas concretas da realidade. Quando se trata de tergiversar, discursar e enrolar, o ex-presidente é uma espécie de Rolando Lero, o personagem de Chico Anysio interpretado pelo ator Rogério Cardoso, em um eterno palanque.
Ou, para elevar o rumo dessa prosa, da espécie de Teodorico Raposo, o Raposão, de “A Relíquia”, de Eça de Queiroz, que se faz passar por beato para enganar a tia carola Titi, e se tornar o herdeiro de sua fortuna.
Raposão, ao final da vida, se convence de que não teria sido deserdado se afirmasse sempre que a relíquia que havia trazido da Terra Santa era a camisola de Maria Madalena, e não a de Miss Mary, uma prostituta que conhecera durante a viagem.
Os detalhes contados por João Santana e sua mulher, Mônica Moura, também colocam por terra a fama de “presidenta honesta” de Dilma Rousseff, ou do republicanismo de seu governo. A presidente tinha sempre informações sobre as operações da Polícia Federal, e avisava aos marqueteiros quando o cerco apertava.
Sugeriu que passassem um tempo no exterior e chegou a criar um sistema de mensagens em código para informá-los das investigações. Era Dilma também, segundo o relato dos dois, quem comandava as negociações para pagamento de caixa dois para sua campanha eleitoral.
João Santana chegou a contar que o próprio Lula autorizava os pagamentos mais altos, tendo o ex-ministro Antonio Palocci dito sempre que a última palavra era “do chefe”. O ex-presidente tinha uma maneira maliciosa de se referir aos pagamentos da Odebrecht, contou Santana. Perguntava se “os alemães” o estavam tratando bem.
Todos os detalhes estão lá, até mesmo o pagamento de contas pessoais da então presidente Dilma, e todos os relatos batem com outros, de outros delatores. A retórica palanqueira de Lula pode se impor em determinados momentos, mas suas contradições e as histórias dos que o rodearam nesses anos todos de corrupção organizada pelo seu governo não deixam dúvidas de que ele estava sempre no comando do esquema.
Até mesmo um documento rasurado encontrado em seu apartamento, demonstrando que já havia a intenção de ficar com o tríplex do Guarujá em vez da unidade simples, serviu para que colocasse a culpa nos policiais que estiveram lá para a condução coercitiva. “Quero saber quem rasurou”, disse Lula, jogando a culpa para quem encontrou o documento.
Os mesmos a quem ele já havia ameaçado, dizendo que voltaria à Presidência e não se esqueceria da cara de nenhum deles. Lula vai ser processado pela Associação dos Delegados de Polícia Federal.
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