Raphael Di Cunto | Valor Econômico
BRASÍLIA - Logo após o Tribunal Regional Federal da 4ª Região marcar o julgamento de sua apelação contra a condenação em primeira instância, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem, em três eventos com parlamentares do PT e com catadores de material reciclável em Brasília, que é inocente, que o juiz federal Sergio Moro o condenou sem provas e que, se for convencido de que é culpado, admitirá que não tem condições morais de disputar a Presidência.
Lula evitou reclamar da data de julgamento. "Passei minha vida inteira criticando a Justiça de morosa, agora que tiveram presa não vou criticar", afirmou. Mas sinalizou que continuará atuando e cobrou que o PT marque nova edição das caravanas em fevereiro, após o julgamento, justamente na terra da Lava-Jato, no Rio Grande do Sul e Paraná.
"Eu não quero que vocês tenham um candidato escondido na sua candidatura porque ele é culpado. Eu quero ser inocentado pra poder ser candidato. Se eles apresentarem provas aí eu terei a satisfação de eu mesmo dizer que não posso ser candidato a presidente", afirmou.
A antecipação do julgamento pelo TRF 4 em mais de dois meses do que esperavam os petistas não muda os planos do partido de lançar Lula candidato à Presidência, mas acendeu um forte sinal de alerta e deve levar à revisão da estratégia jurídica da sigla.
"Tem que remontar a estratégia. Esse agendamento é abertamente ilegal, subverte a regra regimental de julgar na ordem cronológica", afirmou o deputado Wadih Damous (PT-RJ), um dos conselheiros jurídicos do ex-presidente. Para o petista, "só porque" a ordem cronológica não costuma ser seguida nos tribunais, "não quer dizer que não é uma ilegalidade desrespeita-la".
A estratégia do PT, revelada pelo Valor, era utilizar recursos ao próprio TRF-4, caso o julgamento tivesse divergências, ou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF), para tentar protelar a conclusão do julgamento. A "antecipação" dá mais tempo para o Judiciário proferir a decisão pelo menos em segunda instância e diminuiria os argumentos para contestar a Lei da Ficha Limpa.
Líder do PT no Senado, Lindbergh Farias (RJ) tem conversado com diversos advogados que atestariam a capacidade de Lula concorrer mesmo que condenado em segunda instância - e, portanto, inelegível pelos critérios da Lei da Ficha Limpa. O registro das candidaturas ocorrerá até 15 de agosto e, "se correrem muito", o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) poderá impugnar Lula dia 12 de setembro. Caberia, contudo, recurso ao STF.
Com três semanas para o primeiro turno (em 7 de outubro), a aposta do PT é que o STF iria preferir respeitar a "vontade das urnas" e manter Lula na disputa do segundo turno do que invalidar seus votos e colocar o terceiro mais votado no lugar. Isso, dizem petistas, seria uma "fraude" que traria instabilidade ao país.
Os petistas, contudo, avaliavam que, pelo histórico, o recurso contra a condenação de Lula por corrupção e lavagem de dinheiro pelo suposto recebimento de vantagens indevidas da OAS na forma de reserva e reforma de um tríplex no Guarujá (SP) seria decidido em abril ou maio. O julgamento, porém, será 24 de janeiro, o que dá mais tempo para que os demais recursos sejam julgados antes da eleição.
Além de reclamarem da rapidez, os petistas dizem que a data é problemática por dois motivos: será entre as férias escolares e o Carnaval, "quando há menor mobilização", e no período de recesso do STJ e STF, o que fará com que os recursos sejam julgados pelos presidentes dos tribunais.
"Vamos trabalhar todas as hipóteses, mas, sobretudo, por incrível que pareça, vamos pela absolvição. Lógico que a pressa, as relações, dão toda aparência de condenação. Mas não damos como fato consumado", disse Damous. Como o agendamento ocorreu na terça-feira, o partido ainda não debateu o assunto com mais profundidade, o que ocorrerá na reunião de seu diretório nacional, amanhã e sábado, com a presença de Lula e da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
Líder nas pesquisas de intenção de voto para 2018, Lula continua como o único plano do PT para disputar à Presidência e é visto como o único capaz de eleger uma bancada forte de deputados e senadores do partido. A legenda tem outros dois nomes, o ex-governador da Bahia Jaques Wagner e o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, mas ambos marcam "traço" nas pesquisas e continuarão no banco de reservas, dizem petistas, até o cenário ficar mais claro.
O maior temor dos petistas é o risco de que, confirmada a condenação pela segunda instância, Lula seja preso, o que não é obrigatório, mas é uma possibilidade. Mesmo que as pesquisas o apontem como um dos principais cabos eleitorais, não dá para fazer campanha da cadeia, diz um petista.
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