Folha de S. Paulo
Outra 'vitória' como essa das nossas
instituições e estamos perdidos
As instituições estão funcionando? A pergunta é
difícil de responder, porque tanto a palavra
"instituições" como a expressão "estar funcionando"
comportam múltiplas interpretações. "Instituições" pode designar
tanto as estruturas formais, isto é, criadas por lei, pelas quais uma sociedade
se organiza (Congresso, Judiciário), como os padrões de comportamento mais
estáveis e valorizados que seus membros reproduzem (casamento, democracia,
imprensa).
"Estar funcionando" não é menos polissêmico. Quando conjugado a "instituições" pode refletir diferentes níveis de expectativa. Os mais exigentes dirão que as instituições funcionam quando fazem com que todos os agentes se comportem como lordes ingleses numa partida de críquete. Os mais indulgentes dirão o mesmo quando elas conseguem prevenir rupturas constitucionais e a violência política.
Jair Bolsonaro está mais para ferrabrás
sarraceno do que para lorde inglês, de modo que, pelo critério mais rigoroso,
as instituições fracassaram miseravelmente. Mas foram capazes, até aqui, de
evitar um golpe de Estado na acepção clássica.
O governo, por seus próprios deméritos, se
enfraquece a cada dia, e a saída que Bolsonaro encontrou para não ser
destituído foi entregar-se por inteiro ao centrão. E o centrão, como se sabe,
faz muita coisa errada, mas destruir voluntariamente a democracia não é uma
delas. Pelo critério mais flexível, as instituições estão, portanto,
resistindo.
É claro que isso tem um preço. A democracia
não foi formalmente rompida, mas se deteriorou bastante nestes dois anos e meio
de Bolsonaro. E não foram só as instituições democráticas, formais e informais,
que sofreram. O prejuízo foi enorme em várias outras áreas, com destaque para
ambiente, educação e direitos humanos.
Se dá para falar em vitória das
instituições, é uma vitória de Pirro: outra como essa e estamos perdidos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário