O Globo
A senadora Simone Tebet, pré-candidata do
MDB à Presidência, disse que o investidor não precisa ter dúvidas sobre o
posicionamento dela na economia e acrescentou: “Minha história fala por mim”.
Esse é o problema com o candidato Sergio Moro, do Podemos, ele não tem história
em alguns temas decisivos do país. Em outros, acumula controvérsias. No mercado
financeiro já se ouve o farfalhar dos apoios incondicionais à pessoa sem
conteúdo definido, como houve em 2018. O autoengano recomeçou.
O problema em torno de Sergio Moro é o quase nada que se sabe sobre suas ideias em várias áreas. Nos 16 meses que ficou no Ministério da Justiça, Moro barrou demarcações de terras indígenas, mandou o fracassado pacote anticrime para o Congresso, embutindo nele o excludente de ilicitude, apoiou indiretamente um motim de policiais no Ceará e abonou os sinais de desvios éticos no governo Bolsonaro, quando começaram a surgir.
Para contextualizar os ditos no parágrafo
anterior. Havia 17 processos de demarcação de terras indígenas prontos para
serem assinados pelo ministro da Justiça. Moro devolveu tudo para a Funai e
nunca demonstrou ter qualquer interesse pelo tema indígena. O apoio ao
excludente de ilicitude é agressão ao Direito. Ninguém que aposte no devido
processo legal pode achar natural essa licença para matar que é bandeira de
Jair Bolsonaro.
Na questão da corrupção, que o levou a ser
conhecido no país, Moro disse que tinha “confiança pessoal” em Onyx Lorenzoni,
quando se descobriu o caixa dois do então coordenador da transição do governo
Bolsonaro. Em 9 de janeiro de 2019, diante do relatório do Coaf mostrando as
movimentações suspeitas de Fabrício Queiroz, ele disse que o presidente já
havia esclarecido o caso do ex-assessor do filho. Até hoje o caso permanece não
esclarecido.
Houve um evento assustador na sua gestão no
Ministério. Greve de policial é proibida, porque é motim de pessoas armadas. E
que foram armadas pela sociedade com o fim exclusivo de protegê-la. Policiais
militares se amotinaram no Ceará, desafiando o governador Camilo Santana e
levando medo à população. Moro enviou o coronel Aginaldo Oliveira para resolver
o conflito. Lá, o coronel definiu os amotinados como corajosos e gigantes. “É
muita coragem fazer o que vocês estão fazendo. Os covardes nunca tentam, os
fracos ficam pelo meio do caminho.” Imagine o perigo se todas as PMs do Brasil
seguissem a orientação do enviado do Ministério da Justiça ao Ceará. Moro foi
padrinho do casamento de Aginaldo com a deputada Carla Zambelli e nunca o
repreendeu por essa atitude temerária.
Esses são os fatos. Moro não pode ser
idealizado. Ele precisa, na campanha, definir suas ideias e propostas. Ter
escolhido como conselheiro um bom economista como Affonso Celso Pastore é bom,
mas está longe de ser suficiente. Ele, em muitas áreas, é uma página em branco
e precisa preenchê-la. Para o bem ou para o mal, os outros candidatos são
pessoas com ideias conhecidas.
O ex-presidente Lula está na vida política
do país há mais 40 anos e governou o Brasil por dois mandatos. Bolsonaro teve
longa vida parlamentar, na qual defendeu atentados à liberdade e aos direitos
humanos. Esse tétrico prontuário foi desconsiderado por muitas cabeças
pensantes do país. Deu no que deu. O governador João Dória tem um histórico que
não é longo, mas testado na administração da maior cidade e do maior estado do
país. Ciro Gomes foi prefeito, governador e ministro. A senadora Simone Tebet
foi deputada estadual, prefeita, vice-governadora e, no Senado, presidiu a
Comissão de Constituição e Justiça. Todos podem dizer “minha história fala por
mim”. Moro teve curta experiência administrativa e deixou lacunas e
contradições.
Há muitos temas que precisarão de respostas
em 2022 e não apenas a economia. O ataque de Bolsonaro à democracia exige uma
defesa intransigente do pacto democrático de 1988. As ofensas aos negros, as
ameaças aos indígenas, o desprezo às mulheres, o preconceito contra a
comunidade LGBTQ no governo Bolsonaro aumentaram a urgência da questão da diversidade.
É mais do que um debate sobre minorias, é trincheira de defesa da civilização.
Os atentados à Amazônia tornaram emergencial um amplo plano de proteção do meio
ambiente. A ambiguidade não será aceitável em 2022. O país vive momento
dramático e decisivo.
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