Pedro Venceslau / O Estado de S. Paulo
Ex-presidente da Câmara, deputado
licenciado defende que tucanos se assumam como principal contraponto ao PT e
busca experiência fora do Legislativo
Depois de seis mandatos consecutivos no
Congresso e de presidir a Câmara duas vezes, o deputado federal
licenciado Rodrigo Maia (PSDB), 51, desistiu
de concorrer novamente ao Legislativo e abriu caminho para sua irmã
gêmea, Daniela Maia (PSDB),
que deixou a presidência da RioTur.
Maia chegou a se licenciar do governo paulista na semana passada para cumprir o prazo a Justiça Eleitoral, mas na segunda feira, 4, reassumiu o cargo de secretário de Projetos e Ações Estratégicas.
Em entrevista ao Estadão no seu gabinete no
Palácio dos Bandeirantes, o ex-presidente da Câmara, que vai assumir a
presidência da federação formada por PSDB e Cidadania no Rio de Janeiro, contou
que segue como coordenador do plano de governo de João Doria e vai se dedicar a
política fluminense nos finais de semana.
Após ser apontado como presidenciável no
início dos debates sobre a sucessão de 2022 e visto como principal interlocutor
entre os poderes nas crises provocadas por Jair Bolsonaro, Rodrigo Maia mergulhou
de cabeça no projeto do governador Rodrigo Garcia e
decidiu ficar fora das brigas internas de sua nova legenda no plano nacional.
O ex-presidente da Câmara prega que o PSDB
se assuma como um partido de centro-direita e rejeita o rótulo de terceira via.
“O eleitor de centro pode decidir a eleição, mas não é majoritário. O PSDB é o
principal partido de contraponto ao PT, para não usar o termo centro-direita,
que alguns tucanos não gostam. Reclamam comigo quando eu uso”, afirmou.
Maia disse, ainda, que se Lula e Bolsonaro forem para o segundo turno, votaria no petista.
A seguir, leia os principais
trechos da entrevista.
Por que o sr. desistiu de tentar o 7°
mandato como deputado federal?
Eu fui tudo na Câmara dos Deputados e quero
agora uma experiência fora do Legislativo. Tive a experiência com Doria e agora
com o Rodrigo (Garcia), que é de fato o meu grande amigo, e vejo a
possibilidade de ajudar no governo dele esse ano. E com a provável reeleição
nos próximos quatro anos também. Ser deputado a carreira inteira não é ruim,
mas quem chegou à presidência da Câmara já ocupou quase todas as posições na
Casa. O político tem que estar sempre aprendendo. Talvez esse seja um dos
problemas da política brasileira: as pessoas acabam se acomodando no papel de
parlamentar. Quero cumprir um ciclo no executivo e me reciclar. Quero aprender
mais sobre gestão e orçamento público para que no futuro eu possa ter outros
desafios na política ou até no setor privado.
O sr. segue também como coordenador do
plano de governo de João Doria. Acredita que vai haver de fato sinergia entre a
campanha dele e a do Rodrigo Garcia à reeleição em São Paulo?
Na campanha do João eu coordeno o plano de
governo. Quero me restringir a isso. Entrei no PSDB, mas existem muitos
conflitos no PSDB dos quais eu não quero participar. O que me dá prazer na
política hoje é aprender. Sou cristão novo no PSDB. Já em relação ao Rodrigo
Garcia, é uma eleição diferente. Ele é meu amigo. Na eleição nacional vou me
ater aos temas técnicos para construir um plano transformador da vida das
pessoas.
O sr. vai estar na campanha do Rodrigo
também?
Vou ajudar o Rodrigo no que ele precisar.
Como avalia o cenário no PSDB?
Como deputado e um filiado que acabou de entrar no PSDB, acho esse conflito muito estranho, mas não quero participar disso. Esse conflito vem de antes da minha entrada no partido. Teve prévias e foram questionar. Foi uma votação com 44 mil pessoas. Isso deve ser tratado por quem está no partido há mais tempo. Doria se viabilizou como candidato. Desde o governo Fernando Henrique Cardoso, o PSDB tem um problema de aceitar que está à direita do Lula. O PSDB precisa aceitar isso. É assim que a sociedade nos vê. A gente fez pesquisas por muitos anos. Se a sociedade entende que o Lula é esquerda, então o adversário tem que estar no outro polo. Precisamos resgatar o nosso eleitor e mostrar que nesse campo existe um caminho a ser ocupado.
Como o sr. avalia os encontros de tucanos
como FHC, Aloysio Nunes e outros com Lula?
Como todos foram para a oposição ao
Bolsonaro, que é considerado uma direita não democrática, isso confundiu a
cabeça do eleitor. Se você olhar o cruzamento de pesquisas na avaliação
positiva do governador João Doria, vai ver que o Lula tem 40% das intenções de
voto. No cenário de São Paulo, o candidato hoje que tem os votos com perfil
tucano é o Fernando Haddad, e não o Rodrigo Garcia ainda. Naturalmente o Haddad
vai para a oposição e nós vamos ocupar aquele espaço da boa avaliação que o
governo tem hoje. Nacionalmente, o nosso eleitor tem hoje mais restrição ao
Bolsonaro do que vontade de apoiar uma candidatura fora da polarização. Um
terço dos votos do Lula está no antibolsonarismo. O Churchill tem uma passagem
muito interessante. Um jovem deputado chegou para ele no início da legislatura,
olhou para o lado dos opositores e disse: ‘Primeiro-ministro, lá na frente eles
serão nossos inimigos’. Churchill respondeu: ‘Não, lá na frente eles serão
nossos adversários. Nossos inimigos estão aqui atrás’. É um pouco do que
acontece hoje no PSDB e no nosso campo. Se conseguirmos ocupar um espaço, será
tirando a vaga do Bolsonaro.
Qual deve ser o discurso para o PSDB entrar
nesse jogo?
Não deve ser atacar o presidente Lula. Eu
disse isso ao governador João Doria. Temos que dizer aos eleitores que se
decepcionaram com Bolsonaro que temos uma alternativa que não seja a volta ao
passado e o PT. A esquerda acha que se reduz desigualdade intervindo no Estado.
Nós acreditamos que vamos redistribuir renda estimulando o setor privado.
O antipetismo deixou de ser então o grande
eleitor que foi em 2018?
O antipetismo é a mola mestra do presidente Bolsonaro, mas ninguém deu uma alternativa que o ocupe o lugar dele na
centro-direita democrática. Temos que derrotar o Bolsonaro com uma candidatura
que defenda aquilo que motivou o eleitor em 2018: um Estado moderno, eficiente,
bom prestador de serviço e que segurança jurídica para o setor privado
investir.
Qual a sua leitura sobre esse debate no
PSDB sobre uma possível revogação das prévias pela convenção do partido e qual
o valor dessa carta que o Bruno Araújo, presidente do partido, escreveu
validando o resultado da consulta interna?
O governador Doria venceu um modelo de
prévias que em tese era favorável ao governador Eduardo Leite. Ele (Doria)
mesmo assim se dispôs s disputar. Não foi um voto para cada eleitor, mas com
pesos diferentes para os líderes políticos. O melhor modelo era ser um voto
para cada filiado ao PSDB. O processo escolheu de forma democrática o Doria e
foi legitimado pelos adversários. Isso certamente tem muito mais valor que uma
convenção. Mas não tenho nenhum interesse em participar desse debate, até
porque isso pode enfraquecer o partido. O PSDB é o principal partido de
contraponto ao PT, para não usar o termo centro direita, que alguns tucanos não
gostam. Reclamam comigo quando eu uso. A gente devia ajudar o governador Doria
a se viabilizar. Se lá em julho isso não acontecer, ele vai certamente
construir uma solução. O nosso campo, que tem uma linha mais pró-mercado, está
fora do debate. O debate está sendo feito entre valores conservadores – e
muitas vezes reacionários – e por outro lado liberais demais com o PT e seus
aliados.
Por que o sr. não encaminhou o processo de
impeachment contra o Bolsonaro quando era presidente da Câmara?
Porque não havia apoio político. Uma
vitória de Bolsonaro poderia fortalecer demais o presidente e organizar uma
narrativa contra as instituições democráticas.
Avalia que a campanha do Rodrigo em São
Paulo deve ser casada com a do Doria para presidente?
O governador Rodrigo precisa primeiro
mostrar a sua história e sua experiência com 5 governadores e defender o
Governo de São Paulo, que teve grandes acertos. Ele tem que ser o governador do
Estado de São Paulo. Não tenho dúvida que ele chega ao 2° com pelos menos 25%
dos votos.
Por que João Doria tem uma rejeição
incompatível com a aprovação do governo?
Todos os políticos que se colocam no centro
terão uma rejeição alta. Se você projetar a rejeição do Eduardo Leite e da
Simone Tebet sobre o que eles têm hoje de imagem positiva e negativa, e o alto
desconhecimento, eles chegarão a uma rejeição parecida a do governador Doria.
Ele fez o enfrentamento a máquina bolsonarista, o que gera uma rejeição grande.
Eles operam unidos. Não é à toa que o Tarcísio cresce rapidamente.
O sr não gosta do termo terceira via?
Não tem terceira via. O Tony Blair se dizia
terceira via, mas não era. Eram os trabalhistas contra os conservadores. Depois
de um ciclo longo com os conservadores no poder o partido trabalhista estava
mofado. Tony Blair modernizou o partido e criou o termo terceira via apenas
para sair isolamento da esquerda e caminhar para o eleitor de centro, que
existe. O eleitor de centro pode decidir a eleição, mas não é majoritário no
processo eleitoral em nenhuma democracia do mundo. Se você olhar as eleições no
Brasil vai ver que sempre sobram os dois. Em 2002 Roseana (Sarney) foi
alternativa e caiu. Depois veio o Lula disputar contra o Serra, que era o
candidato do governo. Em 2018 o Bolsonaro ocupou o lugar do PSDB na polarização
contra o PT. A polarização comandou o processo político brasileiro desde 1994.
A tendência então é a polarização se
repetir esse ano?
Se nós não entendermos que o nosso campo é
à direita do Lula, estaremos fora do segundo turno. Não é fácil ocupar esse
espaço porque estamos no campo da direita com o Bolsonaro à nossa direita.
Precisamos buscar esse 1/3 do eleitor do presidente Lula que não sairá com ele
sendo agredido.
Em São Paulo, vê o Fernando Haddad no 2°
turno e o Rodrigo disputando com Tarcísio Freitas?
O Rodrigo Garcia para mim está no 2° turno.
Teremos um segundo turno entre PT e PSDB em São Paulo. É praticamente
impossível que o governador não esteja no segundo turno.
Como enxergou a mudança de planos do Sergio
Moro, que vai disputar algo em São Paulo, e do José Luiz Datena, que foi para
um partido aliado do Bolsonaro e saiu da coligação do Rodrigo Garcia?
Moro está fora do processo nacional e vai
enfrentar um processo regional, de parlamentar. Vai cuidar da vida dele. Datena
é um grande comunicador e tem muita popularidade, mas vai ter muita dificuldade
em transferir votos para alguém.
Como está o cenário eleitoral no Rio de
Janeiro? O candidato a governador do grupo de vocês será o nome escolhido por
Eduardo Paes?
Minha decisão de assumir a presidência da
federação no Rio é um alinhamento com o prefeito do Rio. Estaremos juntos com a
candidatura que ele apoiar. Tem o Felipe Santa Cruz (ex-presidente da OAB), e o
Rodrigo Neves, do PDT, de quem o Eduardo está próximo. Mas podemos colocar aí
um terceiro nome: o ex-prefeito César Maia, que aparece com 18% de intenção de
votos em todas as pesquisas. Temos três alternativas nesse processo. Acho que o
presidente Lula errou. a gente deveria ter tentado construir uma candidatura em
torno do presidente da Assembleia, que deixaria o PT e iria para o PSD.
Uniríamos todos os campos políticos do Rio para o enfrentamento com o Cláudio
Castro e o Bolsonaro. Infelizmente não foi possível.
Como avalia a escolha do Geraldo Alckmin
como vice de Lula?
Ele é meu amigo. Sou admirador do
governador Geraldo Alckmin. Foi uma grande escolha do presidente Lula. Foi uma
decisão acertada. Alckmin sabia que enfrentar uma eleição contra a máquina em
São Paulo não seria simples. É importante abrir espaço para outros. Seria o 5°
mandato dele. Alckmin avaliou o cenário político atual. Tomou uma decisão
pessoal de fazer uma aliança da esquerda a centro direita para colaborar com
enfrentamento a esse governo que não é muito democrático. Lula é nosso
adversário, mas não é nosso inimigo.
No caso de um 2° turno entre Lula e
Bolsonaro, quem o sr. apoiaria?
Não posso falar nem quero falar pelo PSDB.
Se o governador João Doria não estiver no 2° turno, e acredito que ele estará,
o natural é que eu caminhe para votar no presidente Lula no 2° turno. Mas
acredito em um 2° turno Lula x Doria.
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