O Globo
A miríade de partidos políticos em atuação
no Congresso impede que se chegue a um acordo para lançar candidato único à
Presidência da República pelo chamado “centro democrático”. Cada partido tem
seu “dono”, que quer puxar a brasa para sua sardinha devido aos fundos
eleitoral e partidário. Fica mais importante fazer uma grande bancada no
Congresso do que tentar eleger um presidente que, seja qual for sua ideologia,
dependerá dos parlamentares para governar. São os novos “donos do poder”.
A “ameaça” do União Brasil de apresentar uma chapa própria, se a turma do
“centro democrático” não levar em consideração a escolha de seu presidente,
Luciano Bivar, como candidato a presidente da República, é mais uma jogada para
melar o jogo. Provavelmente, desse mato não sai coelho, e os partidos acabarão
liberando seus parlamentares para palanques regionais.
O União Brasil não quer ter uma candidatura que atrapalhe Lula. Bivar não
atrapalha ninguém, fará uma campanha barata, e sobrará dinheiro para financiar
uma grande bancada. Um acordo com Moro ou Ciro Gomes seria contra Lula, o que
ninguém quer, especialmente o DEM do Nordeste. E uma parte do PSL que está no
União Brasil ainda gosta de Bolsonaro. Então, fica evidente que a escolha de
Bivar não é para ganhar eleição, e sim para liberar os votos de todos.
Bivar já foi candidato várias vezes a presidente e nunca teve voto. Atraiu Moro
para o partido não para ser candidato a presidente, e sim para candidatar-se a
deputado federal e trazer votos para a legenda, que representam dinheiro e
eleições. Muitos candidatos seriam eleitos com a votação de Moro, com a
previsão de que teria cerca de 3 milhões de votos. É uma situação interessante
para Moro — que teria votação espetacular e um ótimo início de carreira
política, mas colocaria para dentro do Congresso cinco, até dez deputados,
muitos dos quais gostaria de ter prendido. A convivência com os futuros colegas
será traumática.
Na verdade, a maioria do Congresso é da mesma tendência liberal: os partidos do
Centrão, que no momento têm cerca de 171 deputados, mais os componentes de MDB,
PSD, PSDB, PTB, Podemos, que aprovaram várias medidas do projeto econômico
liberal nos governos Temer e Bolsonaro (teto de gastos, privatização da
Eletrobras, reformas trabalhista e previdenciária, Banco Central independente,
marcos regulatórios).
Apesar do fisiologismo e do patrimonialismo, esses deputados são a garantia de
estabilidade democrática em qualquer governo. Os do Centrão estão convencendo
os recalcitrantes de que serão a garantia de que Bolsonaro não tentará jogar
fora das quatro linhas da Constituição, como gosta de dizer. Também o PT terá
na maioria conservadora e liberal da Câmara um obstáculo aos seus radicais.
Com as mudanças dos últimos anos, que garantiram uma autonomia muito grande aos
parlamentares na execução orçamentária, ter uma bancada forte tornou-se
fundamental. As “emendas do relator”, um novo tipo de “mensalão” legalizado,
reservam uma fatia de R$ 11 bilhões no orçamento para os apaniguados do
presidente da Câmara. Além disso, as emendas são hoje impositivas — têm de ser
executadas —, e os valores destinados aos fundos eleitoral e partidário chegam
agora a R$ 5,9 bilhões.
Com esse dinheirão e esse poder de distribuir benesses sem controle, aumentou
muito a possibilidade de desvio de verba, e escândalos surgirão
inevitavelmente, como agora no MEC. Mas, como ao mesmo tempo o Congresso e o
Supremo Tribunal Federal (STF) estão desmontando todos os instrumentos de
punição aos corruptos, os parlamentares estão protegidos.
Outro líder do Centrão, o chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, ganhou o poder de
aprovar mudanças no Orçamento, antes atribuição exclusiva do Ministério da
Economia. Todas essas novidades legislativas fazem com que os partidos estejam
mais preocupados com suas bancadas, mas o Centrão e outros partidos da mesma
massa homogênea estão empenhados em reeleger Bolsonaro, para tudo ficar como
está.
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