Folha de S. Paulo
Isolado, presidente imita Trump e entrega
os pontos, sem reconhecer vitória de Lula
O presidente
Jair Bolsonaro (PL) encerrou seu governo na prática nesta tarde
de terça (1º) com um ato de covardia institucional, para ficar próximo da pior
sigla da ditadura que enalteceu de várias formas ao longo de sua gestão.
Convocou sem ênfase o fim de protestos em
rodovias por parte de uma franja de seus apoiadores que
acredita que coisas como intervenção militar para negar a derrota por
margem mínima sofrida para Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Agradeceu os mais de 58 milhões de votos
que teve, mas não reconheceu a vitória do adversário. Deixou para um
encabulado, se a palavra se aplica, Ciro Nogueira (Casa Civil) o papel de dizer
que irá começar a transição de governo com o vice-presidente eleito, Geraldo
Alckmin (PSB).
Ou seja, admitiu a derrota sem ter a hombridade de fazê-lo. Novamente, seguiu a cartilha deixada por seu modelo político, o ex-presidente americano Donald Trump. Em novembro de 2020, o republicano demorou uma semana após a proclamação do resultado da eleição para, a seu estilo, postar no Twitter que Joe Biden havia ganho a eleição.
Só para dizer, na sequência, que o rival
democrata havia roubado o resultado, iniciando uma fracassada batalha legal que
só acabou com a apoplexia da invasão do Capitólio americano em 6 de janeiro e o
fim do sonho trumpista.
O silêncio
adotado por Bolsonaro desde a derrota acaba por minar a
legitimidade de sua expressiva votação. Ele inovou: em vez de comandar uma
jornada golpista que acabasse num "Capitólio caipira", o presidente
deixou que seus apoiadores atrapalhassem a vida de milhares de brasileiros nas
estradas só para dizer que isso era um método da esquerda.
Se achava que esse golpismo por procuração
ia funcionar, pelo visto calculou mal.
A covardia institucional se ampliou na
tentativa de cooptar o Supremo Tribunal Federal para a farsa, algo esgrimido
com tenacidade pelas sucessivas decisões de
Alexandre de Moraes, secundadas pela maioria da corte, ao lidar
com os arreganhos autoritários do que se desenrolava nas ruas com apoio da
Polícia Rodoviária Federal.
O convite para um convescote privado no
Palácio da Alvorada, prontamente negado por quem não foi indicado por ele para
a corte, selou o destino de qualquer ideia de armistício com a montanha de
problemas legais que esperam Bolsonaro sem foro.
A escalada
golpista associada ao presidente ficou, de todo modo, em aberto
com seu não reconhecimento da vitória de Lula. O petista, aliás, até aqui teve
comportamento elogiável de não cair na esparrela de que poderia haver um
terceiro turno nas estradas bloqueadas do país.
Isso, aliado ao
esvaziamento da tática colegial do bolsonarismo, efetivamente
coloca um fim ao governo de Jair Messias Bolsonaro dois meses antes do prazo
legal.
Claro, temas como o do relatório que
o presidente quer extrair da Defesa contras as urnas
eletrônicas quase com certeza surgirão, mas os dentes do Cérbero que o
presidente sempre apresentou ao establishment se mostraram de açúcar.
O paralelo histórico possível, sem a
dramaticidade obviamente, é com Jânio Quadros
e sua tentativa de autogolpe em 1961. Abandonado de A de
Arthur Lira a Z de Zambelli (a Carla, a deputada pistoleira),
resta agora a Ciro tocar a transição de um país sem comando, dando uma dimensão
nova à expressão americana "pato manco", que designa presidentes sem
poder no fim do mandato.
Bolsonaro ainda vai querer causar estragos,
claro, está em sua natureza. Sua origem
militar, contudo, deveria lembrá-lo do que significa um chefe
sem tropa após uma derrota de grande magnitude. Admitir que perdeu dizendo que
vai "cumprir a Constituição" não lhe deixa exatamente muita pólvora
no paiol da contestação.
Um comentário:
Não é o que parece, pelo menos no Banco do Brasil estão confiscando salários de funcionários do estado pago antes da eleição. Com autorização de quem? Se do governador séria hipocrisia tapear os funcionários. Se for do presidente é muito grave, passando por cima da determinação do governo do estado. Se for iniciativa do Banco do Brasil - seria o caso de um processo, pela Constituição salários não podem ser bloqueados nem para pagar dívidas. O BB pode ainda receber um processo de apropriação indébita ou peculato. Qual vai ser?
Postar um comentário