Folha de S. Paulo
Atividade ilegal é motor econômico em
Roraima, e população local continuará a rejeitar pautas ambientais
As trágicas imagens do genocídio yanomami em
Roraima muitas vezes vêm acompanhadas da figura do garimpeiro. Tidos por parte
da imprensa e dos movimentos sociais como "maus elementos", os
garimpeiros são, em sua maioria, pessoas pobres, descendentes de migrantes
nordestinos, que passaram a ocupar a região amazônica a partir das décadas de
1960 e 1970 com incentivo de governos militares.
Na época, o apoio estatal ao garimpo era explícito, tanto que, em 1969, foi construído em Boa Vista (RR) o Monumento ao Garimpeiro. Porém, com a demarcação de terras indígenas prevista pela Constituição de 1988, o garimpo se tornou ilegal em tais territórios, o que possibilitou o surgimento do narcogarimpo.
De acordo com o sociólogo Rodrigo Chagas,
professor da UFRR (Universidade Federal de Roraima), o termo narcogarimpo é
utilizado para enfatizar afinidades eletivas entre as atividades do
narcotráfico e do garimpo. Segundo Chagas, há uma complexa rede de aeroportos e
portos ilegais por onde trafegam drogas e minérios, e é comum que o ouro
extraído dos territórios indígenas seja utilizado para lavagem de dinheiro
proveniente do tráfico de drogas. Hoje, 59% da população da Amazônia Legal vive
em municípios com forte
presença de facções criminosas.
Vários jovens de Boa Vista,
sem maiores perspectivas de futuro, são atraídos por promessas de aventura,
poder e riqueza de forma análoga aos jovens de São Paulo e do Rio de Janeiro
cooptados pelo crime. Exemplar nesse sentido é Antônio, garimpeiro de 20 anos,
encontrado escondido na mata após uma ação do Ibama. Confrontado
por repórteres da Folha,
o jovem, que garimpa desde os 16 em terras indígenas, indaga: "Como eu vou
viver com R$ 3.000 na cidade? Aqui eu posso ganhar R$ 20 mil por mês".
A despeito dos inúmeros desastres causados
pela extração de minérios na região amazônica, se tornou comum que políticos
"defendam" os interesses de garimpeiros. Esse é o caso de Jair
Bolsonaro, contumaz defensor dos garimpeiros. Nas eleições de 2022, 76% dos
eleitores de Roraima votaram no capitão reformado. Lula
saiu vitorioso apenas no município indígena de Uiramutã, onde angariou 68%
dos votos.
Além de conquistar eleitores, Bolsonaro
procurou atrair o apoio de empresários. Roberto Katsuda, um dos principais
revendedores de retroescavadeiras usadas em garimpos no Pará e em Roraima,
recebeu das mãos do ex-presidente uma medalha de "imbrochável". Logo
após a "honraria", Katsuda seria investigado pela CPI do
8 de janeiro por ter financiado atos golpistas, com base em relatórios
da Abin.
A agência classifica Katsuda como
"notório defensor de garimpos em áreas protegidas e um dos maiores
articuladores políticos" do tema. Além dele, Enric Lauriano, outro
empresário do garimpo, também foi listado pela Abin como financiador de manifestações
golpistas no Pará e em Brasília e participou presencialmente do ato no dia 8 de
janeiro.
Como bem aponta o sociólogo Rodrigo Chagas,
não há solução de curto prazo para a tragédia
em Roraima. Enquanto o narcogarimpo figurar como o principal motor
econômico da região, a população local continuará a rejeitar pautas ambientais,
celebrar empresários como Katsuda e Lauriano, apoiar políticos pró-garimpo e
invisibilizar o genocídio yanomami.
Um comentário:
Excelente!
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