terça-feira, 2 de abril de 2024

Aylê-Salassié Filgueiras Quintão* - Percebendo-se numa "fake"

Os eleitores de 2022 começam a perceber  a "fake" em que entraram, ao votar  naquele pleito, que oferecia  apenas dois  candidatos  com ampla visibilidade, e que,  segundo    avaliação do experiente  jornalista e editor Carlos Brickmann, um era louco e o outro  corrupto. Passadas as eleições, declarado o vencedor,   os cidadãos começaram a cair  na real,  ao tomarem conhecimento  de veladas  intenções do vencedor .

O circo foi se  esvaziando. Aos poucos, a  população desapareceu das  manifestações de rua convocadas pelo vitorioso, e passou a receber  mal as visitas e exposições do casal presidencial. As  redes digitais reproduziam entre si , amplamente ,as  críticas severas   às leviandades públicas cometidas pelo eleito contra pessoas internamente  e países em conflito sem qualquer  relação com a governabilidade no Brasil .   Sem qualquer pejo ou ética, os governantes tentam  transformar, em inimigos da população, adversários pessoais ou partidários, estratégia que repete  na história alguns regimes ditatoriais longevos, e que, percebida,  vem sendo rechaçada, interna e externamente.Os empresariado  e as categorias médias estão assustados com as mudanças inesperadas na política   brasileira, sem  se enxergar nada sendo colocado no lugar. Há uma repetição sistemática do já conhecido e, de algumas coisas até fracassadas no passado. Descrentes de um futuro ainda não anunciado, as empresas convivem  inseguras com os indicadores da economia divulgados por vozes oficiais: crescimento de 2,9 do PIB em 2023; redução do desemprego no primeiro trimestre de 2024  para 7,8% (8 milhões de trabalhadores), sem referência ao tão criticado  emprego informal - "Todo mundo vai ter carteira de trabalho assinada" -, representado  hoje  por perto de 25 milhões de trabalhadores, número e condição  omitido nas estatísticas  de governo.  Evita-se comentar  ainda sobre o encerramento das atividades produtivas de centenas  de empresas ,  confundindo -o com com a história da oneração e da desoneração fiscal das empresas. Não se fala também muito  sobre os investimentos, tanto internos quanto externos. O que  surge aí , vez por outra, vem, virá ou veio da China . 

 Ambiguamente,  recolocando o desemprego no cenário da economia,  o ministro Luiz Marinho, do Trabalho, alimenta-se da  hipótese de um orçamento de R$ 111.9 bilhões,  em 2024, para o Fundo de Apoio ao Trabalhador - FAT . Concorda, entretanto, que desse valor, quase imaginário,  R$ 78.9 bilhões seriam destinados ao pagamento do seguro- desemprego e do abono salarial, esta ajuda direta às famílias sem renda própria: um crescimento contraditório.   

O Ministério  prenuncia a expansão do emprego, e faz de conta  de que desconhece   dados mais reais . Confia, sem entrar em detalhes,  que as eleições municipais deste ano vão abrir muitas vagas de trabalho. É verdade. só que serão de trabalho temporário, sem carteira assinada.  Provavelmente, esses empregos surgirão nos meses de  agosto e setembro, que antecedem às eleições. 

Poucos são os  dirigentes empresariais  que acreditam e manuseiam com seguranças os indicadores macroeconômicos divulgados oficialmente, em que pese a seriedade histórica das instituições que os calculam e configuram: IBGE, FGV, IPERJ, IPEA. Inseguros,  questionam a sua validade para o planejamento de expansão dos  negócios. Alguns chegam a   projetar uma crise econômica para o período pós eleitoral. Um terceiro grupo fecha as portas, muda de atividade, e demite o pessoal. Os estrangeiros, a exceção da China, não desembarcam por aqui. O  Banco Central teme, inclusive, que a redução da SELIC (taxa básica de juros), de 10,75 hoje, não vá se sustentar mesmo, e já está falando em uma retomada da dos níveis anteriores.

Estão todos receosos  de avançar nas gastanças, como recomenda o governo. Os estrangeiros inclusive. Não há no horizonte nenhuma preocupação do governo com a possibilidade  de um déficit fiscal avantajado.  Os dados do IBGE parecem estar revestidos de uma roupagem populista, quase vazia, marquetologicamente institucionalizada. Não se deve dar um tostão para as falas de Macron, Presidente da França, que veio passar  três dias no Brasil para corrigir algumas disfunções retóricas. Mas, parece ter seguido o cinismo corrente. O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Lavrov, também passou rápido e sorrateiro por aqui. 

A máquina do Estado revela a cada dia a carência de profissionais e técnicos habilitados para formular e administrar o conjunto das políticas públicas , todas submetidas , artificiosamente, a contingenciamentos e cortes orçamentários  mesmo . Os cargos de  gestão, com raras exceções, estão sendo ocupados vagarosamente  por representantes partidários, nem sempre qualificados. Os concursos públicos  arrastam-se retoricamente no tempo, desde a campanha eleitoral de 2022, frustrando a esperança de emprego de milhões de jovens recém saídos das universidades.  

Os descrédito das iniciativas discursivas   vem maculando inclusive  até as decisões  do Poder Judiciário, com credibilidade baixíssima. Servidores  mais antigos , sobretudo no Executivo,  reivindicam, sem sucesso, reajustes de salários, ameaçados de congelamentos. Percebe-se que o governo está adotando uma política de arrocho   no serviço público. Nada impede  que, a partir do segundo semestre, o funcionalismo publico comece a fazer paralizações de advertência e greves mesmo.

Outro problema grave são as viagens presidenciais com o propósito, propagado amplamente, de situar o Brasil como ator no cenário mundial.  Opiniões pessoais, altamente contraditórias, às vezes sem sentido,  são emitidas em nome  da Nação. Essas tiradas  inconsequentes e sem a legitimidade - que viria do Congresso - estão aparentemente desconstruindo a imagem  carismática construídas pelo atual governante. "Ele mente ", já advertia, na oposição,  Geraldo  Alkmin - essa personalidade claudicante - há dez ou quinze anos atrás  A imagem do País  e dos brasileiros piorou sensivelmente depois dessas aventuras oficiais ,  de caráter quase nupciais. Parece que a Nação vem caindo  numa  "fake".

* Jornalista e professor

2 comentários:

laurindo junqueira disse...

Ailê: paralisações e não "paralizações" (com "z").

ADEMAR AMANCIO disse...

Cruzes!