A política de juros já havia mudado de patamar em agosto do ano passado e agora mudou outra vez.
Depois de quatro cortes seguidos de meio ponto porcentual por vez, ontem o Comitê de Política Econômica (Copom) aumentou a dose para 0,75 ponto porcentual. Os juros básicos (Selic) são agora de 9,75% ao ano. Em princípio, prosseguirá essa toada por mais uma ou duas reuniões, dependendo de como se comportar a inflação.
O discurso mais agressivo da presidente Dilma Rousseff nos últimos seis dias já preparava os espíritos para uma tacada mais forte - supostamente para responder à política monetária excessivamente expansionista dos grandes bancos centrais - a mesma que vem gerando os tais tsunamis de moeda estrangeira sobre os países emergentes, inclusive sobre o Brasil.
Aparentemente, essa derrubada mais pesada da Selic seria o modo mais adequada de desestimular operações de arbitragem com juros. Um tanto simplificadamente, isso se dá quando investidores daqui ou do exterior tomam crédito barato lá fora e mandam dólares para cá - para tirar proveito, no mole, dos juros bem melhores que aqui vicejam. Um dos impactos disso é a queda das cotações do dólar no câmbio interno (valorização do real), que tira competitividade da indústria.
No entanto, autoridades do Banco Central, presidido por Alexandre Tombini, já diziam que não há sinais de que esse jogo especulativo seja relevante. E, ontem, em resposta a analistas que pedem mais controle na entrada de Investimento Estrangeiro Direto (IED), o próprio ministro da Fazenda, Guido Mantega, informou que o governo federal está monitorando afluxos de moeda estrangeira para farejar alguma coisa esquisita. Mas "parece que não tem arbitragem", admitiu.
Então, se não é para coibir entrada de capitais especulativos, o acirramento da velocidade da queda dos juros poderia ter a ver com a pressa do governo federal em chegar logo aos tais juros de um dígito (abaixo de 10% ao ano). Se for isso, o objetivo está alcançado. Mas é improvável que o Copom dê os trâmites por findos. Se a dose do remédio aumentou, então se espera que continue o procedimento médico por mais algumas vezes.
O comunicado divulgado logo após o encerramento da reunião do Copom foi seco e gélido. Não avançou nem sequer uma das razões da decisão tomada. É preciso agora esperar pela Ata do Copom, que sairá na próxima quinta-feira, para procurar indicações dos novos passos.
Outro efeito é o aumento da atratividade da caderneta de poupança diante das demais opções de renda pós-fixada. Como pagam TR mais juros de 6,17% ao ano e não cobram Imposto de Renda, o rendimento da caderneta tende agora a suplantar o dos fundos DI.
Há quem argumente que, em 2009, a Selic se situava em um dígito, à altura dos 8,75% ao ano, sem que então se notasse migração significativa das aplicações financeiras para a caderneta. Ocorre que, naquele ano, a inflação embicava para a meta de 4,5%. Neste ano de 2012, o patamar de inflação gira ao redor dos 6,0% ao ano. E essa diferença de inflação, a mesma que corrói o capital aplicado e redefine o juro real, vai pedir mais pressa do governo federal nas mudanças das regras da caderneta.
No gráfico, a evolução dos juros básicos (Selic) desde 2008.
Pedreira. Mais de três horas de reunião e dois votos (em sete) contra a queda maior dos juros mostram que a decisão do Copom não foi fácil.
Sem pistas. O comunicado foi de um laconismo atroz. Não deu nem uma única pista sequer sobre os argumentos que serão evocados para essa derrubada. Muito provavelmente, o mau desempenho da indústria, escrachado nesta quarta-feira pelo IBGE, foi fator decisivo.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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