Moços e Moças
“Sim, é possível uma humanidade melhor”(discurso de Pepe Mujica, presidente do Uruguai, na ONU, setembro de 2013
Muito me honra e orgulha estar aqui e agora podendo compartilhar lições e sonhos da minha juventude nos idos de 60 e 70 em Juiz de Fora, minha cidade natal; sonhos, que até hoje orientam o meu viver, o meu fazer: Uma sociedade mais justa e igualitária para todos. Uma nova ordem mundial.
Parabenizo os organizadores da conferencia pela pertinência da temática: Juventude em rede para a cidadania e pelas pautas que vão orientar o trabalho em grupo: Cultura e Conexão, Diálogo com o Governo, Direito de se Associar, Educação, Mercado de Trabalho, Objetivos do Milênio, Respeito às Diferenças, Segurança, Maioridade Penal, Sexualidade, Vida Saudável, Política, Drogas.
O protagonismo juvenil, o jovem como sujeito da história se impõe, desde o cartaz da Conferência, no chamamento para ajudar a definir as prioridades dos jovens em nosso município: Seu futuro depende de você!
Nosso futuro, dos que nos antecedem e dos que nos sucedem, depende de vocês, caros conferencistas.
Juventude em rede para a cidadania, vale repetir.
As redes sociais são a grande revolução do mundo contemporâneo, nenhum outro meio tecnológico é mais capaz de mobilizar, conscientizar, organizar. As redes sociais da juventude podem ainda reivindicar, exigir e fiscalizar o cumprimento das ações do poder público no encontro das necessidades e aspirações da sociedade, traduzidas em políticas públicas efetivas.
Nenhum outro meio é capaz de desmascarar os que se apropriam da representação popular contrariando o interesse público.
Temos que ter sempre em mente que ao longo da história existem forças poderosas, com fortes conexões, manobrando para que as mudanças no interesse do povo não aconteçam. Tais forças não dormem, nem sequer cochilam, todavia elas podem ser surpreendidas por uma nova força inusitada, emergente: a força da juventude, a força das redes sociais comprometidas com a cidadania, a democracia, os avanços políticos, econômicos e sociais.
Não podemos deixar de fazer alusão ao recente movimento de indignação nacional que tomou as ruas do nosso país e ainda ecoa nos nossos ouvidos.
A voz rouca e indecifrável do povo e, sobretudo, dos jovens, transformou num grito estridente e claro do Oiapoque ao Chuí. Esse grito desmascarou e assustou muitos daqueles acostumados a manipular os fatos em nome da preservação de privilégios e perpetuação das desigualdades e injustiças.
O dado novo é que jamais se tinha constatado a imponderável força das redes sociais e da internet para conscientizar e articular o movimento social de forma barata, rápida e eficiente.
A idéia de espaço, distância, se relativizou. A informação, até então restrita, se publitizou.
Eis o advento da era da informação, da comunicação. Eis a era na qual o novo ganha espaço e os anseios, robustos, frescos e animados da juventude se legitimam.
A capacidade de mobilização e de provocar mudanças: MUDOU: foi para nas mãos da juventude.
No último inverno no Brasil, as ruas mostraram de fato o NOVO. Daí a propriedade desta Conferencia que ora se inicia ainda em setembro de 2013, que deve ter como inspiração e compromisso o NOVO.
Nosso grande desafio é pensar o novo sob uma perspectiva de evolução pacífica, mas sem deixar de pensar no salto de qualidade que os gritos das ruas passaram a clamar de forma retumbante.
O gigante acordou? Não creio que estivesse dormindo, ele foi sempre reprimido, açoitado, acuado, amedrontado, até que um dia, como se fosse do nada, ou por algo que explicita de forma tão clara, cruel e brutal a inversão do interesse público, como o transporte urbano, as tarifas de ônibus...o gigante acorda, espreguiça, ocupando os espaços que lhe convém, que lhe é de direito: o direito a indignação.
O gigante aparentemente sonolento, letárgico, indiferente foi acordado corajoso e mais forte pelas redes sociais, pela juventude em rede pela cidadania.
Aparentemente, tênues e imbricados são os contornos e limites da expressão legitima da cidadania com a expressão da violência.
Peço que me ouçam com atenção:
Todo esse processo de debate, conscientização, mobilização, demanda, controle e fiscalização em nome do interesse público deve ser feito sem confronto, sem provocação, sem violência por parte de quem quer que seja.
O direito, a ética, a evolução humana no caminho de uma civilização mais justa e fraterna estarão sempre lado a lado por um mundo melhor, pela construção de uma nova ordem.
A PAZ é imperativa, a paz é solo e semente da construção do novo, pelo qual todos nós, aqui presentes, almejamos e arregaçamos as mangas.
Não estou falando da” paz dos cemitérios”, mas de um conceito critico, criativo, solidário e libertário.
Paz é a antítese da violência, esta sim, irmã siamesa do individualismo, egoísmo, da intolerância, da opressão e,sobretudo, da exploração entre seres humanos iguais, igualdade, ontológica, que reside na própria essência de ser humano.
Caros conferencistas,
Obviamente é preciso ter em mente que as redes sociais protagonizadas pela juventude podem ser objeto de controle e manipulação. Precisamos combater “o controle e interceptação” que algumas forças pretendem estabelecer sobre as comunicações.
Tal questão serve de alerta e lição a um duplo título: primeiro o cuidado que se impõe, sobretudo, levando em conta a impulsividade natural dos jovens e segundo a defesa de um valor maior, decorrência do próprio princípio da dignidade da pessoa humana que é o direito a inviolabilidade, privacidade e intimidade dos seres humanos.
Novos e eficientes mecanismos de interação e comunicação não podem ser submetidos aos interesses conservadores, às forças que sustentam o atraso e a exclusão social.
Precisamos ter antídotos, antídotos que sejam células ou núcleos de resistência contra a virulência dos agentes comprometidos com a manutenção do “status quo”.
Devemos e podemos criar e fortalecer o que os jovens denominam “redes do bem”: redes que procuram intercambiar o mundo virtual e o mundo real, numa relação harmoniosa. A internet nos coloca no MUNDO, mas não garante a relação com a VIDA, com a família, com os vizinhos, com os amigos.
A vida mais criativa e produtiva para os jovens se dá nas organizações da juventude, como nos grêmios estudantis, nos times de futebol, nos cine clubes, casas de cultura,nas associações de modo geral.
Nossas esperanças, as esperanças de várias gerações, desde os que ainda se encontram no ventre materno, até os idosos estão sem dúvida na mão dos jovens, dos jovens que conseguiram transformar o inverno de 2013 numa primavera de novas apostas, sonhos e possibilidades.
Os jovens precisam assumir um papel de vanguarda na história, identificando e refletindo sobre os problemas que atingem não só a eles, mas à toda sociedade. O Conselho da Juventude deve sugerir e ajudar a definir com os demais Conselhos, pautas e agendas comuns nas prioridades do município como um todo.
Que esta conferência construa propostas justas, equilibradas, coletivas, sensatas e faça gerar novas energias e forças propulsoras, tanto no governo, como na sociedade para a concretização das mesmas.
Tenho certeza que neste contexto a Conferência também propiciará oportunidades para uma reflexão sobre as possibilidades de transformação que os jovens podem operar no contexto da família, da escola e da vizinhança, independentemente, do poder público e da ação governamental.
Creio que novos conceitos, valores, atitudes e comportamentos compatíveis com a inovação, a solidariedade e a responsabilidade social podem/devem também ser debatidas e assumidas pelo coletivo e com certeza contagiarão toda nossa cidade.
Tirar o “R” da palavra “Arma” a transforma em “Ama”, mudar o “R” de lugar a transforma em AMAR. É simples e simbólico. Quantas coisas podem mudar no cotidiano das nossas vidas, para que nos tornemos melhores pessoas, melhores profissionais, melhores cidadãos.
Os temas centrais desta Conferência nos dão um bom roteiro, um bom enredo de transformação social, de invenções democráticas e de construção de felicidade. Somente a titulo de exemplo e pinceladas.
Quando falamos de drogas, devemos entender que a droga é uma resposta a não resposta.
Quando falamos de sexo, devemos procurar no Plano Nacional de Direitos Humanos o direito a uma sexualidade saudável e a paternidade e maternidade responsáveis.
Quando falamos de maioridade penal, devemos antes de cedermos ao discurso tentador/enganador do enrijecimento penal como solução para a problemática da segurança, nos atermos às interpretações sistêmicas de tal fenômeno, isto é, que assegurem a visão do todo e da interrelação entre todas as partes de um mesmo problema.
Neste sentido devemos nos debruça, seriamente, sobre as causas, para nos empenharmos mais severa e responsavelmente com as ações, programas e políticas publicas preventivas.
Merece aplauso o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, lei de 1990, que depois de duas décadas, infelizmente ainda clama para sair do mero plano da validade formal.
Trazer toda responsabilidade do aumento da violência urbana para os adolescentes a fim de legitimar uma redução da idade da imputabilidade penal, soa ao meu sentir, tão ineficaz quanto dessarazoado ou descabido.
Devemos demarcar bem os limites que podem confundir esta posição com a falta de responsabilização. A criança desde a mais tenra idade precisa conhecer o sim e o não. A liberdade de um indivíduo termina quando inicia a liberdade do outro. Existem valores universais, consagrados que precisam ser afirmados e perpetuados. Dizer que o adolescente necessita de uma atenção especial e diferenciada no seu processo de recuperação não significa que ele não seja responsabilizado pelos seus atos, através de uma legislação que busque de forma especifica a educação como aquela prevista no ECA.
Quando falamos em mercado de trabalho devemos aprofundar-nos sobre empreendedorismo e indústria criativa e lutar bravamente contra o trabalho infantil.
Quando falamos em educação devemos avaliar o quanto nossos parâmetros curriculares estão defasados das exigências da vida e do trabalho, e a assustadora precarização do ensino público.
Quando falamos em diálogo com o governo, devemos falar de parcerias, participação critica, autonomia, qualificação de demanda e co-responsabilidade com as tarefas que devem ser assumidas em conjunto.
Creio que não foi por acaso que os organizadores desta Conferência colocaram em primeiro lugar o tema da Cultura.
Cultura não é algo fora de nós, que podemos eventualmente adquirir por um treinamento mecânico: uma casca, uma superfície brilhante. Um livro, por exemplo, não é um objeto inerte numa biblioteca, mas sim uma mensagem que podemos tornar viva e incorporar como uma segunda pele.
Cultura é algo vivo e que nos constitui existencial e moralmente. É a roupa que vestimos, a comida que comemos, os sonhos que compartilhamos. É a cidade em que vivemos, o passado que vem até nós e, especialmente, o presente e o futuro que queremos e podemos construir juntos, de modo solidário.
A cultura é capaz de nos retirar da solidão do individualismo e do consumismo, solidão na qual, dizia o poeta mineiro, o imortal Carlos Drummond de Andrade “... se desaprende a linguagem com que homens e mulheres se comunicam”.
Para concluir peço licença para citar o imortal Rui Barbosa em sua celebre Oração aos Moços (1920)
“De tanto ver triunfar as maldades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto”
Esta citação traduz a expressão de um sentimento de desilusão e desencanto que não deve contaminar a juventude. Hoje dispomos de um instrumento de conscientização, mobilização e luta jamais conhecido e imaginado.
Ser jovem e não ser revolucionário e não comprometido com o NOVO é uma contradição antes de tudo biológica.
Juventude juizforana em rede para a cidadania, em marcha, sempre em nome da esperança,... “inquietude em forma de ação” (Pierre Furter)
Moços e moços da minha cidade, obrigada
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