- O Estado de S. Paulo
O velho deputado está terminando seu sétimo mandato consecutivo. Velho nem tanto pela idade, mas pela experiência. Foram 28 anos seguidos no plenário da Câmara, votando desde os capítulos da Constituição de 1988 até as dezenas de emendas que a reformaram. Sempre foi coerente com seus princípios. Se esses princípios coincidem com a vontade do dono do poder não é culpa dele.
De Lula a Dilma, de Sarney a FHC, o velho deputado sempre foi governista. Hábito. Pouco importa se seu partido faz oposição ao presidente da ocasião ou se ele próprio fez campanha para o adversário. O líder do governo - de qualquer governo - sabe que pode contar com seu voto em 80% das vezes ou mais. O líder de seu partido sonha em ter a mesma confiança, mas não reclama.
Melhor um deputado governista na própria bancada do que na dos rivais. Ele conta tempo de TV para o partido e aumenta a cota de recursos do Fundo Partidário para a agremiação. Deixa como está.
E o velho deputado, nunca pensou em trocar de legenda? De jeito nenhum. Ele se considera um quadro histórico. Trocaram as denominações de seu partido, trocaram a sigla, trocaram a posição em relação ao governo, mas ele não trocou nada. Está onde sempre esteve. É um liberal conservador, um governista de oposição, um ruralista pró-hospitais filantrópicos, um amigo do Tibete que defende o "direito da legítima defesa", um apoiador da microempresa em favor da "cadeia do aço e ferro gusa".
Sua base eleitoral sabe que pode contar com o velho deputado, principalmente com suas emendas ao Orçamento da União. São milhões e milhões a cada ano para as pequenas e médias cidades que costumam elegê-lo, cada vez com mais votos. Por obra do destino, às vezes coincidem a liberação, pelo governo, dos recursos dessas emendas com votações na Câmara. Mas, de novo, o que pode o velho deputado fazer se o governo concorda com ele?
Mais recentemente, outra coincidência tem lhe trazido dissabores. Só porque umas empresas que levam o seu nome recebem dinheiro do governo federal, acusam-no de franciscano. De fazer a política do toma lá dá cá, do "é dando que se recebe". Ora, que culpa tem ele se o governo precisa de suas faculdades? Não as intelectuais, diga-se, mas de suas salas de aula.
Começaram alugando-as para fazer o Enem (Exame Nacional o Ensino Médio), depois, para colocar alunos que têm suas mensalidades bancadas pelo Fies (Financiamento Estudantil). De R$ 1,5 mil em 2011, o dinheiro recebido da União pelas empresas homônimas ao velho deputado subiu para R$ 3,5 milhões em 2012, foi a R$ 12 milhões em 2013 e chegou a R$ 25 milhões em 2014. Tudo legal.
É muita implicância. Até da locadora de onde aluga os carros que usa quando está em Brasília desconfiam - só porque a fatura é paga pela verba de gabinete que recebe da Câmara. Basta. Chega. Não dá mais para o velho deputado. Ele vai voltar para sua terra natal, onde lhe dão valor por suas empresas, fazendas e hospital filantrópico que administra, com pequena ajuda federal.
Está na hora de deixar as novas gerações assumirem essa luta ingrata. É exatamente isso que seu filho deve fazer, assim que tomar posse de sua cadeira na Câmara dos Deputados. O velho deputado vai ser substituído pelo novo deputado. Ele foi eleito pela antiga base eleitoral do pai - praticamente uma herança. Pelo fabricante de armas e cartuchos que financiou sua campanha, deve integrar a mesma frente pelo "direito da livre defesa".
Assim se renova a política no Brasil. Sai o pai e entra o filho. Mudam caras e prenomes, seguem os sobrenomes. Trocam as siglas e os partidos, permanecem as práticas, usos e costumes - principalmente com o dinheiro público. E o velho deputado? Vira foto na parede, nome em letreiro? Isso também - além de garantir uma suplência no Senado, que ninguém é de aço ou ferro gusa.
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