Propinoduto desvendado
Germano Oliveira, Thaís Skodowski, Cleide Carvalho e Silvia Amorim – O Globo
• Documentos ligam Odebrecht a pagamentos feitos a dirigentes da Petrobras na Suíça
CURITIBA - Em nova denúncia oferecida ontem à Justiça a partir de investigações da Operação Lava-Jato, o Ministério Público Federal (MPF), pediu a condenação de 22 envolvidos no esquema de corrupção na Petrobras para beneficiar contratos das duas maiores construtoras do país: Odebrecht e Andrade Gutierrez. Além de executivos das duas empreiteiras, também foram denunciados gestores da estatal e operadores do esquema. Para fundamentar o novo pedido de condenação, os procuradores envolvidos na investigação apresentaram um minucioso detalhamento de transações financeiras, incluindo o rastreamento de contas no exterior, que ligam recursos movimentados pela Odebrecht ao dinheiro depositado em contas de funcionários da Petrobras na Suíça. Estes, por sua vez, repassavam recursos a políticos de PT, PP e PMDB, que lhes davam respaldo político. A Odebrecht, que nega relação com essas transações, movimentou pelo menos US$ 17 milhões, dizem os promotores.
No topo da lista dos denunciados estão os presidentes das construtoras Marcelo Odebrecht e Otávio Marques de Azevedo, presos desde 19 junho em Curitiba. Se a denúncia de ontem for aceita pelo juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal do Paraná, os executivos e os outros denunciados passarão à condição de réus e serão julgados pelo magistrado. Pelo cálculo do MPF, os prejuízos da Petrobras em contratos com as duas empreiteiras chegam a R$ 7,2 bilhões, quase o dobro do valor que os procuradores pedem a título de ressarcimento, até agora, em todas as ações movidas pela Operação Lava-Jato.
Os procuradores dizem ter desvendado o esquema sofisticado usado pela Odebrecht para levar vantagens em contratos com a estatal, que se diferenciava da ação das outras empreiteiras investigadas na Lava-Jato. Isso inclui a identificação da ligação da Odebrecht com contas e Offshores usadas para lavagem do dinheiro da propina no exterior, como as chamadas Smith & Nash Engineering, Havinsur, Arcadex, Golac Project e Sherkson. O procurador Deltan Dallagnon, que lidera a força-tarefa da Lava-Jato, apresentou ontem em Curitiba documentos que comprovam mostram a titularidade da Odebrecht. Isso foi possível com a chegada ao Brasil de documentos vindos da Suíça nesta semana.
Andrade Gutierrez propinas por operadores
Segundo a denúncia, a empreiteira recorreu a até três níveis de lavagem de dinheiro para despistar o pagamento de propina. As Offshores eram abastecidas por empresas da Odebrecht nos Estados Unidos e Panamá, que, por sua vez, transferiam parte desse dinheiro a contas ligadas aos então executivos da Petrobras Paulo Roberto Costa, Pedro Barusco e Renato Duque no exterior. Por vezes, antes de chegar a esses destinatários, a propina passava por contas de intermediários, também mapeadas pelos procuradores. O volume movimentado no esquema entre 2006 e 2014, segundo a denúncia, superou R$ 1 bilhão.
- Essas Offshores não têm o nome da Odebrecht, mas têm como titular real a empreiteira comprovadamente - afirmou Dallagnol.
A denúncia detalha ainda o esquema de pagamento de propina no caso dos contratos entre a Odebrecht e a Petrobras para a obra do Centro Administrativo da Petrobras em Vitória, no Espírito Santo, e o fornecimento de nafta a Braskem.
No caso da Andrade Gutierrez, o outro alvo da denúncia, são listadas oito obras ligadas às diretorias de Abastecimento e de Serviços. Para os procuradores, o pagamento de propina pela empreiteira deu-se basicamente por meio de empresas de fachada, que eram contratadas e recebiam sem nunca terem prestado qualquer serviço. O dinheiro, seja por meio de saques ou transferências para contas bancárias, acabou, segundo a denúncia, nas mãos dos de Paulo Roberto Costa, Fernando Soares e Pedro Barusco.
Entre os denunciados ontem pelo MPF por organização criminosa, lavagem de dinheiro e corrupção, estão o doleiro Alberto Youssef, Paulo Roberto Costa, Pedro Barusco e Renato Duque, além de executivos das construtoras e operadores políticos. Um novo personagem da Petrobras também foi denunciado: o gerente-geral Celso Araripe.
O MPF calculou em R$ 389 milhões o valor das propinas distribuídas pela Odebrecht e em R$ 243 milhões, os da Andrade Gutierrez.
- Nos aproximamos da verdade com documentos vindos da Suíça. Não há espaço para a teoria da conspiração. Temos um suspiro de esperança, um suspiro republicano. Estamos criando uma nova história, para punir todos os criminosos. As investigações não param aqui - afirmou o procurador Dallagnol, num recado aos advogados de defesa.
No balanço, 139 denunciados até agora
O MPF aproveitou ontem para fazer um balanço da Operação Lava-Jato: 139 pessoas denunciadas e 30 condenadas. Por causa dos 156 inquéritos abertos até agora e das cinco ações por improbidade abertas, já foram recuperados R$ 870 milhões, restituídos por acordos de delação premiada. Outros R$ 385 milhões são objeto de repatriação. Com multas e ressarcimentos aos cofres da União, já foram arrecadados R$ 4 bilhões. Cerca de R$ 2 bilhões que estão bloqueados em bancos do Brasil e do exterior.
O MPF pede da Odebrecht o ressarcimento de R$ 6,7 bilhões. Da Andrade Gutierrez, os procuradores querem R$ 486 milhões. A Andrade Gutierrez foi envolvida em atos de corrupção e pagamentos de propinas na Diretoria de Abastecimento em obras como da Refinaria da Comperj, no Rio de Janeiro. Já na diretoria de Serviços, a empreiteira pagou propinas no valor de R$ 1,5 bilhão em 2010. Três executivos da construtoras estão entre os denunciados.
- Inicialmente os valores eram feitos através de Fernando Baiano com a Andrade pagando à Tecnit, de Baiano. Eram feitos contratos frios para justificar a saída de dinheiro, quando na verdade não havia prestação de serviços, e sim propina. Constatou-se saídas de dinheiro das contas de Baiano e Armando Furlan Junior, seu sócio, com saídas inferiores a R$ 100 mil para não alertar o Coaf. Esse dinheiro era disponibilizado em espécie para Paulo Roberto Costa - disse Dallagnol.
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