- O Globo
Se Lula desconfiava, conforme relatos, de que o objetivo final da Operação Lava- Jato é ele, ontem o ex- presidente deve ter tido certeza disso. Nunca a Lava- Jato chegou tão perto dele, por enquanto apenas na retórica de seus procuradores ou do próprio juiz Sérgio Moro, mas com ações que se aproximam cada vez mais de denúncias que envolvem diretamente Lula no esquema de desvio de dinheiro da Petrobras.
O procurador regional da República Carlos Fernando dos Santos Lima afirmou, em entrevista coletiva para explicar a nova fase — sugestivamente chamada de “Nessun Dorma” (“Ninguém dorme”) —, que “não tem dúvida nenhuma” de que os escândalos de corrupção da História recente do país — mensalão, petrolão e Eletronuclear — tiveram origem na Casa Civil do governo Lula, cujo titular mais famoso, o ex- ministro José Dirceu, está preso pela segunda vez.
Ele não apenas insinuou, mas garantiu que as investigações indicam que foi montado um esquema de compra de apoio político para o governo federal conectados entre si desde o mensalão, pela mesma organização criminosa e pessoas ligadas aos partidos políticos.
Já o juiz Sérgio Moro escreveu, em um de seus despachos condenando o ex- tesoureiro do PT João Vaccari, que “(...) A corrupção gerou impacto no processo político democrático, contaminando- o com recursos criminosos, o que reputo especialmente reprovável. Talvez seja essa, mais do que o enriquecimento ilícito dos agentes públicos, o elemento mais reprovável do esquema criminoso da Petrobras, a contaminação da esfera política pela influência do crime, com prejuízos ao processo político democrático. A corrupção com pagamento de propina de milhões de reais e tendo por consequência prejuízo equivalente aos cofres públicos e a afetação do processo político democrático merece reprovação especial”.
Juntando- se essas afirmações ao fato de que a Operação Nessun Dorma apura a propina na diretoria Internacional da Petrobras de 2007 a 2013, ocupada por Nestor Cerveró, que negocia uma delação premiada com o Ministério Público, tem- se que, além das negociatas da Eletronuclear, estão sendo investigadas ações como o superfaturamento do contrato da sonda Vitória 10.000 — que, segundo Cerveró, foi feita a mando do próprio presidente da Petrobras à época, José Sergio Gabrielli, para saldar dívidas de campanha de Lula com o grupo Schahin.
Na proposta de Cerveró para a delação premiada, que ainda não foi aceita, ele afirma que Gabrielli lhe disse que a ordem veio “do homem lá de cima”, numa referência clara ao então presidente Lula.
O operador Júlio Camargo, em cuja delação premiada aparece a acusação ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha, disse que representava a Samsung na transação do navio- sonda Vitória 10.000 e confessou ter pago US$ 25 milhões a diretores e intermediários, incluindo aí o próprio Cerveró.
O ex- diretor da área Internacional contou aos procuradores da Operação Lava- Jato que os contratos de compra e operação da sonda Vitória 10.000 foram direcionados à construtora Schahin com o propósito de saldar dívidas da campanha presidencial de Lula, em 2006, com o banco de mesmo nome.
Esse caso está ligado a outro, mais nebuloso, envolvendo o assassinato do prefeito Celso Daniel, e foi revelado à época do mensalão numa tentativa malsucedida do lobista Marcos Valério de fazer uma delação premiada para se livrar da pena de mais de 40 anos a que foi condenado na ocasião.
Ele revelou que foi procurado pelo PT para pagar uma quantia em dinheiro a uma pessoa que ameaçava revelar detalhes do caso Celso Daniel, acusando líderes do PT pela morte. Segundo ele, que teria se recusado a entrar no esquema, coube ao pecuarista José Carlos Bumlai, amigo pessoal de Lula, fazer o pagamento, pelo qual contraiu um empréstimo de R$ 6 milhões no Banco Schahin, quantia que teria sido paga como parte da propina da sonda.
O próprio Milton Schahin admitiu ter emprestado R$ 12 milhões ao amigo do ex- presidente Lula, em declarações à revista “Piauí”, mas diz que não é obrigado a saber o que seria feito com o dinheiro. Bumlai era a única pessoa que tinha autorização para entrar no Palácio do Planalto a qualquer hora, sem audiência marcada, de acordo com um aviso que havia na portaria do Palácio, com sua foto para que não houvesse engano.
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