segunda-feira, 11 de julho de 2016

Governo escolhe a maior meta fiscal possível para 2017 – Editorial / Valor Econômico

À primeira vista, com as informações disponíveis até o momento, a meta anunciada pela equipe econômica para o déficit primário de 2017, fixada em R$ 139 bilhões, parece ambiciosa o bastante para sinalizar o comprometimento do governo interino de Michel Temer com o ajuste nas contas públicas.

Será uma tarefa nada trivial cumprir a meta, que pressupõe um substancial corte de despesas em um cenário ainda de queda da arrecadação. Para as contas fecharem, o governo terá ainda que levantar R$ 55 bilhões com privatizações e concessões, operações cuja concretização dependerá de haver apetite de investidores.

O mercado financeiro recebeu muito bem a decisão. Os juros futuros mais longos - aqueles mais importantes para alavancar investimentos produtivos - caíram para níveis próximos dos vigentes em 2014. Fica comprovado o acerto da equipe econômica em defender, nas discussões com as alas políticas do governo, um déficit primário menor para mostrar que um programa de ajuste fiscal de longo prazo não significa jogar o sacrifício para as calendas.


A meta definida para 2017 se traduz em um ajuste fiscal de 0,8% do PIB, um esforço considerável em um período de fraca atividade econômica. Dada a situação crítica das contas públicas, porém, é um progresso moderado. Para este ano, projeta-se um déficit primário do governo central de R$ 170,5 bilhões, cifra que equivale a 2,8% do Produto Interno Bruto (PIB).

Ancorado pela proposta de emenda constitucional que congela os gastos públicos em valores reais, o plano prevê o equacionamento gradual do desequilíbrio fiscal, reduzindo o déficit em cerca de um ponto percentual por ano.

Nesse ritmo, apenas em 2019 se chegará ao equilíbrio nas contas públicas. Levariam mais uma trinca de anos para o superávit primário atingir valores que estabilizem a dívida pública em proporção do PIB. Cálculos apresentados pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, apontam que em 2017 a dívida bruta do governo geral estará na preocupante marca de 76,6% do PIB.

Pelas poucas informações divulgadas até agora pelo Ministério do Planejamento, no entanto, essa é a maior velocidade exequível de ajuste nas contas públicas. A despesa total do governo central como proporção do PIB deverá recuar 0,6 ponto percentual, para 19,5% do PIB, entre 2016 e 2017. Um esforço significativo, considerando que o pagamento de benefícios do INSS vai crescer 11,3% entre um ano e o outro. O déficit do Regime Geral de Previdência aumentará 0,4 ponto percentual do PIB, chegando a 2,7% do PIB.

Como a solução do crescente déficit da Previdência depende de reformas, cuja aprovação congressual ainda é incerta, o Orçamento de 2017 terá que promover uma forte compressão dos demais gastos. Aquelas com o controle ao alcance direto do Executivo vão encolher de 4,3% do PIB neste ano para 3,7% do PIB no próximo. A tarefa será facilitada pelo fato de que o governo pagou em 2016 R$ 20 bilhões em despesas atrasadas, que não devem se repetir em 2017. Apesar disso, não será fácil atingir a meta.

Os cálculos do Ministério do Planejamento mostram que, mesmo com cortes severos na despesa, o déficit primário chegaria a R$ 194,4 bilhões em 2017. Isso porque estima-se uma queda equivalente a 0,8 ponto percentual do PIB nas receitas correntes, não obstante a discreta recuperação da economia prevista para o ano que vem. A projeção da área econômica baseia-se na hipótese de uma expansão de 1,2% do PIB em 2017.

Para chegar à meta de R$ 139 bilhões, o governo espera arrecadar cerca de R$ 55 bilhões com privatizações e concessões. Com alguma sorte, talvez essa desmobilização de ativos não se mostre necessária, caso a arrecadação tenha desempenho melhor que o esperado. Se nada der certo, Meirelles não descarta aumentar impostos.

Teria sido bem melhor anunciar desde já de onde virão as receitas para fazer as contas fecharem, mas isso seria exigir demais de um governo interino, com menos de dois meses no poder. Por hora, deve-se reconhecer o acerto em não cair na ilusão de que, com um ajuste mais suave, fosse possível poupar a atividade econômica. Seguramente, resultaria na queda na confiança e adiamento dos planos de consumo e de investimento. Em agosto, porém, cada linha do projeto de Orçamento enviado ao Congresso precisará mostrar consistência para reforçar a credibilidade do ajuste.

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