- O Estado de S.Paulo
Em ambiente e clima, o Brasil perdeu a voz e a visibilidade no mundo que teve desde a Rio-92
Destravando a Agenda da Bioeconomia na Amazônia foi tema do encontro live organizado pelo Instituto Escolhas e pelo Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice), na semana passada. Tivemos a oportunidade de tratar da questão da bioeconomia e da proteção da Floresta Amazônica como fator de projeção do Brasil no cenário internacional. Questões mais que nunca atuais e relevantes em vista da percepção externa do País extremamente negativa.
É indubitável que o meio ambiente entrou definitivamente na agenda global e um dos focos principais é a preservação da Floresta Amazônica. As imagens relacionadas a desmatamento, queimadas e garimpo ilegal na Amazônia em 2019 ganharam repercussão mundial. A retórica e algumas medidas e políticas governamentais contribuíram para a escalada da opinião pública internacional contra o Brasil, agravada agora pela maneira como é vista a condução das políticas em relação à pandemia e à confrontação política interna.
As preocupações com a preservação do meio ambiente e com a mudança do clima passaram a ter um impacto que vai além das sanções políticas, como no passado. Agora, com a entrada em cena da figura do consumidor e com a inclusão de políticas ambientais nas negociações de acordos comerciais, as consequências são econômicas e comerciais. Atraem restrições às exportações, boicotes e a inclusão de cláusulas específicas de desenvolvimento sustentável nos acordos comerciais, como ocorreu nas negociações do Mercosul com a União Europeia (UE). E Parlamentos europeus já estão votando moções contra o acordo com o Mercosul. O plano de recuperação da UE, depois da covid-19, inclui uma política industrial e uma política ambiental (Green Deal), que preveem punição a empresas que importarem produtos provenientes de áreas de desmatamento florestal.
Desde a conferência sobre meio ambiente realizada no Rio em 1992 o Brasil se tornara um ator relevante, com grande influência nas discussões e na implementação de políticas de meio ambiente e mudança de clima, como resultado do trabalho coordenado do Itamaraty e do Ministério do Meio Ambiente. O cenário atual mudou e o Brasil perdeu voz e a posição de visibilidade no mundo que ocupou nessa área nos últimos quase 30 anos.
O que fazer para transformar a percepção negativa do Brasil no exterior e evitar consequências contrárias aos interesses concretos do setor do agronegócio, o mais visado e prejudicado pela crescente importância que as exportações de produtos primários adquiriram no comércio exterior brasileiro? Nos primeiros cinco meses de 2020 mais de 65% das exportações brasileiras foram de commodities.
Restabelecer a credibilidade externa com o reconhecimento dos erros cometidos, recuperar a narrativa com resultados concretos de medidas e políticas adotadas e voltar a participar ativamente das discussões nos fóruns internacionais sobre a agenda de meio ambiente e mudança de clima são algumas das atitudes a tomar para que Brasil possa reverter essa percepção externa.
Vão na direção correta as recentes medidas do governo relacionadas ao restabelecimento em novas bases do Conselho da Amazônia, sob a coordenação do vice-presidente Hamilton Mourão, a abertura de negociações com a Noruega e a Alemanha para a volta da governança e do funcionamento original do Fundo Amazônia e a decisão de enviar o Exército para apoio ao Ibama e ao ICMbio no combate a ações ilegais de desmatamento, queimadas e garimpo ilegal na região. O Ministério da Economia está estudando um plano para o desenvolvimento econômico da região com o objetivo de discutir o regime de incentivos fiscais da União, inclusive no contexto da reforma tributária. A proposta de associar a Zona Franca de Manaus à biodiversidade da Floresta Amazônica poderia inicialmente complementar as atividades industriais hoje existentes.
De parte da sociedade civil, foi encaminhada ao governo, via presidência do Conselho da Amazônia, proposta do Instituto Escolhas e do Irice de um plano integrado da bioeconomia na Amazônia visando a utilizar os recursos naturais e humanos da região para estimular a economia e o emprego. O plano abre a possibilidade concreta de uma política consistente em curto, médio e longo prazos, com apoio de empresas nacionais e estrangeiras, além de governos e instituições financeiras internacionais. Estudo da OCDE mostra que até 2030 a contribuição da biotecnologia pode subir a mais de US$ 1 trilhão, distribuído entre os setores de saúde, produção primária e industrial. Por outro lado, a iniciativa da diplomacia ambiental que o Irice está desenvolvendo vai produzir um levantamento objetivo e transparente dos compromissos assumidos pelo Brasil em todos os acordos incluídos no capítulo de desenvolvimento sustentável do acordo Mercosul-União Europeia e o grau de cumprimento deles.
A defesa do interesse nacional aconselha, como defende o vice-presidente Mourão, uma narrativa transparente com a apresentação de resultados concretos e uma mudança de postura, com o abandono da atitude defensiva e com políticas e medidas para a defesa da Floresta Amazônica, acima de ideologias e partidos.
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