Não
temos plano claro de saída da crise nem de avanços econômicos, sociais e
tecnológicos
A
quinta sessão plenária do 19.º Comitê Central do Partido Comunista da China
(PCCh), concluída em 29 de outubro, apresentou as linhas gerais do 14.º Plano
Quinquenal econômico e social do país (2021-25), com os objetivos gerais para
os próximos cinco anos e o planejamento de médio prazo, até 2035. Mantendo a
retórica de “paz e desenvolvimento”, o PCCh traçou as principais linhas
estratégicas levando em conta, sobretudo, a crescente competição global.
Os documentos divulgados pelo PCCh, indicam que as lideranças do partido, refletindo as incertezas no cenário global, buscaram mudanças em três áreas: fortalecimento da economia, autossuficiência (mercado interno e indústria) e novas políticas sobre mudança de clima.
A
visão de futuro dos líderes chineses abandona a ênfase no crescimento econômico
com o aumento do PIB e passa a enfocar “o aumento significativo no poderio
econômico e tecnológico” até 2035, com foco em questões estruturais e qualidade
de vida. No comunicado final do plenário do Congresso não se fixa uma taxa de
crescimento para 2035, somente se menciona o objetivo de alcançar, em termos de
PIB per capita, o nível de países moderadamente desenvolvidos. Manter o
foco no crescimento faz sentido para a China num momento de competição com os
EUA, no que o comunicado chama de “profundos ajustes no equilíbrio de poder
internacional”. Uma grande economia vai “assegurar que a China tenha recursos
necessários para a defesa nacional e a pesquisa cientifica”. Em vista da
gravidade da crise pandêmica, a China teve de adiar o projeto da Rota da Seda
(Belt and Road Initiative), com um custo de US$ 1 trilhão em mais de cem
países, como uma forma de projetar seu poderio econômico além-fronteiras.
As
sanções dos EUA e as restrições à compra de semicondutores pelas empresas
chinesas forçaram mudanças na atitude da liderança do PCCh no tocante à
dependência de tecnologia do exterior e à necessidade de buscar a
autossuficiência em áreas consideradas estratégicas. As vulnerabilidades da
China foram exploradas geopoliticamente pelos EUA, apesar dos custos econômicos
e da oposição da indústria. O plenário do partido afirmou que “autossuficiência
em ciência e tecnologia é um pilar estratégico do desenvolvimento nacional” e
demandou que “importantes avanços sejam conseguidos em tecnologias críticas”
para que a China se torne “líder global em inovação”. Essa determinação já
estava presente no plano “Made in China 2025”, adotado em 2017, para o avanço
na política industrial, com resultados concretos em duas áreas nas quais o país
mostra agora liderança global: tecnologia 5G e 6G e inteligência artificial.
A
liderança chinesa passou a ver na política ambiental e de mudança de clima uma
forma de ganhar prestígio global e obter benefícios econômicos. A proteção
ambiental tem sido uma prioridade crescente para as autoridades chinesas, como
indica o acordo de cooperação assinado com os EUA visando a uma posição comum
na COP-26, quando se discutirá o Acordo de Paris. Na Conferência do Clima em
abril, Xi Jinping anunciou que a China fixou que o pico das emissões de gás
carbônico será em 2030 e, em 2060, será atingida a meta de emissão zero. Embora
ambiciosos, os objetivos anunciados indicam envolvimento crescente da China nas
discussões sobre políticas ambientais, com potenciais reflexos sobre outros
países.
Enquanto
a China faz seu planejamento com visão de futuro, o Brasil, perdido na crise da
pandemia, não tem e não discute medidas e políticas de médio e longo prazos. A
economia registrou queda de 3,1% em 2020 e se projeta em 2021 um crescimento de
cerca de 2,5%, ou 3% em estimativas mais otimistas. As questões fiscais, a
ausência de reformas, a queda no crescimento do comércio exterior e nos
investimentos externos não prenunciam uma saída em V, como repetido pelo
ministro da Economia. Por outro lado, o baixo crescimento da economia nos
últimos anos, agravado pela pandemia, fez o Brasil deixar de ser uma das dez
maiores economias do globo, segundo o Ibre/FGV. Em termos de PIB em dólares,
este ano Canadá, Coreia do Sul e Rússia devem ultrapassar o Brasil, que cairá
para a 12.ª posição, depois de ter chegado em 2011 ao 7.º lugar no mundo.
A preocupação aumenta quando se verifica não haver um plano claro de saída da crise atual, nem prioridades para avanços econômicos, sociais e tecnológicos. Sem maior discussão, o governo divulgou a Estratégia Federal de Desenvolvimento para o Brasil no período de 2020 a 2031, com cinco eixos: econômico, institucional, infraestrutura, ambiental e social. Trata-se um uma medida positiva, mas tímida, que apenas esboça essa preocupação. O Congresso e a sociedade civil deveriam ser chamados a participar da análise e discussão dessa estratégia. Dois aspectos chamam a atenção no documento do governo federal: a ausência de clara prioridade para a inovação e a tecnologia, como está fazendo a China, e a inexistência de metas claras no tocante à preservação da Floresta Amazônica e à mudança de clima, duas das vulnerabilidades do Brasil no atual cenário internacional.
*Presidente do Irice, é membro da Academia Paulista de Letras
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