segunda-feira, 25 de maio de 2009

Por que não limitar a entrada de capitais?

Luiz Carlos Bresser-Pereira
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Porque essa política vai contra os princípios fundamentalistas neoliberais aprendidos pelos economistas nas suas escolas

NA SEMANA passada, minha mulher, que não é economista, mas psicanalista, vendo o real voltar a se valorizar, disse-me que esse vaivém era muito ruim e, usando seu bom senso, perguntou por que não se limitavam a entrada e a saída de capitais. Não se limita a entrada de capitais, respondi-lhe, porque essa política vai contra os princípios fundamentalistas neoliberais aprendidos pelos economistas nas suas escolas e porque não interessa aos países ricos que os países em desenvolvimento tenham taxas de câmbio competitivas.

Já quanto à saída de capitais, a história é outra: não se deve limitá-las porque isso é sinal de fragilidade financeira do país, sinal de que ele não controlou seu déficit público e aceitou o "bom" conselho de "crescer com poupança externa", deixando, assim, que o país fosse inundado de dólares, euros e ienes.

A taxa de câmbio é o preço que, se os mercados funcionassem como seus fundamentalistas supõem, flutuaria mantendo-se razoavelmente estável e garantindo o equilíbrio da conta corrente do país. Entretanto, como esse excelente coordenador da economia que é o mercado não é capaz de realizar essa tarefa específica, a flutuação da taxa de câmbio nos países em desenvolvimento tem um viés para o lado da apreciação que, não sendo corrigido pelo governo, termina em crise de balanço de pagamentos. As causas dessa tendência são estruturais, associadas à doença holandesa e à maior rentabilidade dos investimentos, às quais se somam as políticas da ortodoxia convencional de crescimento com poupança externa, âncora cambial e taxas de juros elevadas.

Dada a existência dessa volatilidade e, principalmente, dessa tendência à sobreapreciação, os países em desenvolvimento bem-sucedidos administram sua taxa de câmbio evitando que a sobreapreciação ocorra. No passado, faziam isso com o regime de câmbio fixo, mas aos poucos ficou claro que era melhor deixar a moeda nacional flutuar no mercado e, ao mesmo tempo, administrá-la.

Essa era a prática recomendada por Keynes; é o que o bom senso determina. A ortodoxia neoliberal, porém, chama essa prática de "flutuação suja", insiste em que o mercado é bom coordenador do câmbio, apesar de todas as evidências em contrário, e, novamente contra toda evidência, afirma que é impossível administrar o câmbio e, finalmente, condena às chamas do inferno quem defender o controle de entradas quando os influxos de capital forem muito grandes; só economistas "populistas" poderiam fazer isso.

O problema não é apenas ideológico. Interessa aos operadores financeiros que haja flutuações no câmbio dos países em desenvolvimento porque essa é uma origem de seus ganhos. E principalmente interessa aos países ricos de onde nos vem a "verdade econômica" que a taxa de câmbio nos países em desenvolvimento tenda a ser alta. Dessa forma, sua desvantagem nos mercados internacionais causada por seus salários mais altos é compensada pelo câmbio sobreapreciado nos países em desenvolvimento, principalmente nos países de renda média que são seus grandes concorrentes.

O mal maior que os países em desenvolvimento enfrentam é a fragilidade financeira internacional. Se o país adotar uma política macroeconômica correta, baseada em Orçamento público equilibrado, juros moderados e câmbio competitivo, o país não precisará controlar a entrada de capitais, a não ser em momentos especiais. Se ouvir o fundamentalismo, estará sempre à beira da crise e pedindo ajuda a seus concorrentes mais ricos.

Luiz Carlos Bresser-Pereira, 74, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Macroeconomia da Estagnação: Crítica da Ortodoxia Convencional no Brasil pós-1994".

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