quinta-feira, 22 de março de 2012

Governo começa a sofrer derrotas no Congresso

Os principais partidos da base aliada na Câmara impuseram ontem a primeira grande derrota do governo ao adiar a votação da Lei Geral da Copa até que seja votado o novo Código Florestal. Em outra demonstração de força, os ruralistas aprovaram na Comissão de Constituição e Justiça, por 38 votos a 2, proposta de emenda constitucional que retira da União e transfere ao Congresso o poder para demarcar terras indígenas. Esses sinais crescentes e inquietantes de pressão sobre a presidente Dilma Rousseff apontam para aquela que pode ser a primeira grande crise de seu governo.

O Palácio do Planalto ainda considera cedo para avaliar o resultado da troca dos líderes do governo, na semana passada, na qual deu preferência a nomes de facções minoritárias em detrimento das correntes majoritárias dos partidos, especialmente PT e PMDB.

A nova orientação política do governo é formar nova maioria no Congresso, agregando setores de partidos aliados insatisfeitos com o governo àqueles que já compunham a coalizão governista de mais de uma dezena de partidos. Dilma também quer inovar nos métodos e renovar lideranças. O exemplo que costuma ser dado é o do Senado, há vários anos com seus principais cargos controlados pela tríade formada por José Sarney (AP), Renan Calheiros (AL) e Romero Jucá (RR), todos do PMDB. Na Câmara, ainda davam as cartas o chamado "grupo paulista" do PT, ligado ao ex-ministro José Dirceu e ao campo majoritário do PT.

Com a renovação, Dilma espera mudar práticas como o famoso toma lá, dá cá que costuma nortear muitas negociações no Congresso para a aprovação de projetos de interesse do governo. A presidente explicou bem o conceito por trás dessas mudanças, ontem, em discurso no Rio. "Não tenho nenhuma dúvida que a maioria dos brasileiros cansou de conviver com práticas marcadas pela lassidão e com nossa fama do país do jeitinho".

A crítica dos aliados é que o Planalto quer sempre impor, em vez de negociar, e não atende as emendas de parlamentares ao Orçamento, recursos que são mais importantes em ano eleitoral. A reação do Congresso, nessas situações, é incomodar o governo votando contra projetos de seu interesse.

PMDB encampa manobra ruralista de obstrução

Caio Junqueira

BRASÍLIA - Os principais partidos da base aliada da presidente Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados impuseram ontem a primeira grande derrota ao governo, neste ano, ao adiar a votação da Lei Geral da Copa. Mediante a utilização de manobras regimentais, os PMDB, PR, PDT, PSD, PP e PRB se aliaram aos oposicionistas PSDB, DEM e PPS e conseguiram cancelar a sessão.

O motivo foi a falta de uma sinalização do Palácio do Planalto quanto a uma data para a votação do Código Florestal. Os integrantes da suprapartidária bancada ruralista já chegaram ao plenário com a estratégia de obstrução pronta. E se animaram após dois discursos.

O primeiro, do líder do PT, Jilmar Tatto (SP), que afirmou que condicionar a votação da Lei da Copa a uma data para apreciar o Código era chantagem. "Não vamos entrar nesse engodo, nessa chantagem que às vezes os predadores da agricultura tentam impor ao governo. Querem derrotar o governo, na verdade, não querendo discutir uma legislação ambiental adequada, um Código Florestal adequado para o Brasil à altura do que o Brasil é."

O segundo discurso que insuflou a base avalizou a obstrução dos aliados. Seu autor foi o líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN). "Entendo que é importantíssima a votação da Lei da Copa. Mas tenho que me curvar democraticamente à posição da minha bancada, que tem posições claras e diferentes. Então, em respeito à bancada, para não radicalizar, para abrir um espaço de negociação necessária e importante para esta Casa, para o nosso governo e para o país, o PMDB entra em obstrução."

Foi a senha para que, na sequência, os outros partidos o seguissem. "É pública e notória, infelizmente, a falta de tato do governo em lidar principalmente com os pequenos produtores do nosso país e em pautar o Código Florestal. Entramos em obstrução", disse o líder do PDT, André Figueiredo (CE). Depois, o líder do PTB, Jovair Arantes (GO): "O PTB entende que a Copa do Mundo é um evento disputado por todos os países do mundo e que é muito importante para o Brasil, mas, mais importante do que uma atividade de um mês no Brasil será a atividade perene da agricultura e do meio ambiente. Por essa razão, o PTB estará em obstrução até que possamos votar o Código Florestal."

O líder do PR, Lincoln Portela (MG), atribuiu a obstrução de sua bancada ao fato de o governo aceitar a imposição da Federação Internacional de Futebol (Fifa) de liberar bebidas alcoólicas nos estádios durante os jogos da Copa do Mundo de 2014. No fim, acompanharam o governo apenas PT, PSB e PCdoB. Apenas um deputado do PP obstruiu. Mas cinco deles se manifestaram a favor da retirada de pauta da proposta da Lei da Copa.

Após a derrota do governo ontem, o sentimento entre os deputados era de que o Palácio do Planalto precisaria negociar com a base uma saída para o impasse. Ainda mais porque a derrota ocorreu na semana seguinte à troca da liderança do governo na Câmara, em que Arlindo Chinaglia (PT-SP) substituiu Cândido Vaccarezza (PT-SP). Além disso, os ruralistas confirmaram a manutenção da estratégia na próxima semana. "Isso tudo foi resultado de organização. Na semana que vem, se não houver uma data para o Código, tudo se repetirá", disse o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, Moreira Mendes (PSD-RR).

Mais cedo, ele se reuniu com o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, que também foi o relator do Código Florestal na Casa, em 2011, e outros dois deputados ruralistas, Luis Carlos Heinze (PP-RS) e Homero Pereira (PR-MT). Foi Aldo quem os procurou para pedir ajuda na apreciação da Lei Geral. Mas a conversa também passou por pontos do Código que o governo não quer levar a plenário. "Dissemos que havia intransigência e falta de interlocução do governo. Ele disse que, se questionado pela presidente, vai ajudar." Eles defendem que o texto aprovado no Senado precisa ser alterado de forma a garantir que haja anistia a desmatamentos ilegais, o que o governo discorda.

No entanto, Chinaglia sinalizou que o governo não deverá ceder à pressão, o que dividiu os petistas. Segundo o relator da Lei Geral da Copa, Vicente Cândido (PT-SP), é preciso ceder e marcar uma data. "O governo poderia se comprometer a votar o código na primeira semana de agosto, só assim para conseguir votar a Lei Geral da Copa". (Colaborou Daniela Martins, de Brasília)

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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