União
repassou R$ 31 bilhões acima das perdas estaduais
O
apoio financeiro aos Estados para o enfrentamento da pandemia do coronavírus
ficou muito acima do que se poderia imaginar. Os dados preliminares do Conselho
Nacional de Política Fazendária (Confaz) indicam que a receita acumulada de
janeiro a setembro do ICMS, o principal tributo estadual, caiu cerca de R$ 3
bilhões, na comparação com igual período de 2019. Para compensar a perda, os
governadores receberam R$ 37 bilhões, considerando apenas a lei complementar
173/2020.
Mas
a ajuda federal não ficou só nisso. A arrecadação do Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI) e do Imposto de Renda (IR), que é dividida com Estados e
municípios, também caiu durante os meses iniciais da pandemia. Por isso, a
medida provisória 938/2020, que foi convertida na lei 14.041/2020, autorizou a
União a manter os repasses aos fundos de participação de Estados e municípios
(FPE e FPM), de março a novembro, em valores equivalentes aos repassados nos
mesmos meses de 2019. Com essa medida, os Estados já receberam R$ 7,359
bilhões, de acordo com o Tesouro Nacional.
O
Boletim de Arrecadação de Tributos Estaduais, editado pelo Confaz, estima que a
receita de todos os tributos estaduais - além do ICMS, o IPVA, o Imposto sobre
Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) e todas as taxas cobradas - ficou em
R$ 437,4 bilhões, no acumulado de janeiro a setembro.
Este
dado, no entanto, ainda não inclui a arrecadação do Distrito Federal e do Pará
no mês passado. Se essas duas unidades da federação tiverem registrado a mesma
receita de setembro de 2019, a arrecadação total subiria para R$ 439,52
bilhões. É provável que a receita fique maior do que esse valor, pois, em
setembro, a arrecadação de todos os Estados superou aquela obtida no mesmo mês
do ano passado.
Como
a arrecadação acumulada de janeiro a setembro do ano passado do conjunto dos
Estados ficou em R$ 445,14 bilhões, a perda de receita por causa da pandemia
foi de, aproximadamente, R$ 5,6 bilhões.
Para
compensar essa perda, os Estados receberam da União (LC 173 e MP 938) nada
menos que R$ 44,359 bilhões (R$ 37 bilhões mais R$ 7,359 bilhões). Considerando
que os recursos da União autorizados pela MP 938 foram apenas para manter
constantes os valores dos repasses do FPM e do FPE, na comparação com 2019, os
Estados tiveram cerca de R$ 31,4 bilhões a mais, de janeiro a setembro deste
ano, do que em igual período de 2019 (R$ 37 bilhões menos R$ 5,6 bilhões).
O
aumento nominal da arrecadação total dos Estados nos primeiros nove meses deste
ano está em torno de 7% (considerando apenas o repasse de R$ 37 bilhões), o que
é um dado significativo, tendo em vista que o país está em recessão, com a
previsão de queda em torno de 5% para o Produto Interno Bruto (PIB). Mesmo
nessa situação, as receitas estaduais apresentarão aumento real, uma vez que a
inflação deste ano está estimada em torno de 3%.
Ainda
não há informações sobre como os governadores estão gastando os recursos
transferidos pela União. A LC 173 diz apenas que, dos R$ 37 bilhões repassados
aos Estados, R$ 7 bilhões terão que ser utilizados em ações de saúde e
assistência social.
Os
demais R$ 30 bilhões serão utilizados livremente pelos governadores, pois
cairão diretamente no caixa de cada Estado e não estão carimbados, ou seja, não
têm destinação definida em lei. Os recursos poderão, portanto, ser utilizados
no pagamento de despesa com pessoal.
É
importante que o contribuinte saiba que a União foi obrigada a emitir títulos
públicos para arrecadar os recursos que transferiu, na forma de ajuda
financeira aos Estados e aos municípios. Assim, a receita maior dos Estados
neste ano resultou de aumento do endividamento do Tesouro Nacional.
O
impacto da pandemia nas receitas estaduais foi desigual. Na verdade, os Estados
do Centro-Oeste e do Norte apresentaram ganho de arrecadação, provavelmente
porque são grandes produtores de commodities agrícolas e suas economias não
foram muito afetadas pela pandemia. As perdas ficaram com os Estados de
Nordeste, Sul e Sudeste.
A
arrecadação total de tributos de Mato Grosso, o maior produtor de grãos do
país, por exemplo, aumentou 16,18% de janeiro a setembro, na comparação com
igual período de 2019, de acordo com os dados do Confaz. Mesmo assim, o Estado
recebeu um auxílio de R$ 1,485 bilhão da União (só com a LC 173). Com a ajuda,
a receita total de Mato Grosso nos primeiro nove meses deste ano ficou em R$ 15,19
bilhões, um aumento de 28,8%, na comparação com a arrecadação do mesmo período
de 2019.
Na
região Norte, os maiores ganhos de arrecadação ficaram com Amazonas e Pará. O
primeiro registrou aumento de 6,6% de janeiro a setembro, na comparação com o
mesmo período do ano passado, de acordo com os dados do Confaz. O segundo ainda
não divulgou os dados de setembro, mas a receita estava crescendo 6,62% até
agosto.
Na
região Nordeste, as maiores perdas ficaram com o Ceará (queda de 8,82%), Bahia
(queda de 5,03%) e Rio Grande do Norte (menos 5,17%). No Sudeste, a receita
total de Minas Gerais caiu 2,73%, a do Rio de Janeiro, 3,94%, e a de São Paulo,
2,76%. No Sul, a maior queda de receita foi de Santa Catarina, com menos 3,09%,
de acordo com os dados do Confaz.
Todos
os Estados que perderam receita foram mais do que compensados com o auxílio
dado pela União, de tal forma que nenhum terá em seu caixa, neste ano, uma
receita menor do que a obtida no ano passado, embora alguns tenham sido mais
beneficiados do que outros pela ajuda federal.
Em conversa com o Valor, o secretário de Fazenda e Planejamento de São Paulo, Henrique Meirelles, chamou atenção para o fato de que o pagamento das dívidas estaduais, que foi suspenso neste ano por causa da pandemia, será retomado em janeiro de 2021. “Isso vai acontecer em um quadro ainda de dificuldades”, observou. Para ele, embora a economia esteja em recuperação, está retomando em um nível mais baixo, o que impactará negativamente as receitas.
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