Folha de S. Paulo
Além da privatização, governo e Congresso
armam mais ruína no setor elétrico
A eletricidade
ainda vai ficar muito mais cara e o setor
elétrico vai ficar ainda mais caótico. Se a conta de luz não aumentar
ainda mais neste ano, graças a um decreto aloprado que o Congresso quer
aprovar, vai aumentar no ano que vem e depois.
É por causa da privatização
da Eletrobras? Também, não necessariamente por causa da privatização em si.
É por causa do conjunto da obra ruinosa, empreitada dos regentes parlamentares
do desgoverno de Jair
Bolsonaro.
A privatização da Eletrobras entrou na fase de final de série de TV. Parece que está acontecendo algo importante. Tem fofoca, "emoção". Teve a votação "decisiva" do TCU (Tribunal de Contas da União), que era meio favas contadas (maioria pela validação dos critérios de venda), mas não proibiria nada, embora contestações do TCU pudessem dar pano para manga em tribunais. Mas vai ter tribunal ou outro furdunço legal, típico dos últimos dias de qualquer privatização. A privatização porca é só parte do rolo.
A venda da empresa até pode dar chabu. Por
exemplo, os tombos nas bolsas dos EUA podem atrapalhar. Donos do dinheiro podem
se sentir ameaçados pelo risco (remoto) de a privatização ser avacalhada por um
governo do PT ou por intervenções de Bolsonaro 2, uma mixórdia com propensão a
ser ainda mais autoritária e inepta.
O buraco, porém, está ainda mais para
baixo.
A Câmara colocou em regime de urgência um
projeto de decreto legislativo que pode impedir reajustes de energia elétrica,
que na média do país devem ficar em cerca de 20% neste ano.
Nesta quarta-feira, Arthur Lira (PP-AL),
presidente da Câmara, arquiduque do centrão e regente de Bolsonaro, deu
um ultimato ao governo. Se não derem um jeito no reajuste, a Câmara derruba
o troço.
Não haveria aumento —agora. As
distribuidoras de energia (vendedoras para o consumidor final) talvez levassem
a coisa à Justiça. Algumas teriam problemas financeiros (como pagar a energia
que compram das geradoras). O Brasil seria ainda mais visto como uma roça
bananeira em que é arriscado investir.
Talvez o governo cubra o rombo (fazendo
mais dívida) ou tente empurrar a conta para os estados (por meio de redução do
ICMS, como nos combustíveis). Alguém vai pagar.
De onde vêm esses e outros reajustes
enormes?
Da inflação, em
parte causada pelo dólar, que subiu em parte por causa do desgoverno do
mentecapto ignaro. Também de reajustes postergados durante o pior da epidemia e
do preço altíssimo da energia
de emergência contratada em 2021, a fim de se evitar racionamento.
Tem mais. Por causa também da queda bruta
na revenda de eletricidade no pior da epidemia, as distribuidoras ficaram com
buracos. A fim de tapar o rombo, tomaram um empréstimo, meio patrocinado pelo
governo, que queria evitar que tais custos fossem repassados de imediato ao consumidor.
O custo desse empréstimo vai aparecer na conta de luz, com juros e correção
monetária, por cinco anos.
Parlamentares governistas querem evitar a
paulada do reajuste no ano eleitoral. Vai dar muito errado.
O governo pensa até em usar dinheiro que
vai receber no processo de venda da Eletrobras para atenuar o reajuste. Em
tese, esse dinheiro serviria para atenuar aumentos de custos de energia que
virão com a privatização da estatal elétrica, fora a conta extra que lobistas e
o Congresso enfiaram na lei de desestatização (criando reservas de mercado para
produção de energia cara).
Rolos velhos se enrolam em besteiras do ano
passado, que devem ser amplificadas pelas tolices deste ano. A conta virá, mais
salgada. Bolsonaro e seus regentes estão para produzir mais um desastre no
setor elétrico.
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