quarta-feira, 7 de agosto de 2024

Aylê-Salassié Filgueiras Quintão - Vivendo, ingênuo, perigosamente

Geraldo Alckmin,  vice-presidente da República e ministro da Indústria e do Comércio do governo petista,  com uma  longa carreira política entre liberais progressistas ,  dá mostras, às vezes,  de estar vivendo    uma adolescência tardia, numa revelação  de que fazer  política  pode até ser para quem faz dela um meio de vida mas, nele, para sobreviver, não  se pode  comportar  como amador.

O ex-candidato à Presidência da República no Brasil  e ex-governador de São Paulo,  acaba de ser fotografado no Irâ (República Islâmica do Golfo Pérsico),representando o governo brasileiro na posse do novo Presidente,   Masoud Pezeshkian (eleito com  53,7% dos votos). Na cerimônia, Alckmim foi instalado entre o  chefe  do facção guerrilheira Hamas,  Ismail Haniyeh (morto horas depois); o portavoz do  grupo iemenita Houtis, também guerrilheiro, Mohammed Abdulsalam ; o vice-líder do Hesbolahh, general Nai M Assem; o líder da Jihad Islâmica, Ziyhad Al Nakhalyah , todos em plena atividade insurreicional. 

Era um encontro quase litúrgico daqueles que pregam   a democracia e a liberdade  segurando  nas mãos um fuzil kalashnikov, usado nas  guerras regionais . Alckmin parece ter sido induzido a andar na direção contrária da história diplomática  brasileira - "...negociação e diálogo como instrumentos de resolução de conflitos" - dando , com sua presença   (Porque não outro ?)   legitimidade para aquelas lideranças  religiosas guerrilheiras .
 
O Brasil sempre se manteve equidistante de conflitos que não lhe diziam respeito , evitando meter-se em brigas alheias. Ultimamente,  está  sendo vagarosamente "jogado às feras",  por obra de meia dúzia de sujeitos ensimesmados no Poder. É uma  insensatez   que se espalha pelo mundo, e o Brasil vai sendo imprudentemente envolvido. O modelo de  eleições digitais,  ditas "livres e democráticas"  surge para   instrumentalizar o processo. 

Na América Latina, entre os explicitamente coniventes,  estão Daniel Ortega, da Nicarágua,   Nicolas Maduro, da Venezuela e os cubanos. O  atual presidente do Brasil (50,83% de votos), sem  convicção visível,  vem  fazendo ensaios para entrar nesse círculo. São  pessoas, aparentemente doentias. Não se expõem  com armamentos  para tomar o Poder. Usam terceiros : milícias civis, forças armadas , cooptação de juízes e da mídia, aparelha o  Estado e  agencia pessoas, partidos, conveniências  sociais e  políticas comuns.

Flacidamente  compromissados com a democracia, mantém um clima latente de promessas e expectativas  de um fluído bem estar , acompanhado pela   perseguição aos opositores .  Interferem  cinicamente nas liberdades civis e de pensamento, mesmo sob a  desconfiança a sociedade .  Nesse meio, são  sempre lembrados  como a origem  de fraudes e do ódio. Suas ameaças atingem , às vezes,  altos níveis de destempero como o de Maduro antes do pleito venezuelano - "Pode correr sangue nas eleições da Venezuela" , e até o sumiço de atas e urnas eleitorais. É um tipo  de bolivarismo  de consistência etérea, herdado de Chavez, na qual, por exemplo, Boric, do Chile, não embarca..

Esse modelo de  liderança, que se diz revolucionário, protege-se  atrás de uma retórica vazia em defesa da democracia, acusando  opositores de  fascistas e nazistas, quando são eles que usam aqueles métodos hitlerianos, himlerianos, mussolinistas. De Stalin e Putin, com o mesmo perfil, não se fala. Procura-se antecipar  essa estigmatização abusiva e pejorativa,  confundindo a massa de  desavisados. Assim, por meios fequentemente adulterados,   tomam o Poder , cerceiam as liberdades, as oposições,  oprimem e agridem os cidadãos.
  
Em décadas passadas reconheciam-se e se respeitava na América Latina grupos guerrilheiros revolucionários. Mas, na "modernidade líquida",  diria que os herdeiros desses grupos ideologicamente confusos, convergem para algo escuso, muito longe de uma propalada revolução.   Governam por meio  do exercício de uma ditadura , sob a capa da teoria sociológica do autoritarismo. São poucas essas  lideranças narcisistas, todas há mais  de dez anos no Poder,  amparando-se num  Estado aparelhado, como  Maduro e a Justiça do  país. Os propósitos  se assemelham entre si. 
 
É para esse tipo de ambiente, num mundo pouco conhecido por aqui,  que  Alckmin ,  terminou sendo cooptado e silenciado . "Ele mente", quem disse isso,  num debate na televisão, para todo o Brasil fraudado ouvir , foi o Alckmin, hoje com postura de servidor público submisso e bem remunerado. Na ocasião, o oponente riu da sua ingenuidade, quando foi por ele  chamado  de mentiroso. Quem se elegeu foi o acusado, conseguindo depois dissolver o "picolé de  chuchú" - "tudo que é sólido desmancha-se no ar" - destruindo praticamente o seu partido, o PSDB, uma centro-esquerda de convicções pequeno burguesa.

A escorregada de Alckmin conspurca  os esforços diplomáticos históricos do Brasil no sentido de se manter distante de conflitos amparados por estereótipos e  ortodoxias  cheias de contradições,  longe  das tradições cristãs, pacíficas  e democráticas . A maioria dos  brasileiros não compreende os conflitos no Oriente Médio. Fica tudo   ainda mais confuso quando se quer  meter no meio o Irã  que ( não é árabe), desde a Grécia Antiga, vive em guerra pelo domínio do Ocidente. Aliás, naquela região sempre  um quer engolir o outro. 

 Mas, tão ridícula  quanto a violência contra a imagem de Alckmin representando o Brasil entre guerrilheiros - uma "casca de banana" , um sorvedouro de caráter - é ele concordar em ser usado para dar legitimidade a tão nocivas companhias que insistem em dar uma  a configuração  nova para a  história contemporânea dos povos,  e do  Brasil . 

De 2023 para 2024, o mundo está realizando eleições em  pelo menos 70 países, oito deles  na América . Alguns enquadram-se perfeitamente no perfil traçado . Lá  está a figura dantesca do Nícolas Maduro, acusado de ter fraudado a eleição presidencial, inviabilizado uma Oposição, e se auto elegido com supostos 51, 2 por cento dos votos, contrariamente aos resultados contabilizados, nos quais ele  teria perdido por mais de 70 por cento.

"Deus colocou nas minhas mãos as eleições, para que seguisse na direção da Venezuela, governando com amor". O que se chama aqui de "modelo" parece  amparado  numa matriz digital eleitoral  "hackeadora", que  circula pelo mundo, tentando apropriar-se do coração e da mente dos homens.  Não há revolução nenhuma. O teórico inspirador é George Sorel (1947-1922), um anarquista que valorizava o  caos.   As duvidosas  urnas brasileiras, "impossíveis de serem auditadas", segundo Maduro, chegaram a ser  proibidas na Colômbia. 

* Jornalista, professor

Um comentário: