segunda-feira, 7 de outubro de 2024

Vera Magalhães - Esquerda tem 'DR' para fazer

O Globo

Lula se vê diante de um cenário em que o PT disputa quatro segundos turnos em capitais, mas vai enfrentar uma pedreira em todos eles

A força mostrada pelo bolsonarismo-raiz e pelas siglas do Centrão nas urnas neste domingo coloca diante de Lula e da esquerda a necessidade urgente de renovar suas lideranças, repensar suas prioridades e reavaliar a forma com que se comunica com o conjunto da sociedade, sob pena de uma disputa muito dura em 2026.

Se é verdade que pleitos municipais não são termômetros exatos nem da avaliação de governos centrais nem das chances de partidos e lideranças políticas para dali a dois anos, ignorar os sinais também não é inteligente.

Jair Bolsonaro, dois anos depois de perder a Presidência, um ano depois de ser declarado inelegível e prestes a enfrentar um acerto de contas com a Justiça pelas tentativas de golpe quando ainda no poder e, depois, no 8 de Janeiro, foi um padrinho mais eficiente do que as pesquisas permitiam antever.

Mostrou força na reta final em cidades importantes, como Belo Horizonte e Goiânia e, mesmo tendo estado ausente o tempo todo em São Paulo, vai dar um jeito de dizer que Ricardo Nunes (MDB) só foi ao segundo turno graças à live de má vontade que fez na noite da última sexta-feira.

Lula se vê diante de um cenário em que o PT disputa quatro segundos turnos em capitais, mas vai enfrentar uma pedreira em todos eles. Em dois, terá embates diretos com o PL. E, em São Paulo, se a inflamação Pablo Marçal desviou um pouco o foco da polarização stricto sensu, no segundo turno ela está posta e será a atração principal das disputas no país.

Independentemente desses resultados, ficou evidente a desconexão da esquerda com segmentos inteiros da população, dos evangélicos ao empresariado, passando pelo enorme contingente de empreendedores individuais dos grandes centros urbanos que já tinham deixado claro que não querem saber do blablablá sindicalista dos anos 1980 que o PT tem a oferecer, mas agora berraram isso nas urnas eletrônicas.

O que Lula vai fazer? Dar de ombros para esse clamor e deixar que marçais ainda mais ruidosos e dispostos a subverter a política conquistem o monopólio de interlocução com esse eleitorado, eminentemente jovem?

O presidente do PSB, Carlos Siqueira, fez uma análise realista da encruzilhada vivida pela esquerda em entrevista ainda na tarde de domingo, quando atestou o desastre, por exemplo, da dificuldade de Lula e do PT de chamar a Venezuela do que ela é, uma ditadura acabada.

A evidência de que muitos partidos que estão aboletados no governo inundaram campanhas por meio das emendas Pix e, agora, se preparam para aumentar sua representação na Câmara e, talvez, para dar adeus a Lula na disputa à reeleição também deveria ser um motivo de alerta máximo na condução da articulação política de agora em diante.


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