terça-feira, 29 de julho de 2008

DEU NO JORNAL DO BRASIL

CERCEAMENTO DO CRIME À IMPRENSA
Editorial / Jornal do Brasil


Se ainda restavam dúvidas sobre a coerção eleitoral que permeia quem vive ou mesmo transita por regiões do Rio de Janeiro dominadas por traficantes ou milicianos, o episódio de sábado na Vila Cruzeiro, na Penha – em que jornalistas foram proibidos de fotografar a visita do candidato à prefeitura Marcelo Crivella (PRB) – escancarou a urgência de uma operação conjunta em prol do direito de ir e vir, sobretudo em zonas deflagradas pelo crime.

No mesmo local onde foi capturado há seis anos o repórter Tim Lopes, da TV Globo, para depois ser morto no Complexo do Alemão, equipes do Jornal do Brasil, O Dia e O Globo foram obrigadas, por criminosos, a apagarem as fotos relativas à caminhada do candidato. Sob a mira de um fuzil e ameaças de que se seriam "queimados" (mortos), já que ali era o "mundo do crime", todos os jornalistas presentes obedeceram. As fotos foram recuperadas posteriormente por meio de programa de computador. E, pelo direito à informação, a imprensa cumpriu seu papel.

Nas zonas obscuras de uma cidade dividida, a ausência do Estado não é novidade. Muitos analistas apontam a própria omissão do poder público como causa principal do domínio de traficantes ou milicianos em comunidades. São 600 favelas, além de conjuntos habitacionais e loteamentos irregulares guiados exclusivamente pelas regras impostas pelo crime. O absurdo, além do cerceamento a candidatos não apoiados pelos grupos criminosos, estendeu-se à proibição de a imprensa desempenhar o que lhe é de direito: divulgar o que é de interesse público – neste caso, campanhas eleitorais às vésperas da escolha de um novo prefeito.

Como lembrou o governador Sérgio Cabral, em repúdio à censura aos repórteres, "toda vez que o livre jornalismo é impedido de atuar é sinal de um estado de exceção". Ameaças sofridas pelas equipes, segundo Cabral, reforçam a necessidade da "política de combate do Estado ao crime" e exigem a garantia da segurança dos cidadãos, assim como a do Estado de direito democrático.

Torna-se inadmissível que este conceito perca o significado em zonas comprometidas pelo controle do crime. Conforme alertou em seu ex-blog o prefeito Cesar Maia, as "estarrecedoras limitações à mobilidade política em comunidades do Rio a candidatos ou suas propagandas (que na verdade dão seqüência às próprias limitações impostas pelos traficantes ao direito de ir e vir das pessoas no dia- a-dia) impõem reflexão mais geral sobre direito à mobilidade política-eleitoral". O ocorrido traz à tona a "limitação à mobilidade, uma restrição à democracia, ao acesso equânime à informação, de forma que o eleitor possa tomar a sua decisão".

O caso demanda atenção. Conforme reportagem publicada na edição de ontem do JB, não apenas aspirantes a prefeito ou vereador vêem-se ameaçados pelo crime organizado. Agentes do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), responsáveis pela fiscalização da propaganda política, também enfrentam restrições à sua atuação. Em 21 dias de campanha, foram apenas duas operações em favelas.

Contra a coerção imposta ao poder público e aos eleitores, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o TRE-RJ discutem amanhã medidas para reforçar a segurança de candidatos que disputam as eleições na capital fluminense. Para o presidente do TSE, Carlos Ayres Britto, impedimentos ao trabalho da imprensa e ao voto livre ferem a democracia. A exemplo da Polícia Federal, que já investiga quem são os candidatos da milícia e do tráfico, decisões sobre forças-tarefas eleitorais cabem ao TRE-RJ, conforme enfatizou Ayres Britto.

São medidas inadiáveis para que se investigue a promiscuidade entre crime e política, como para a retomada do direito de circular em espaços públicos – seja na favela ou no asfalto.

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