quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Lições de Russomanno para Eduardo Campos - Cristian Klein


Os resultados das eleições municipais foram animadores para o projeto presidencial de Eduardo Campos. O partido do governador de Pernambuco, o PSB, foi o que mais amealhou capitais: cinco. Quatro delas em confronto direto com o PT, de quem é aliado nacional histórico. Nas três maiores, Belo Horizonte, Recife e Fortaleza, o rompimento foi traumático.

Engordado com as vitórias, e ciente das estocadas que deu nos petistas, Campos trata agora de fazer a distensão. Diz não querer ampliar seu quinhão no governo federal e teria baixado ordem unida para que seus correligionários não reivindiquem cargos em ministérios ou estatais. A decisão mostra a segurança de quem vai acumulando as fichas e pretende trocá-las ou usá-las na hora certa. Seu cacife já cresceu e o mercado sabe o preço.

A medida mostra também uma estratégia cara ao governador. Eduardo Campos é neto de Miguel Arraes (1916-2005), mas parece se guiar pela máxima atribuída ao velho Ulisses Guimarães (1916-1992): o político não deve se aproximar tanto que não possa se afastar, nem se afastar tanto que nunca possa se aproximar.

Maior laboratório da quebra da polarização PT-PSDB deu errado

Deriva desta visão de mundo seu comportamento baseado no jogo de "morde e assopra". Dobrou a direção estadual de seu partido em São Paulo para apoiar Fernando Haddad, e sentiu-se livre para atacar longe do QG paulista do PT, em territórios que considera domínios seus.

O flerte com a oposição segue o mesmo roteiro: abraçou Aécio Neves em Belo Horizonte, mas fez um duelo de padrinhos em São Luís, onde o prefeito tucano João Castelo, apoiado pelo senador mineiro, perdeu para seu candidato, o deputado federal Edivaldo Holanda Júnior (PTC).

No segundo turno, o PSB conseguiu o que tanto queria: desceu do Nordeste e marchou mais fortemente no Sudeste, ao conquistar cidades polos, como Petrópolis e Duque de Caxias, no Rio, e Campinas, em São Paulo. Nesta última, houve outra vitória sobre o PT - o que ocorreu também indiretamente no município da Baixada Fluminense. Em troca do apoio a Haddad, Campos bateu pé e fez a cúpula petista intervir para apoiar seu candidato, Alexandre Cardoso, que controlará a prefeitura com a segunda maior arrecadação do Estado do Rio.

O PSB também teve reveses. Perdeu uma cidade importante, Curitiba, no único caso de prefeito de capital derrotado já no primeiro turno. E, em São Vicente (SP), caiu a longa hegemonia do deputado federal Márcio França, que durava quatro mandatos, com a derrota surpreendente de seu filho.

O partido, no entanto, foi o que mais cresceu, 42%, no número de prefeituras (pulando da nona para a sexta posição); e saltou de oitavo para quarto lugar no ranking de dois critérios mais relevantes: o total de eleitores (de 5,9% para 11,05%) e de receitas que comandará - de 5,4% para 11,12%. O orçamento ainda é a metade do líder PT, que terá à disposição 22,75%, mas é praticamente o mesmo dos tucanos, com 12,48% da receita total das prefeituras.

É verdade que o impacto da eleição municipal sobre a presidencial é limitado. O efeito mais direto do crescimento de prefeitos e vereadores é aumentar as bancadas de deputados federais e estaduais. É este o próximo passo que o PSB deve cumprir. Sua vocação majoritária está dada. Já elegeu o maior número de governadores, em 2010, o de prefeitos de capitais, agora, mas ainda carece de força congressual. Conta com apenas 32 parlamentares (6,2%, sétimo) na Câmara e quatro senadores (5%, apenas o nono).

A lógica é que a colheita de prefeitos deste ano aumente a força parlamentar do PSB em 2014. Mas como Eduardo Campos tem pressa surge daí sua necessidade de utilizar o PSD como prótese e criar um bloco parlamentar para influenciar a eleição das novas Mesa Diretoras, em 2013.

Com isso, o governador de Pernambuco se move no tabuleiro para realizar seu grande sonho: quebrar a polarização entre o PT e o PSDB. Muitos resultados saídos das urnas podem lhe ser favoráveis. Foi a eleição marcada pela instabilidade dos humores do eleitorado, pelas reviravoltas e pelo clima de mudança. Nunca a fragmentação partidária foi tão alta e em poucas vezes os mandatários foram tão rejeitados. A taxa de reeleição geral foi de 55% e nas capitais, ainda menos, 50%. Em apenas cinco de 26 capitais haverá governos de continuidade.

No entanto, o maior laboratório da quebra de polarização entre tucanos e petistas deu errado. A derrota de Celso Russomanno (PRB) em São Paulo foi água fria na fervura do projeto de Campos. Não é pouco, já que a experiência na capital paulista era vista por parte da classe política como sinal dos tempos e um estímulo a novas possibilidades na corrida presidencial. Caso se aconselhasse com o ex-deputado federal, o governador provavelmente ouviria de Russomanno: "Lição número 1: não crie uma popularidade artificial, como se fosse uma bolha. Lição 2: amplie o número de aliados e aumente o seu tempo de TV, ele talvez não seja tão essencial para subir, mas será crucial para responder aos ataques. Lição 3: não despreze tanto os partidos, com um projeto personalista. Lição 4: não parece, mas o Brasil é um país sério. Faça um bom programa de governo".

Eduardo Campos, claro, não é Russomanno. Tem se articulado com muito mais esperteza e parece conhecer o caminho das pedras. Prova disso é seu esforço de construção partidária - embora sinalize que poderá lançar mão da tradicional "solução pelo alto": a busca pelo apoio do empresariado.

A dúvida cruel de Eduardo Campos é se arranca por dentro ou por fora da base governista. Por um lado, ser um bom menino em 2014 e imaginar que o PT lhe dará espaço em 2018, tende a ser ilusão. Por outro, cerrar fileira na oposição é competir com o PSDB, que já se estabeleceu como a verdadeira alternativa. Seu desafio é não repetir o mesmo destino de Marinas, Heloisas e Garotinhos - terceiras vias efêmeras e que se esvaíram.

Mais do que qualquer coisa, tudo dependerá da avaliação do governo de plantão. Foi isso que fez Lula emplacar Haddad em São Paulo e não em diversas outras cidades, como Recife, Fortaleza e Belo Horizonte.

Se Dilma se transformar em um Kassab, será meio caminho andado para Campos. Mas ainda assim terá o bico de um tucano a atrapalhar o seu voo.

Fonte: Valor Econômico

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