• ‘Sobram razões para temor’
Primeira consequência das revelações do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa ao Ministério Público Federal, na tentativa de garantir benefícios previstos na lei de delação premiada extensivos aos familiares: o governo, o PT e a presidente-candidata Dilma Rousseff perderam a bússola no planejamento da campanha a 26 dias da eleição.
Até a manhã de sexta-feira, no Palácio do Planalto e no comando do PT debatia-se uma miríade de táticas regionais para tentar levar Dilma imediatamente a outro patamar nas pesquisas. O objetivo era reduzir a grande diferença (de sete pontos percentuais) que a separa de Marina Silva (PSB) na preferência dos eleitores para a disputa em segundo turno. A vantagem de Marina não é pequena: equivale à soma do eleitorado dos estados do Centro-Oeste, ou seja, 10 milhões de votos.
Mudou tudo, a partir do vazamento de informações sobre as denúncias do ex-diretor da Petrobras contra políticos do PT, PMDB, PP, PR e PTB. Ontem, de passagem por São Paulo, a candidata dissimulou e prometeu tomar “providências cabíveis” no dia em que souber de alguma coisa.
Para o Palácio do Planalto e o comando do PT, a principal dificuldade agora é como conter danos à candidatura de Dilma, porque o caso só tende a crescer às vésperas do pleito(o rito entre a Procuradoria e o Supremo Tribunal Federal obedece a um calendário de 20 dias para formalização de inquérito, coincidindo com a semana da eleição.)
Sobram razões para temor. Entre elas está uma irrefutável linha do tempo: Paulo Roberto Costa ocupou a Diretoria de Abastecimento da Petrobras — em pelo menos duas dezenas de ocasiões, foi presidente interino—, durante os nove anos nos quais Dilma apareceu como a voz de comando na estatal, em sucessivos papéis de ministra das Minas e Energia, presidente do Conselho de Administração, chefe da Casa Civil de Lula e presidente da República.
O enredo protagonizado por Costa e associados começou no governo Lula, em 2003, quando o chefe da Casa Civil José Dirceu se dedicava à construção da “maior base política do Ocidente”. Sob patrocínio do PP do então deputado José Janene, indiciado no mensalão, ele transformou Abastecimento numa diretoria autônoma, com apoio do então presidente Sérgio Gabrielli, o “embaixador” de Lula na estatal. Depois, Costa passou a representar um condomínio partidário (PT-PMDB-PP-PTB-PR) cujo poder de influência nos negócios da Petrobras se estende do Brasil à África.
A Costa foi entregue, entre outros, o maior empreendimento da empresa, a construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. Durante sete anos (de 2004 a 2012), ele e Gabrielli mantiveram sob sigilo o orçamento de contratação de serviços e equipamentos para essa refinaria, cujos custos subiram nove vezes e até novembro devem somar US$ 20,1 bilhões. Inúmeras vezes o Tribunal de Contas da União pediu planos e estimativas de custos, mas só começou a recebê-los no ano passado. A estatal ocultou até os estudos de viabilidade econômica, técnica e ambiental do empreendimento.
Costa e Gabrielli sempre contaram com respaldo governamental. No Congresso, Costa se tornou conhecido como caso raro de diretor de estatal com bancada própria. Sabe-se, agora, que eram pelo menos 25 parlamentares federais — entre eles, caciques do PMDB e do PT fluminenses. Coincidência ou não, alguns figuraram em episódios investigados na CPI dos Correios — inclusive em manobras com fundos de pensão estatais —, mas, por variadas razões, ficaram à margem do processo do mensalão.
Se é imprevisível a dimensão do impacto das denúncias na disputa presidencial, é certo que a presidente-candidata passa ao centro do alvo dos adversários. Certa, também, é a tendência à rápida difusão do caso pelo interior do país: há 7,3 mil candidatos a uma das vagas disponíveis na Câmara e no Senado, e pelo menos 25 parlamentares federais estão na vitrine, citados por Costa como beneficiários de propinas.
Até ontem, vazaram poucos nomes de políticos. No conjunto, o que já é conhecido sugere algo muito mais amplo do que a listagem de mensaleiros e suas mesadas. Até porque na Petrobras desvios de quantias inferiores a US$ 10 milhões são quase um problema menor, de “assuntos internos”. Trata-se de uma empresa com cerca de cinco mil fornecedores cujos contratos geralmente ascendem a US$ 100 milhões.
O TCU, por exemplo, há quatro anos investiga superfaturamentos a partir de US$ 400 milhões em contratos de obras, equipamentos e serviços da refinaria de Pernambuco.
Os valores manejados por Costa na estatal em benefício do condomínio partidário governista tendem a pontuar com um tom de escândalo a reta final desta campanha eleitoral.
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