- O Globo
O Banco Central votou ontem diante do pior dos dilemas de uma autoridade monetária : a economia estagnada já encolheu a arrecadação e, mesmo assim, a inflação está bem acima da meta. O BC elevou os juros para 13,25% para derrubar o índice de preços cuja alta se deve, em grande parte, ao tarifaço da energia. Os juros vão enfraquecer mais a economia e o recolhimento de impostos.
Mesmo diante do quadro de estagnação a caminho da recessão, o BC tem que continuar subindo os juros para evitar a contaminação das expectativas, ou seja, a impressão de que o governo vai deixar a inflação continuar subindo. O problema é que, como se viu ontem, o governo está arrecadando menos e fazendo um superávit primário pífio para quem tem que atingir o ajuste de 1,2% do PIB. A declaração do ministro Joaquim Levy, lembrando que a dívida do país ainda pode ser rebaixada a grau especulativo, mostra a corda bamba na qual se está fazendo política econômica no país. A conjuntura está tão cheia de complexidades que os ajustes criam desajustes. A elevação dos juros, por exemplo, é o pior remédio para uma economia já enfraquecida, mas é isso ou ver a inflação subir cada vez mais.
O economista Luiz Roberto Cunha, da PUC do Rio, calcula que a inflação em abril deve ficar em torno de 0,75% e 0,80% e depois vai cair para níveis menores. Só que a cada mês o número será maior do que no mesmo mês do ano passado. O que significa que o acumulado em 12 meses continuará subindo até agosto e deve atingir 8,5%. Só começa a cair no final do ano , mas a previsão é de que fique entre 8% e 8,2%. Se está tudo previsto, por que o Banco Central elevou de novo os juros para o escorchante nível de 13,25%? O BC tem que atuar para evitar que os preços liv re s subam. Quanto mais ele derrubar esses preços, mais impedir á que uma inflação tão alta incentive uma nova indexação na economia. —E terá que ficar vigilante no ano que vem, porque, se houver uma recuperação da economia, muitas empresas que estão hoje comprimindo margens podem querer aumentar os preços — disse Luiz Roberto Cunha.
Em outras palavras, os juros terão que ficar altos por muito tempo. A boa notícia é que a maior ia dos economistas acredita que está chegando ao fim este ciclo de aperto monetário. A Selic não deve subir muito mais além do nível a que chegou ontem. Entretanto, dificilmente ela poderá cair no curto prazo. As famílias terão um pouco menos de desconforto daqui para frente porque os preços dos alimentos sobem pouco nesta época do ano e, segundo Luiz Roberto Cunha, alguns itens importantes ficarão mais baratos, como milho, feijão, frango. —Nesta época do ano, os preços de alimentos ficam mais baixos. Além disso, a energia elétrica, que subiu fortemente no começo do ano, subirá de forma mais moderada nos próximos meses. O pior do tarifaço de energia já passou.
No acumulado em 12 meses, a inflação continuará subindo, mas a taxa mensal de maio em diante deve ficar entre 0,45% a 0,50%, o que é mais alto do que no ano passado, mas menor do que os números acima de 1% mensal nos primeiros três meses de 2015 — diz Cunha. O Banco Central, ao avaliar a conjuntura como fez nos últimos dois dias, vê uma inflação que dará algum motivo de alívio ao consumidor, mas que, ao mesmo tempo, está muito acima do teto da meta. Ele quer que no final de 2016 o índice esteja no centro de 4,5%, portanto, é agora que tem que agir. O problema é que do ponto de vista do nível de atividade este é o pior momento para subir juros. O PIB caiu no primeiro trimestre e não vai se recuperar no segundo tri.
O melhor cenário é que comece a melhorar nos últimos três meses do ano. O quadro econômico é de fato um dos mais difíceis dos últimos anos. Em 2003, foi preciso apenas um choque de credibilidade para derrubar o dólar, que havia disparado com medo de a política econômica de Lula ser a que ele sempre havia defendido. A queda do dólar e a confiança na equipe econômica permitiram a redução da inflação. Agora, tudo está mais confuso. O governo Dilma está na estranha situação de tentar corrigir o que ela mesma fez no mandato passado.
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