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Ao contrário do que os mais afoitos ou ingênuos podem imaginar, a eventual abertura de um processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff jamais será imposta por partidos ou lideranças políticas, mas se afirmará, ou não, por fatos concretos e pela pressão da opinião pública. Foi assim com Fernando Collor, em 1992, e não há quem possa garantir ou descartar que uma história semelhante será escrita desta vez. O debate está posto na sociedade de forma irreversível.
A mais recente pesquisa do Datafolha aponta que 63% dos brasileiros, considerando tudo o que sabem até aqui sobre a Operação Lava Jato e a corrupção na Petrobras, defendem o impedimento da presidente da República. O esgotamento do governo lulopetista se agrava a cada dia, em meio às novas revelações sobre o “petrolão” – que culminaram na prisão de mais um tesoureiro do PT – e ao aprofundamento da crise econômica.
O relatório do Tribunal de Contas da União que desmascarou as “pedaladas fiscais” praticadas pelo atual governo complica a já delicada situação da presidente. De acordo com a investigação, foram atrasados repasses de recursos para os bancos públicos com o intuito de inflar artificialmente o resultado das contas da União. As manobras ocorreram em despesas sociais, trabalhistas e previdenciárias, como Bolsa-Família, seguro-desemprego, abono salarial e aposentadorias, e recursos da Caixa Econômica Federal, do Banco do Brasil e do BNDES foram utilizados para pagar esses compromissos, o que é proibido pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
Se, no caso do petrolão, Dilma comandava o Conselho de Administração da Petrobras e era ministra-chefe da Casa Civil no período em que os cofres da estatal foram assaltados por uma quadrilha – e, portanto, deve ser cobrada por conivência ou omissão –, no episódio do malabarismo fiscal a responsabilidade legal da presidente está ainda mais caracterizada, como afirmou um dos ministros do TCU.
Ao contrário do que acusam os áulicos do lulopetismo, falar em impeachment não é “golpe”. Trata-se de um instrumento previsto na Constituição, regulamentado por lei e ao qual o Brasil já recorreu uma vez, inclusive com o apoio entusiasmado do PT. Quando Collor foi impedido, a ruptura se deu sem grandes traumas e as nossas instituições se fortaleceram.
No campo jurídico, os governistas argumentam que Dilma só poderia ser penalizada por atos ilícitos cometidos no atual mandato, iniciado há quatro meses. Essa interpretação do Parágrafo 4º do Artigo 86 da Constituição é equivocada, e há entendimento do Judiciário de que governantes reeleitos podem ser responsabilizados por eventuais irregularidades cometidas no mandato anterior. Afinal, a partir do instituto da reeleição no Brasil, é evidente que se estabeleceu a possibilidade constitucional de continuidade do mandato – ou seja, o mandato é o mesmo, apenas renovado por mais um período eletivo. Se não fosse assim, o governante estaria autorizado a cometer uma série de crimes durante seu primeiro período no cargo, pois estaria automaticamente absolvido em caso de reeleição. Um despropósito que não resiste à lógica e ao bom senso.
É natural que a defesa do impeachment não seja encampada de forma uníssona por todas as forças políticas, mesmo as da oposição, mas o debate é legítimo e deve ser enfrentado por todos aqueles que têm espírito público e compromisso com o país. O crime de responsabilidade está previsto em lei, e a pergunta a ser respondida é se Dilma o praticou ou não. E, ao fim e ao cabo, se há condições políticas para que o processo tramite no Congresso. Hoje, essas condições ainda não existem, assim como não existiam quando surgiram as primeiras denúncias contra Collor. Mas o panorama pode mudar rapidamente se os fatos assim determinarem.
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Roberto Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS
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