• A derrubada do impeachment é a 5ª chance do PT
- Valor Econômico
Bem antes da votação, o PT previa ontem perder por cinco a seis votos de diferença na comissão do impeachment, mas considerava ter mais chances no plenário da Câmara dos Deputados. O governo acredita que hoje tem mais que os 171 votos necessários, com tranquilidade. Mas nada indica que chegue assim à votação. Na melhor das contas do Palácio do Planalto, a presidente Dilma escapa do impeachment por algo entre 20 e 30 votos. É pouco e dá alento ao pior cenário pós-impeachment: se Dilma vencer no plenário por vantagem ligeira, a crise continua porque ela não governa, mesmo tendo Lula a tiracolo; se a oposição ganhar o impeachment e ela sair, acende os movimentos sociais.
É o quadro de vésperas de votação da autorização para o julgamento da presidente Dilma Rousseff no Senado. Mas o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o vice-presidente Michel Temer trabalham para reverter o cenário do caos. Não há uma empreitada mais fácil que a outra. Para o PMDB o impeachment é um atalho para Temer chegar aonde dificilmente chegaria, em condições naturais; para Lula, uma possibilidade para repor o PT no jogo eleitoral de 2018.
Segundo um integrante do grupo palaciano que traça e executa as estratégias para combater o impeachment, a sobrevivência de Dilma deve ser seguida por uma série de ações a ser cuidadosamente embalada como "o início do segundo mandato da Dilma e a 5ª chance do PT" - as outras quatro foram as duas eleições de Lula e as duas de Dilma. É tratado também como "a 3ª chance da Dilma", mas na prática, se houver uma nova oportunidade, ela parece mais com o início de um 3º mandato de Lula - o objetivo do grupo é isolar a presidente.
Dilma não é a culpada de tudo, mas é a grande culpada, do ponto de vista do PT e de Lula, pela situação a que chegou o projeto de poder do partido. Não se trata de conversa para separar Dilma de Lula, como costuma reagir o PT. É fato. A ideia é que o próprio Lula e os ministros Jaques Wagner (chefe de gabinete da Presidência) e o ministro Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) façam a contenção da presidente. Para Lula governar um novo governo.
Foi Dilma quem foi atrás de Lula, quando viu que as chances do impeachment no Congresso eram reais. Lula nunca pensou em ser ministro, mas também não disse não à primeira investida. Pesava, é claro, o foro privilegiado que impediria o juiz Sergio Moro de decretar sua prisão. Lula ainda foi aconselhado a responder prontamente, pois se a notícia vazasse não teria outra alternativa a não ser aceitar. Nem deu tempo: no dia seguinte, o convite estava nos jornais. Vazado pela entourage da presidente. A eventual recusa de Lula significaria que até ele abandonara Dilma à própria sorte. Moral da história: Lula e seu grupo podem até pensar na interdição branca da presidente, mas o episódio demonstra que ela também sabe manobrar para conseguir o que quer.
A atual equipe econômica pode ficar por um período de transição, mas será trocada. Esse será o primeiro desafio de Lula: convencer os movimentos sociais que é preciso fazer sacrifício agora para ter chance em 2018. É possível que alguns movimentos aceitem "alguma restrição", segundo um próximo de Lula, mas será preciso virar o disco e falar mais de investimento e menos de ajuste. "A centralidade das ações tem de ser o emprego", diz um dos interlocutores entre Lula e o movimento social.
Discute-se um reajuste do bolsa família. É ideia outra vez usar os bancos públicos para irrigar o crédito, estimular a renovação de 15% da frota nacional de carros e retomar as obras paradas do Minha Casa Minha Vida. "Só não pode ser de pinguinho em pinguinho", mas com alguma escala que dê discurso eleitoral para o PT em 2018. Talvez isso possa satisfazer os movimentos sociais. Talvez não. "Quem está saindo na rua para botar a cara e defender o governo não aceitará o enforcamento depois que não passar o impeachment, nem o Lula segura", diz um petista com amplo trânsito nos movimentos sociais, sindicatos e centrais sindicais.
Lula tem muito para fazer em pouco tempo. O ex-presidente quer reunir com mais frequência e dar mais efetividade ao Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES). Também quer mexer na política externa, que foi uma das marcas de seus governos, mas que agora considera "muito acanhada". Enquanto o vice Michel Temer expurgou de seu dicionário a palavra "revanchismo", nos arredores do lulismo se diz que "engana-se quem acha que a Lava-Jato pega o PT e acabou".
Lula tem em mente a reforma política, uma evidência da crise. Mas a reforma de que fala o PT é a mesma que até hoje não conseguiu ganhar espaço algum no Congresso. A reforma não consta dos pontos fundamentais já reconhecidos de um eventual governo Temer: reconstrução nacional; fim da reeleição; não interferência nas eleições municipais; um ministério surpreendente; garantia de que não haverá perseguição política.
Temer promete preparar o terreno e fazer os ajustes necessários para que o governo a ser eleito em 2018 tenha condições efetivas de recuperar o país. Trata-se de uma agenda indigesta, mas o raciocínio é que quem teve 342 votos para fazer o impeachment, terá até os 308 necessários para aprovar uma emenda constitucional.
Para se afugentar de vez o cenário segundo o qual a votação do impeachment não detém a crise, talvez a saída seja um grande acordo. Uma espécie de concertação nacional, só que não há ninguém à vista capaz ou interessado em liderar um processo deste tamanho. Falta alguém como Ulysses Guimarães ou Tancredo Neves.
Num acordo geral para tirar o país da crise, talvez, até a presidente Dilma concordasse em sair, renunciar. Sem um acordo, não sai ninguém. Se tiver o impeachment, pode ser difícil segurar o MST, UNE, MTST, a CUT. Os ânimos estão radicalizados, como pode ser visto em recente reunião do PT, em São Paulo, quando a assembleia se voltou raivosa contra o autor de uma proposta de conversação. O PT está mal, mas vê Lula num patamar melhor que o dos candidatos do PSDB nas pesquisas. Já se Dilma sobrevive, fica contra a vontade da maioria.
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