terça-feira, 25 de outubro de 2016

Lei para os inimigos - Hélio Schwartsman

- Folha de S. Paulo

Uma eventual delação premiada de Eduardo Cunha deve ser aceita? A resposta a essa pergunta depende, obviamente, do que o ex-presidente da Câmara tem a oferecer às autoridades.

A ideia básica por trás da delação premiada é conceder redução de pena a membros de estruturas criminosas para que confessem seus delitos, identifiquem os comparsas que ocupavam posição hierarquicamente superior à sua e mostrem caminhos para obter provas materiais. Isso significa que, em algum momento, as delações não deveriam mais ser aceitas, para que os chefões dos esquemas pudessem ser condenados com o rigor máximo permitido pela lei.

É verdade, também, que Cunha é um peixe graúdo. Não deve haver tanta gente assim acima dele na cadeia alimentar das propinas. Mas isso não significa que o deputado cassado não possa ser um elemento útil para os investigadores, hipótese em que faria sentido oferecer-lhe algum benefício em troca da colaboração.

A Lava Jato pode passar para a história como uma operação que fez o Brasil dar um salto qualitativo em termos de combate institucional à corrupção, ou como mais um episódio de instrumentalização da Justiça, cujo objetivo seria ferir tão gravemente quanto possível o PT e, tão logo essa missão estivesse concluída, os procuradores deveriam passar a pegar leve com o grupo no poder.

É para assegurar que seja o primeiro cenário e não o último o que prevalecerá que os membros da força-tarefa precisam manter abertas as portas para colaborações premiadas que ampliem os horizontes da investigação. Cunha, por tudo o que testemunhou e por ter sido muito próximo dos atuais cardeais do PMDB que comandam o país, não pode ser descartado como uma figura com a qual não se negocia por princípio.

O que está em jogo, afinal, é definir se a Lava Jato veio para mudar de verdade ou se é mais um caso de lei só para os inimigos.

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