quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

Interventor ainda faz diagnóstico

O Comando Militar do Leste informou em nota que o grupo de assessoria ao general Braga Netto, nomeado para cuidar da segurança pública no Rio, “está sendo formado”, e que o CML ainda trabalha no diagnóstico da situação. A repercussão negativa sobre mandados coletivos de busca e apreensão nas operações desagradou ao interventor. O Senado ratificou a aprovação do decreto de intervenção federal no Rio. Um sargento do Exército foi morto em arrastão na Zona Oeste.

Interventor ainda estuda situação do Rio

Braga Netto anunciará equipe ‘nos próximos dias’; governo recua e busca tom sobre mandados coletivos

Mateus Coutinho, Vera Araújo e Marcos Nunes | O Globo

-BRASÍLIA E RIO- Cinco dias após o presidente Michel Temer anunciar a intervenção federal na área de segurança do Rio de Janeiro, o general Walter Souza Braga Netto, que ficará à frente da tarefa, ainda está montando sua equipe e estudando a situação de violência no estado para traçar um diagnóstico. Na noite de ontem, o Comando Militar do Leste (CML) informou em nota que o grupo de trabalho que vai assessorar o interventor está “sendo formado e será anunciado nos próximos dias”. No comunicado, o CML diz que “várias reuniões têm sido realizadas para que seja feito um diagnóstico da segurança pública no estado”.

Enquanto isso, ressalta o CML, “os órgãos de segurança pública estadual seguem funcionando normalmente”. A nota convoca ainda a população do Rio a colaborar, e diz que “o processo demandará, de todos e de cada um, alguma parcela de sacrifício e de colaboração, em nome da paz social e da sensação de segurança almejadas”.

INTERVENTOR TEME REPERCUSSÃO DE MANDADOS
Além de buscar o diagnóstico da situação que precisará enfrentar, a intervenção federal também procura saber exatamente de que meios poderá dispor para combater a onda de violência no estado. A sugestão, feita pelo próprio general Braga Netto durante reunião dos conselhos da Presidência da República, na segundafeira, de que será preciso recorrer a mandados de busca e apreensão coletivos, especialmente em ações nas favelas, gerou repercussão dentro e fora do governo.

Ontem, o governo esboçou recuo em busca do tom adequado para tratar do caso. Segundo o ministro da Justiça, Torquato Jardim, o que poderá ser pedido à Justiça do Rio serão mandados de busca em mais de uma residência ou localidade determinadas, mas não mandados “genéricos” para uma área grande — o que não é permitido pelo Código Penal.

A repercussão sobre a utilização de mandados coletivos é também uma das maiores preocupações do general Braga Netto. A interlocutores, o interventor demonstrou estar preocupado com a disseminação na população do medo de que a medida seja entendida como uma autorização irrestrita para invasão de privacidade e de ações violentas, com armas de fogo, contra pessoas que vivem nas favelas.

— Ele sabe que isso não é uma autorização irrestrita para sair fazendo arbitrariedades, que os mandados têm de ter suspeitos bem definidos, com uma investigação anterior — afirma um interlocutor do interventor.

A preocupação em esclarecer a situação levou integrantes do governo a um movimento de idas e vindas ontem até encontrar o tom sobre a necessidade de se usar mandados coletivos. O ministro da Justiça, Torquato Jardim, chegou a declarar que o governo não pedirá mandados coletivos, como havia sido informado na véspera pelo ministro da Defesa, Raul Jungmann.

— Não é um mandado coletivo. São mandados de busca e apreensão que, conforme a operação, serão dedicados a um grupo de pessoas. A intervenção federal não suspende nenhum direito fundamental — disse o ministro, que se encontrou ontem com o presidente do Tribunal de Justiça do Rio, Milton Fernandes, e com a advogada-geral da União, Grace Mendonça, e Sérgio Etchegoyen.

À Globonews, Torquato Jardim afirmou que o termo “coletivo” é inadequado:

— Algumas operações pedem a citação de várias pessoas. O adjetivo coletivo é impróprio tecnicamente. O coletivo dá ideia de uma generalidade. E o mandado de busca e apreensão não pode ser genérico. A Constituição não permite. Corretos os que reclamam com uma observação mais cuidadosa dos direitos e garantias individuais postos na Carta de direitos.

Quando não for possível identificar o endereço dos alvos, será possível que os pedidos de busca e apreensão sejam feitos à Justiça com base em posições de GPS e descrevendo áreas das comunidades, segundo Jardim.

À tarde, interlocutores do ministro da Defesa disseram ao GLOBO que Raul Jungmann segue defendendo a ideia de se pedir mandados coletivos, necessários em sua visão para se cercar toda uma rua ou mesmo comunidade para capturar criminosos.

O general da reserva e primeiro comandante da missão de paz do Brasil no Haiti, Augusto Heleno Ribeiro Pereira, defendeu que se “flexione” alguns “postulados jurídicos” numa situação como a do Rio.

— Na desorganização urbana fica difícil dizer qual a casa onde é preciso entrar. O que está se pleiteando, não é nenhuma violação ao direito à privacidade. Diante de uma situação extraordinária, onde está se apelando para uma figura inédita, acho que deveriam aproveitar para romper um pouco alguns postulados jurídicos, flexionar um pouco em prol do melhor resultado no combate ao crime — afirmou.

Desde segunda-feira, especialistas em Direito e entidades criticaram a possibilidade de a intervenção recorrer a este expediente no Rio. A Ordem dos Advogados do Brasil no estado (OAB-RJ) irá à Justiça caso haja mandados coletivos. “Há a violação constitucional da garantia individual de inviolabilidade do lar e intimidade, colocando sob ameaça ainda maior os direitos da parcela mais desassistida da população”, diz nota da OAB-RJ.

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